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Bicentenário da "Synopse do Codigo do processo civil" (IV)

Quarta parte da série de artigos sobre os duzentos anos do livro "Synopse do Codigo do processo civil" (1825-2025), de Silvestre Pinheiro Ferreira.

segunda-feira, 4 de agosto de 2025

Atualizado às 10:25

Esta é a quarta parte da série de artigos sobre o livro "Synopse do Código do Processo Civil", de Silvestre Pinheiro Ferreira, por ocasião de seu ducentenário (1825-2025), desta vez sobre outros institutos, após termos abordado anteriormente a introdução geral, o autor e o instituto da "citação", passando agora para a continuação sequencial e lógica.

Desta vez ingressaremos no instituto do "Libello", dentro do qual também se menciona a "Petição de Ação", dando ensejo a desdobramentos interessantes sobre a ampla defesa e o contraditório, além de curioso aspecto sobre a "revelia do autor", que hoje poderia causar alguma perplexidade aos contemporâneos, mencionando, ainda, a presença sempre necessária do advogado, tratando da capacidade de postular em juízo para deduzir o respectivo "Libello".

Falaremos agora sobre o veículo da pretensão autoral, naquilo que hoje receberia o nome de petição inicial e na época se denominava "Libello" (com duplo "l"). Recordemos que foi abordado na parte anterior a "citação", razão pela qual a matéria disciplina a seguir é um desdobramento sequencial e lógico. Previsto no n. 55, estava disciplinado da seguinte maneira: "Comparecendo ambas as partes, deve o autor propor logo seu Libello, assinado por advogado, em que articuladamente se exponha a questão, deduzindo-se clara e positivamente a condenação do réu. Mas como princípio de Libello, pode ele oferecer a Petição de Ação, requerendo se lhe dê vista para a adicionar".

Ou seja, observamos a formalidade (escrito e assinado por advogado) que deveria expor a questão jurídica (fato e direito, de forma clara e positiva, diríamos hoje: objetivamente), além de constar pedido de condenação do réu, embora se admitisse um "princípio de Libello", com uma "Petição de Ação", na qual se pedia vista para adicionar sequencialmente (leia-se: posteriormente) o conteúdo obrigatório do Libello, abrindo um formalismo procedimental de "ação", nos termos mencionados.

O n. 56, a seu turno, preconizava: "Justamente com o Libello deve o autor oferecer os documentos que forem indispensáveis para se provar a sua intenção e determinadamente a Obrigação do Réu por Escritura Pública nos casos em que a Lei a exige, sob pena de ser o réu (a arbítrio do Juiz) absolvido da Instância, e requerendo-o ele, condenado o autor nas custas, a menos que este, depois de fazer certa a existência daqueles documentos, não justifique a inculpável impossibilidade de os apresentar em juízo".

Por sua vez o n. 57, complementando, estipulava a possibilidade tripla de emenda, mudança ou aditamento à inicial (lia-se: "ao Libello"), prevendo multa em certa hipótese: "Antes da contestação da lide, é lícito ao autor, não somente 'addir' [expressão que era utilizada para referir a aceite, adição ou acréscimo] e retificar o Libello, e mais artigos, mas também mudar de Ação ou desistir da Demanda, pagando as custas que ao réu tiver ocasionado e, mostrando-se ter havido dolo, ou malícia da sua parte as pagará em dobro, ou em tresdobro, a arbítrio do juiz".

Temos uma importante preocupação com a ampla defesa e com o contraditório no n. 58, que complementa: "Mas tanto em caso de adição ou retificação do Libello, como no de mudança de Ação, deve o réu ser citado, e dando-se lhe vista de tudo, conceder-se lhe tempo suficiente para dizer a bem do seu direito".

Por sua vez, o n. 59 preconizava curiosa possibilidade de revelia do autor, quando estabelecia: "Se o autor, depois de proposto o Libello, se ausentar, e o juiz já tiver recebido, ou receber o dito libello, poderá o réu seguir o feito à revelia do autor, a quem o juiz assinará todos os termos e dilações como se presente fosse absolvendo ou condenando a final afinal o réu, como pelo feito se mostrar ser de direito", enquanto o n. 60 estabelecia: "Não se mostrando por onde deva ser absolvido, nem condenado, sem se fazer alguma diligência em favor do autor, não curará dela, mas absolverá o réu da instância do juízo, condenando o autor nas custas". Ou seja, não agiria de ofício, exceto para absolver o réu.

Já o n. 61 dizia sobre a possibilidade de desistência do feito em qualquer fase e independentemente de consentimento, considerando a anterior possibilidade de ter prosseguido à revelia do autor, que lhe permitia também "desistir" de prosseguir na demanda do autor que se ausenta: "Ao réu é livre o desistir, em qualquer parte do juízo, do requerimento de assim se prosseguir no feito, à revelia do autor, contanto que pague as custas que se montarem, desde que a tal requerimento se lhe houver deferido". Vale dizer, mais uma vez preocupa-se com a não atuação de ofício: "requerimento que deve ter sido deferido", ou seja, previamente.

Na próxima parte daremos início ao tratamento das chamadas exceções de suspeição e incompetência, quando passaremos também a tratar dos interessantes aspectos do delineamento da competência instituída, agradecendo uma vez mais o apoio institucional do IBCJ - Instituto Brasileiro de Ciências Jurídicas, do IBRACHINA - Instituto Sociocultural Brasil-China e do CEDES - Centro de Estudos de Direito Econômico e Social para republicar o esquecido livro, buscando contribuir com a cultura jurídica luso-brasileira e o com estudo do direito processual civil contemporâneo.

Thiago Aguiar de Pádua

Thiago Aguiar de Pádua

Pós-doutoramento (UnB, Perugia e Univali). Doutor em direito. Ex-assessor de ministro do STF. Autor do livro "O Common Law Tropical: o caso Marbury"(2023). Sócio de Aguiar de Pádua & Lima Advogados.

Joaquim Portes de Cerqueira César

Joaquim Portes de Cerqueira César

Mestre em Direito Processual - PUCSP. Doutor em Direito Constitucional - PUCSP. Especialista Direito Econômico - UnB. Advogado e Consultor

Thomas Law

Thomas Law

Advogado especialista em Direito Penal Econômico, mestre em Direito das Relações Internacionais Econômicas e doutor em Direito Comercial. É presidente da CNRBC (OAB Federal), do Ibrachina e do IBCJ, além de vice-presidente do CEDES e de comissões da OAB/SP. Também atua como pesquisador, professor, palestrante e autor. Fundador do Ibrawork.

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