Holding familiar com 3 células
Como estruturar o planejamento patrimonial de forma segura, legal e com maior benefício fiscal possível.
quarta-feira, 6 de agosto de 2025
Atualizado às 08:43
1) Introdução
Diante do crescente movimento do Estado na busca de arrecadação financeira mediante a elevação dos tributos, dentre eles, o ITCMD - imposto de transmissão causa mortis e doação incidente sobre a herança1, o planejamento patrimonial e sucessório é uma preocupação constante para famílias que desejam proteger, organizar e perpetuar seus bens. Em meio aos desafios de uma sucessão com custos elevados, burocracia e riscos jurídicos, surge o sistema de holding familiar com 3 células. Este modelo oferece uma estrutura segura, legal e eficiente que se apoia na liberdade do contribuinte de escolher a forma menos onerosa de organizar seus ativos conforme permitido pela lei e já reconhecido pelo STF quando do julgamento da ADIn 2.4462, cabendo destacar o seguinte trecho do voto condutor do acórdão proferido pela eminente min. Carmen Lucia, verbis:
"Não se comprova também, como pretende a autora, retirar incentivo ou estabelecer proibição ao planejamento tributário das pessoas físicas ou jurídicas. A norma não proíbe o contribuinte de buscar, pelas vias legítimas e comportamentos coerentes com a ordem jurídica, economia fiscal, realizando suas atividades de forma menos onerosa, e, assim, deixando de pagar tributos quando não configurado fato gerador cuja ocorrência tenha sido licitamente evitada" (grifo nosso).
2) O que é uma holding familiar?
A holding familiar é uma ferramenta de planejamento patrimonial que envolve a criação de uma ou mais pessoas jurídicas para concentrar, administrar e proteger o patrimônio de uma família. Em vez de manter bens - como imóveis, ações e investimentos - em nome da pessoa física, esses ativos são transferidos para uma sociedade empresária ou conjunto de sociedades (as "células"). Essa estratégia traz vantagens significativas, entre elas:
Proteção dos bens: Ao remover os ativos do nome individual, diminui-se o risco em caso de processos judiciais, dívidas ou disputas familiares, ressalvado, por óbvio, as hipóteses de fraude à lei, fraude contra credores, dolo e má-fé, por exemplo.
Facilidade na sucessão: A estrutura permite a transmissão dos bens de forma ágil e organizada, evitando a burocracia e os elevados custos do inventário tradicional.
Economia fiscal e financeira: Planejar a sucessão através da holding pode reduzir os impostos e outros custos envolvidos na transferência dos ativos.
3) A estrutura de 3 células
O modelo com 3 células divide a holding em partes com funções específicas, garantindo maior eficiência na proteção e na sucessão dos bens:
3.1) Célula cofre:
Esta célula tem por função ser a responsável pela armazenagem dos ativos patrimoniais da família, compreendendo os diversos bens, à exemplo dos imóveis e ativos financeiros. Em razão de ser uma sociedade "inerte", ou seja, criada apenas para proteger os bens sem exercer atividades operacionais, ela isola os ativos de riscos advindos do exercício de alguma atividade empresarial e de eventuais dívidas.
Relevante destacar que a simples participação societária, inclusive para se beneficiar de incentivos fiscais, já pode configurar uma atividade empresarial à luz do que determina o art. 2º, § 3º da lei de S/A3.
3.2) Célula destino:
É a célula cuja função dentro do sistema, é responsável pelo planejamento sucessório, ou seja, através dela que se realiza a efetiva transmissão dos ativos aos descendentes, mediante a doação das quotas sociais aos herdeiros e/ou aqueles à quem o titular do patrimônio deseja transmitir, na ausência de herdeiros necessários.
A utilização dessa célula simplifica o processo sucessório, mantendo o controle do patrimônio concentrado, mas ao mesmo tempo, permitindo a transferência dos direitos de forma organizada e segura.
3.3) Célula veículo:
Esta célula tem como função fazer a ligação entre as outras duas, atuando como intermediária, de forma a viabilizar as operações de transferência dos ativos para os herdeiros, do modo mais econômico possível, consistindo em verdadeiro planejamento tributário, caracterizado pela elisão fiscal, utilizando-se da estrutura societária criada para fins de atingir benefícios fiscais com a redução do ITCMD, na forma prevista no art. 2º, § 3º da lei de S/A, conforme já mencionado acima.
A estrutura societária da célula veículo facilita o gerenciamento da transição dos bens, permitindo ajustes e operações de regime tributário de forma mais flexível e estratégica.
4) Legalidade e segurança jurídica
O sistema de holding familiar, quando constituído de acordo com as normas do direito societário e tributário, é plenamente legal, eis que a estrutura montada encontra fundamento na liberdade econômica prevista na legislação brasileira, permitindo que o contribuinte escolha a melhor forma de administrar e proteger seu patrimônio, inclusive, para atingir o maior benefício fiscal possível e permitido por lei.
Cada célula é uma pessoa jurídica diferente, permitindo uma gestão mais específica e reduzindo interferências entre as atividades operacionais e a proteção dos bens. Essa separação é crucial para que, em caso de revezes, os ativos fiquem isolados e protegidos.
Todos os atos relativos à constituição e à alteração das holdings são formalizados através de contratos sociais e alterações que passam pelos órgãos competentes (como a junta comercial) e sujeitos a fiscalização tributária pelo Estado. Isso assegura que todo o processo esteja de acordo com a legislação vigente, reforçando a segurança jurídica.
O sistema permite uma flexibilidade na sua estruturação de acordo com a liberdade empresarial de cada indivíduo, o qual possui o direito de escolher e ajustar a forma de organização dos seus bens. Essa liberdade é um dos pilares do sistema, permitindo que cada família adote a estrutura que melhor se adeque às suas necessidades, desde que não se ultrapasse os limites legais.
5) Economia financeira e tributária
Uma das maiores vantagens do sistema de holding familiar com 3 células é a significativa economia financeira e tributária.
Entre os benefícios, destacam-se: a) Redução dos custos do inventário: Ao organizar os ativos em uma holding, o processo de sucessão torna-se muito mais ágil e menos oneroso, evitando os altos custos e a burocracia dos inventários tradicionais; b) Minimização dos encargos tributários: Planejamentos bem estruturados podem reduzir substancialmente os tributos incidentes sobre a transferência dos bens - como o ITCMD - imposto de transmissão causa mortis e doação. Em um cenário já existente de elevação desse tributo, essa redução se torna ainda mais relevante; c) Otimização dos recursos: Com uma gestão centralizada e especializada dos ativos, os rendimentos e a valorização do patrimônio são otimizados, gerando benefícios econômicos que se traduzem em mais segurança para a continuidade dos negócios e do legado familiar.
6) Conclusão
O sistema de holding familiar com 3 células, desde que realizado por profissional qualificado e observada a legislação vigente, se mostra como uma solução moderna, legal e extremamente segura para famílias que desejam organizar, proteger e perpetuar seu patrimônio.
Baseado na liberdade do indivíduo para escolher a melhor forma de estruturar seus bens e obter o maior benefício fiscal dentro daquilo que a legislação permite fazer, esse modelo oferece: a) Segurança jurídica: Garantida por uma estrutura bem definida e amparada pela legislação; b) Economia financeira: Através da redução dos custos associados aos processos sucessórios e tributários; c) Flexibilidade e controle: Permite que cada família possa montar o sistema ideal para sua realidade, mantendo o controle e a proteção dos seus ativos.
Para quem busca uma maneira eficiente e legal de preservar o legado familiar e, ao mesmo tempo, obter economia fiscal, o sistema de holding familiar com 3 células representa uma ferramenta jurídica robusta de planejamento patrimonial que gera significativa economia financeira e tributária - sempre dentro dos limites e das possibilidades que a legislação permite.
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1 https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2024/07/19/como-fica-o-imposto-sobre-heranca-e-doacoes-com-a-reforma-tributaria.htm.Acesso em: 04 ago. 2025
2 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COMPLEMENTAR N. 104/2001. INCLUSÃO DO PARÁGRAFO ÚNICO AO ART. 116 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL: NORMA GERAL ANTIELISIVA. ALEGAÇÕES DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, DA LEGALIDADE ESTRITA EM DIREITO TRIBUTÁRIO E DA SEPARAÇÃO DOS PODERES NÃO CONFIGURADAS. AÇÃO DIRETA JULGADA IMPROCEDENTE.STF. ADI nº2.446/DF. Tribunal Pleno. Rel: Min. Cármen Lúcia. Julgado: 11/04/2022. Publicação: DJe de 27/04/2022.
3 Art. 2º Pode ser objeto da companhia qualquer empresa de fim lucrativo, não contrário à lei, à ordem pública e aos bons costumes.
§ 3º A companhia pode ter por objeto participar de outras sociedades; ainda que não prevista no estatuto, a participação é facultada como meio de realizar o objeto social, ou para beneficiar-se de incentivos fiscais.


