MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. A origem da lei Magnitsky e suas disposições jurídicas

A origem da lei Magnitsky e suas disposições jurídicas

Lei Magnitsky inspira sanções internacionais e reacende debates sobre soberania, responsabilização individual e alcance extraterritorial.

segunda-feira, 11 de agosto de 2025

Atualizado às 13:54

Em razão das repercussões recentes da aplicação de sanções com base na chamada lei Magnitsky, o tema voltou a ganhar atenção no meio jurídico e diplomático nacional, especialmente quanto à legitimidade e aos limites desse tipo de medida.

A legislação em questão, formalmente intitulada Global Magnitsky Human Rights Accountability Act, foi aprovada pelo Congresso dos Estados Unidos em 2016 e está codificada no título 22 do United States Code, § 2656 (22 U.S.C. § 2656). Sua aplicação é válida em todo o território americano e alcança indivíduos estrangeiros, de qualquer nacionalidade, considerados envolvidos em corrupção significativa ou em graves violações de direitos humanos.

O fundamento político e histórico para essa legislação está no caso do advogado russo Sergei Magnitsky, cuja morte em 2009, enquanto estava sob custódia do Estado russo, provocou forte reação internacional. Magnitsky havia denunciado um suposto esquema de fraude fiscal envolvendo autoridades públicas. Após permanecer detido por cerca de um ano em prisões de Moscou, sem julgamento, faleceu em meio a alegações de negligência médica e abusos por parte das autoridades penitenciárias.

A primeira versão da lei, aprovada em 2012 pelo Congresso dos EUA, foi voltada especificamente a indivíduos russos supostamente envolvidos nesse episódio. O texto autorizava a imposição de sanções unilaterais, como o congelamento de bens e a proibição de entrada em território americano, direcionadas a pessoas físicas consideradas responsáveis por graves violações de direitos humanos.

Com o tempo, o alcance da norma foi ampliado. Em 2016, foi promulgada a Global Magnitsky Human Rights Accountability Act, que estendeu a possibilidade de aplicação de sanções a qualquer pessoa estrangeira, independentemente de nacionalidade. A nova versão, regulamentada pela Ordem Executiva 13.818, abrange casos de corrupção significativa e de violações graves de direitos fundamentais.

As decisões com base na legislação são de natureza administrativa e adotadas pelo Departamento de Estado em conjunto com o Departamento do Tesouro, com fundamento em relatórios oficiais, documentos técnicos e outras fontes. Desde sua adoção, o instrumento tem sido aplicado em diferentes contextos, com sanções direcionadas a indivíduos de nacionalidades variadas.

A legislação norte-americana inspirou normas semelhantes em outros países. Em geral, essas leis permitem medidas restritivas voltadas a pessoas físicas e jurídicas estrangeiras, com efeitos patrimoniais, financeiros e diplomáticos. O modelo se diferencia das sanções tradicionais entre Estados por focar na responsabilização individual, e não coletiva, especialmente quando se entende que os mecanismos internos de repressão estatal são ineficazes ou inexistentes.

Apesar de sua disseminação, a adoção e a expansão dessas legislações não são consensuais do ponto de vista jurídico-diplomático. Críticos apontam possíveis conflitos com princípios do direito internacional público, como a soberania estatal, o devido processo legal e a vedação de sanções unilaterais motivadas por critérios políticos. Também são recorrentes os questionamentos sobre transparência, proporcionalidade e mecanismos de revisão das decisões, o que tem gerado debates na doutrina e em organismos multilaterais.

Ainda assim, o uso desse tipo de medida tem se ampliado, o que reforça a necessidade de delimitar com mais clareza os contornos jurídicos das sanções individuais de alcance extraterritorial, sobretudo diante de sua crescente influência sobre o direito internacional contemporâneo.

Bruna de Oliveira Chixaro

VIP Bruna de Oliveira Chixaro

Escritora, historiadora e advogada especialista em Direito Internacional pela PUC de Minas Gerais. Nasceu em Manaus-AM e concluiu seu mestrado em Direito na Universidade de Fortaleza (UNIFOR).

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca