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Bioética feminista e bioética racial: Desafios éticos para uma sociedade plural

Este artigo tem por finalidade a discussão sobre a bioética em relação às mulheres e aos menos favorecidos, em um universo inicial de homens, brancos e europeus.

quinta-feira, 21 de agosto de 2025

Atualizado às 10:40

Introdução:

A bioética surgiu no século XX como um campo interdisciplinar destinado a refletir sobre dilemas éticos decorrentes dos avanços científicos e tecnológicos na saúde. Apesar de sua relevância, foi historicamente construída a partir de uma perspectiva universalizante, desconsiderando desigualdades estruturais relacionadas a gênero, raça e classe.

Nesse sentido, movimentos críticos passaram a denunciar as limitações do modelo hegemônico, dando origem a vertentes como a bioética feminista e a bioética racial. Ambas questionam os pressupostos tradicionais, propondo novas abordagens éticas mais sensíveis às experiências de grupos historicamente marginalizados.

A emergência da bioética feminista:

A bioética feminista surge como reação à invisibilização das mulheres nos estudos de saúde, bem como à naturalização de papéis de gênero. Essa perspectiva sustenta que a ética biomédica tradicional prioriza princípios abstratos, como autonomia e justiça, sem considerar as desigualdades concretas enfrentadas pelas mulheres em situações de vulnerabilidade.

Entre os temas abordados estão: saúde reprodutiva, direitos sexuais, violência obstétrica, participação feminina na pesquisa científica e equidade no acesso a serviços de saúde. A bioética feminista valoriza a experiência, o cuidado e a empatia como categorias éticas centrais, contrapondo-se a uma racionalidade puramente tecnocrática.

A construção da bioética racial:

A bioética racial, também chamada por alguns autores de bioética antirracista, volta-se à análise das desigualdades raciais que permeiam os sistemas de saúde. Populações negras e indígenas, por exemplo, sofrem maior vulnerabilidade diante de doenças, menor acesso a tratamentos de qualidade e discriminação institucional.

Casos históricos como o estudo de Tuskegee, nos Estados Unidos, ou as experiências com populações colonizadas, são exemplos de como a ciência e a medicina podem reproduzir racismo estrutural. No Brasil, a persistência de disparidades raciais em indicadores de mortalidade materna e infantil reforça a necessidade de uma bioética atenta às questões raciais.

Pontos de convergência de desafios comuns:

A bioética feminista e a bioética racial compartilham o objetivo de desconstruir uma visão universalizante e neutra da ética em saúde, enfatizando a importância de reconhecer marcadores sociais de desigualdade. Ambas reivindicam uma ética situada, capaz de dar respostas justas às necessidades concretas de grupos vulnerabilizados.

Os desafios incluem a institucionalização dessas abordagens, a formação de profissionais de saúde em perspectiva crítica, e a superação de estruturas sociais que perpetuam desigualdades de gênero e raça.

Conclusão:

A bioética feminista e a bioética racial representam avanços fundamentais para a construção de uma ética em saúde verdadeiramente inclusiva. Ao questionarem a neutralidade da bioética tradicional, revelam como relações de poder atravessam a produção científica, a prática médica e as políticas públicas.

O fortalecimento dessas perspectivas é essencial para enfrentar injustiças históricas e garantir o direito universal à saúde. A incorporação de gênero e raça como categorias analíticas centrais amplia o alcance da bioética e a aproxima de sua vocação original: promover a dignidade humana em todas as suas dimensões.

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DINIZ, Debora. Bioética feminista: o discurso da igualdade na diferença. Brasília: LetrasLivres, 2003.

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APOSTILA, Sistmas e Políticas em Saúde. ALBERT EINSTEN Ensino e Pesquisa. 

Tacito Alexandre de Carvalho e Silva

VIP Tacito Alexandre de Carvalho e Silva

Advogado. Pós graduado em Processo Civil. Pós graduado em Direito Médico pelo instituto Albert Einstein. Professor de Processo Civil (Faculdade São Paulo). Procurador M 2009/2016. Vereador 2021/2024.

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