Subvenções de ICMS no IRPJ e CSLL: Divergências jurisprudenciais e desafios atuais
O artigo analisa decisões divergentes do Carf sobre a exclusão de subvenções de ICMS do IRPJ e CSLL, destacando os impactos do Tema 1.182/STJ e os desafios de segurança jurídica.
quinta-feira, 28 de agosto de 2025
Atualizado às 09:17
A tributação das subvenções governamentais, em especial aquelas vinculadas a incentivos fiscais de ICMS, tem sido objeto de intensos debates doutrinários e jurisprudenciais. A controvérsia reside na possibilidade de tais benefícios serem excluídos da base de cálculo do IRPJ - Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica e da CSLL - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido. Embora o STJ, no julgamento do Tema 1.182, tenha delineado parâmetros sobre a matéria, a interpretação de seus efeitos ainda gera decisões divergentes no âmbito administrativo, como evidenciam recentes julgados do Carf - Conselho Administrativo de Recursos Fiscais.
Este artigo analisa duas decisões paradigmáticas e contrastantes proferidas pelo Carf em julho de 2025: o acórdão 1102-001.681 (favorável ao contribuinte) e o acórdão 1401-007.536 (desfavorável ao contribuinte), discutindo seus fundamentos e refletindo sobre a tensão entre o princípio federativo, a segurança jurídica e a arrecadação tributária.
A questão é regida principalmente pelo art. 30 da lei 12.973/14, que autoriza a exclusão de subvenções para investimento da apuração do lucro real, desde que observados determinados requisitos, e pela LC 160/17, que introduziu os §§4º e 5º no referido art., qualificando os incentivos fiscais de ICMS como subvenções para investimento.
A jurisprudência do STJ, consolidada no Tema 1.182, estabeleceu que os benefícios fiscais de ICMS (redução de base de cálculo, isenção, diferimento etc.) somente podem ser excluídos do IRPJ/CSLL quando atendidos os requisitos legais previstos no art. 30 da lei 12.973/14 e no art. 10 da LC 160/17. A interpretação desses requisitos - em especial a necessidade ou não de comprovar que os benefícios foram concedidos como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos - é o cerne das divergências.
No processo 10746.730340/2021-31, a contribuinte buscava a exclusão de créditos presumidos e reduções de base de cálculo de ICMS da apuração do IRPJ e CSLL. A fiscalização havia glosado os valores sob o argumento de que não havia comprovação de que se tratavam de incentivos voltados à implantação ou expansão de empreendimentos.
O Carf, todavia, entendeu que, após a LC 160/17, não é exigível a comprovação adicional de finalidade do benefício, bastando o enquadramento formal como incentivo fiscal de ICMS. Assim, reconheceu-se a natureza de subvenção para investimento e autorizou-se a exclusão dos valores, em consonância com a leitura ampliativa do Tema 1.182/STJ.
Esse entendimento reforça a tese de que a exigência de comprovação material da destinação do incentivo além do previsto em lei implicaria indevida restrição administrativa, violando a segurança jurídica e o pacto federativo.
No processo 10340.721160/2023-93, a empresa havia excluído valores referentes a isenções e reduções gerais de ICMS da base do IRPJ/CSLL, constituindo reservas de lucros para enquadrá-los como subvenções. A fiscalização contestou, alegando que tais operações não configuravam efetivas receitas, mas simples exonerações tributárias de caráter amplo, sem qualquer ganho econômico específico à empresa.
O Carf, neste caso, entendeu que a contribuinte não cumpriu os requisitos legais: não houve demonstração de efetiva destinação do benefício a investimentos, tampouco acréscimo patrimonial real. Ao contrário, considerou que os lançamentos contábeis eram artificiais e até mesmo fraudulentos. Assim, manteve-se a tributação, negando a exclusão das subvenções da base do IRPJ/CSLL.
Essa decisão, em linha restritiva, enfatiza a necessidade de lastro econômico e comprovação efetiva da subvenção, afastando benefícios gerais que apenas reduzem a carga tributária sem transferência de recursos.
As duas decisões refletem leituras distintas do mesmo quadro normativo e jurisprudencial:
- Interpretação ampliativa: Privilegia o caráter formal da LC 160/17, que teria transformado automaticamente os incentivos fiscais de ICMS em subvenções para investimento, dispensando comprovações adicionais. Esse entendimento favorece a previsibilidade e o pacto federativo, além de reduzir litígios.
- Interpretação restritiva: Enfatiza a materialidade da subvenção, exigindo acréscimo patrimonial e comprovação de destinação a investimentos. Evita a utilização artificial de exonerações genéricas como instrumentos de supressão tributária, mas amplia a insegurança jurídica e a litigiosidade.
Sob a ótica teórica, o embate pode ser compreendido como a colisão entre dois princípios estruturantes: segurança jurídica (previsibilidade e respeito à lei formal) e capacidade contributiva (tributação baseada em efetivo acréscimo econômico).
A análise das decisões evidencia que a jurisprudência administrativa ainda não se estabilizou, mesmo após o julgamento do Tema 1.182 pelo STJ. Essa instabilidade compromete tanto a previsibilidade das relações jurídicas quanto o ambiente de negócios, ao perpetuar a insegurança acerca da tributação das subvenções de ICMS


