Assédio moral horizontal nas relações de trabalho
Este artigo analisa o assédio moral horizontal no Direito do Trabalho, explicando conceito, características, exemplos e a responsabilidade do empregador em prevenir, coibir e reparar os danos.
sexta-feira, 5 de setembro de 2025
Atualizado às 15:03
O assédio moral é uma chaga social que contamina o ambiente de trabalho, adoecendo indivíduos e corroendo a própria estrutura da dignidade laboral. Enquanto os holofotes frequentemente se voltam para a violência vertical, perpetrada por superiores hierárquicos, uma forma igualmente nefasta de agressão permanece sob o véu da invisibilidade: o assédio moral horizontal. Trata-se de uma violência psicológica praticada entre pares, que, sem o abuso clássico do poder diretivo, se manifesta de forma insidiosa e devastadora.
Conforme amplamente discutido na doutrina trabalhista, notadamente por autores como Hirigoyen (2002) e Ramos e Gália (2012), o assédio moral horizontal se configura pela perseguição sistemática, pela exclusão deliberada e pela humilhação contínua de um trabalhador por seus próprios colegas. A agressão não emana de uma ordem, mas de um consenso tóxico, de coalizões que isolam e fragilizam a vítima, transformando o que deveria ser um ambiente de colaboração em uma arena de sofrimento. Como bem adverte a Cartilha do Ministério do Trabalho e Emprego (2009), tais práticas minam a relação do indivíduo com seu ofício, colocando em xeque não apenas seu emprego, mas sua saúde mental.
A prática do assédio moral horizontal nem sempre é um movimento espontâneo do grupo, podendo ser incentivada ou tolerada pela estrutura de poder, assim algumas modalidades são:
a) Horizontal puro: colegas atacam diretamente a vítima, explorando diferenças individuais, como idade, gênero, etnia, orientação sexual e desempenho profissional.
b) Horizontal por aderência: colegas se alinham ao chefe assediador, reforçando o assédio vertical.
c) Horizontal por aderência inversa: ocorre pela omissão, quando colegas e até a chefia ignoram as agressões, legitimando o agressor.
As formas de manifestação são sutis, mas cumulativas e devastadoras como o isolamento social, ignorar a presença do colega, excluí-lo de conversas, reuniões informais ou confraternizações boicote profissional como sonegar informações cruciais para a execução de suas tarefas, esconder documentos, recusar-se a colaborar, difamação, através do espalhamento de rumores maliciosos sobre a vida pessoal, competência profissional ou até mesmo saúde mental da vítima. Outras manifestações são a ridicularização pelas constantes brincadeiras de mau gosto, apelidos vexatórios cccríticas em público, desqualificação profissional e pessoal, como questionar sistematicamente suas opiniões, ideias e trabalho, menosprezando suas contribuições. O assédio pode ser mais grave quando ocorrem através de ameaças veladas, com insinuações sobre a perda do emprego ou sobre consequências ruins se ele não "se enquadra".
Ainda que o empregador não seja o agressor direto, a legislação e a doutrina atribuem sua responsabilidade, isso porque o empregador detém o poder de direção (art. 2º da CLT), que implica
não apenas o direito de comandar, mas sobretudo o dever de organizar e proteger. Esse dever de proteção, decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88) e da função social do contrato de trabalho, impõe ao empregador uma obrigação positiva de garantir um ambiente de trabalho seguro e saudável, livre de violência psicológica.
A jurisprudência trabalhista tem sido firme ao reconhecer essa responsabilidade sob diferentes óticas. Seja pela culpa in vigilando e in elegendo, que impõe ao empregador a obrigação de vigiar e coibir os atos ilícitos de seus prepostos; seja pela teoria do risco da atividade, que o obriga a mitigar os riscos inerentes à organização do trabalho; ou, de forma mais contundente, pela violação direta dos deveres de proteção anexos ao contrato de trabalho, fundamentados na boa-fé objetiva. A omissão patronal, em qualquer desses cenários, é uma falha grave que legitima a agressão e atrai para si o dever de reparar.
As cicatrizes deixadas pelo assédio horizontal transcendem a rotina de trabalho. Para a vítima, abrem-se as portas para a rescisão indireta do contrato (art. 483 da CLT), para a justa busca
por indenizações por danos morais e existenciais, e, nos casos mais severos, para o doloroso caminho do afastamento previdenciário. Para o empregador, as consequências vão além da condenação financeira. A mancha em sua reputação, a perda de talentos e a instauração de um clima organizacional tóxico são passivos que nenhum balanço pode calcular.
A prova do assédio moral horizontal, é certo, permanece um desafio, dada a natureza dissimulada da violência, mas entre os meios de prova mais aceitos estão: e-mails, prints de mensagens em aplicativos de trabalho, gravações de áudio feitas por um dos participantes da conversa, depoimentos de testemunhas, além de laudos médicos e psicológicos que comprovem o nexo causal. Em situações excepcionais, pode-se pleitear judicialmente a quebra de sigilo de dados, desde que devidamente autorizada pelo juiz.
Em conclusão, o assédio moral horizontal não é um simples conflito entre colegas, mas uma violência silenciosa que destrói vidas e corrói organizações. O Direito do Trabalho impõe ao empregador um papel ativo: prevenir, coibir e reparar. Sua responsabilização objetiva funciona como instrumento pedagógico, deixando claro que a empresa não é um território sem lei.
Combater o assédio não é apenas obrigação jurídica, mas um investimento em dignidade, saúde e produtividade. A omissão, além de custosa, é inaceitável, pois um CNPJ não pode se sobrepor à dignidade humana daquele que não é um mero CPF.



