Inteligência artificial na Receita Federal e os limites jurídicos
O artigo analisa o uso de IA pela Receita Federal no cruzamento de dados imobiliários, destacando impactos tributários, riscos constitucionais e medidas preventivas.
terça-feira, 23 de setembro de 2025
Atualizado às 10:40
1. Introdução
A Administração Tributária brasileira vivencia uma profunda transformação, impulsionada pela digitalização massiva de dados e pela busca incessante por maior eficiência na arrecadação e no combate à evasão fiscal. Nesse cenário, a utilização de tecnologias disruptivas, como a IA, deixa de ser uma tendência futurista para se consolidar como uma ferramenta estratégica do Fisco.
Um dos marcos mais significativos dessa nova era é a anunciada implementação, a partir de janeiro de 2026, de um sistema de IA pela RFN - Receita Federal do Brasil destinado a cruzar informações do Cinter - Cadastro Nacional de Imóveis e do CIB - Cadastro Imobiliário Brasileiro, com o objetivo de identificar inconsistências nas declarações de imposto de renda relacionadas à posse e ao uso de imóveis.
Esta iniciativa, amparada pela recente LC 214, de 16/1/251, promulgada no âmbito da reforma tributária, promete revolucionar a fiscalização de operações como locação e comodato, que frequentemente se mantêm na informalidade.
Ao automatizar a verificação da titularidade de imóveis declarados como residência, o sistema visa expor tanto proprietários que omitem rendimentos de aluguel quanto inquilinos que não declaram os pagamentos efetuados, além de pressionar pela formalização de contratos de comodato, especialmente em arranjos familiares.
Contudo, a transição para uma fiscalização algorítmica não está isenta de complexos desafios jurídicos. A aparente eficiência e objetividade dos sistemas automatizados suscita debates sobre a sua compatibilidade com garantias constitucionais fundamentais dos contribuintes.
Questões como a validade de notificações geradas sem intervenção humana direta, a transparência dos critérios utilizados pelos algoritmos (a chamada "caixa-preta"), o direito ao contraditório e à ampla defesa frente a uma decisão maquínica, e o próprio princípio do devido processo legal, emergem como pontos centrais de tensão.
O presente artigo propõe-se a analisar criticamente este novo paradigma da fiscalização tributária. Para tanto, examinará o arcabouço normativo e tecnológico que viabiliza o cruzamento de dados imobiliários, detalhará as implicações tributárias para os contribuintes e, por fim, aprofundará a análise dos desafios jurídico-constitucionais inerentes à fiscalização por algoritmos.
Ao final, buscará oferecer uma reflexão sobre o equilíbrio necessário entre a modernização do Estado e a salvaguarda dos direitos fundamentais, apresentando recomendações práticas para a adequação dos contribuintes a esta nova realidade fiscal.
2. O novo arcabouço normativo e tecnológico da fiscalização imobiliária
A capacidade da Receita Federal de implementar um sistema de fiscalização tão abrangente e automatizado não surge de forma isolada. Ela é o resultado de uma evolução legislativa e tecnológica que vem, ao longo dos últimos anos, construindo as bases para uma administração tributária cada vez mais digital e integrada.
A reforma tributária, catalisada pela EC 132/23, e a subsequente regulamentação, como a LC 214/25, representam o ápice desse movimento, fornecendo o suporte jurídico necessário para a consolidação de cadastros unificados e a aplicação de novas tecnologias de análise de dados.
2.1. A reforma tributária e a LC 214/25
Embora o foco principal da reforma tributária seja a simplificação do sistema de tributação sobre o consumo, com a criação do IBS - Imposto sobre Bens e Serviços e da CBS - Contribuição sobre Bens e Serviços, suas ramificações estendem-se por todo o sistema tributário nacional.
A LC 214/25, principal norma regulamentadora da reforma, ao instituir os novos tributos, também estabeleceu mecanismos de modernização da administração fiscal que são cruciais para o tema em análise. A lei prevê expressamente a necessidade de integração de dados e o uso de tecnologia para garantir a eficiência do novo sistema1.
Mais especificamente, a legislação da reforma cria um ambiente que não apenas permite, mas incentiva o compartilhamento de informações entre os entes federativos e a utilização de uma base de dados unificada para a apuração de tributos.
É nesse contexto que a integração de cadastros imobiliários ganha força, servindo não apenas aos novos tributos sobre o consumo em operações imobiliárias, mas também potencializando a fiscalização de tributos já existentes, como o Imposto de Renda.
2.2. A integração Sinter/CIB e a criação do "CPF do imóvel"
O alicerce tecnológico para a nova fiscalização da Receita Federal é a integração entre o Sinter - Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais e o CIB - Cadastro Imobiliário Brasileiro. O Sinter, regulamentado pelo decreto 11.208/22, foi concebido para unificar as informações cadastrais, geoespaciais, fiscais e jurídicas relativas aos imóveis urbanos e rurais em todo o território nacional.
O CIB, por sua vez, funciona como um identificador único para cada imóvel, análogo a um CPF, eliminando a multiplicidade de registros e matrículas existentes nos âmbitos municipal, estadual e Federal2.
A IN RFB 2.275, de 18/8/25, detalhou a operacionalização dessa integração, estabelecendo a obrigatoriedade de adoção do CIB em todos os atos e registros notariais e de imóveis, e determinando o compartilhamento eletrônico e imediato de dados com a Receita Federal3. Essa norma transforma as diretrizes do decreto em obrigações operacionais, criando um fluxo contínuo de informações sobre qualquer transação imobiliária.
Um dos conceitos mais impactantes introduzidos por essa regulamentação é a possibilidade de a administração tributária estimar o valor de referência dos imóveis. Conforme os arts. 13, 255 e 256 da LC 214/25, esse valor, apurado com base nos dados compartilhados via SINTER/CIB, poderá ser utilizado para fins de fiscalização e arbitramento da base de cálculo de tributos em operações imobiliárias3.
Embora sua aplicação primária seja para o IBS/CBS, é evidente o seu potencial para a fiscalização do Imposto de Renda, permitindo à Receita Federal identificar discrepâncias entre os valores declarados em transações e o valor de mercado estimado pelo sistema.
3. A IA como ferramenta da Receita Federal
Com o alicerce normativo e tecnológico estabelecido, a inteligência artificial emerge como o motor que impulsionará a nova fase da fiscalização imobiliária. O sistema proposto pela Receita Federal não se limitará a armazenar dados, mas os processará ativamente para identificar padrões, anomalias e inconsistências que, até então, exigiriam um trabalho manual intensivo e, muitas vezes, inviável em larga escala.
3.1. A mecânica do cruzamento automatizado de dados
A operação do sistema de IA baseia-se em uma premissa simples: comparar a informação de endereço fornecida pelo contribuinte em sua DIRPF - Declaração de Ajuste Anual do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física com os dados de titularidade do imóvel registrados no CIB. Quando o sistema detectar que o endereço residencial declarado não corresponde a um imóvel de propriedade do declarante, um processo de verificação automatizado será iniciado.
O algoritmo investigará, então, a existência de um vínculo formal que justifique a ocupação do imóvel, como um contrato de locação ou de comodato devidamente registrado ou informado. A base para essa verificação reside, em grande parte, na obrigação já existente para os locatários. O art. 975 do regulamento do Imposto de Renda (decreto 9.580/18) estabelece que as pessoas físicas devem informar à Receita Federal, juntamente com a declaração de ajuste, os pagamentos efetuados a outras pessoas físicas que configurem rendimento tributável para o beneficiário4. Isso inclui, notadamente, os pagamentos de aluguel.
A ausência de um contrato de locação correspondente ou a falta de declaração do pagamento pelo inquilino acenderá um alerta no sistema, gerando uma notificação automática para que o contribuinte (seja o proprietário, seja o ocupante) preste esclarecimentos. A IA será calibrada para identificar não apenas a ausência de declaração, mas também tentativas de dissimular a relação locatícia, como transferências financeiras regulares e de valor compatível com um aluguel entre as partes envolvidas, caracterizando o que a autoridade fiscal denomina de combate ao "jeitinho brasileiro"5.
3.2. Implicações tributárias para os contribuintes
As consequências da implementação desse sistema se desdobram em múltiplas frentes, afetando proprietários, inquilinos e familiares em relações de comodato.
- Para os proprietários (locadores): A principal implicação é a fiscalização rigorosa da omissão de rendimentos de aluguel. O proprietário de um imóvel ocupado por terceiro, sem um contrato de comodato formalizado, será presumivelmente considerado um locador que não está declarando os rendimentos auferidos, sujeitando-se à cobrança do imposto devido sobre os valores arbitrados pela fiscalização, acrescido de multa que pode chegar a 20%, além dos juros moratórios.
- Para os ocupantes (locatários): Embora a obrigação principal de recolher o imposto sobre o aluguel seja do locador, o locatário também está no radar do Fisco. A não declaração dos valores pagos a título de aluguel na ficha de "Pagamentos Efetuados" da DIRPF constitui uma infração à legislação tributária (art. 975 do RIR), podendo levar à retenção em malha fina e à aplicação de penalidades.
- Para as relações de comodato: O comodato, que é o empréstimo gratuito de um bem, é uma prática extremamente comum, sobretudo entre pais e filhos. Com a nova fiscalização, a ausência de um contrato escrito e, preferencialmente, registrado, que formalize a gratuidade da cessão, cria uma perigosa presunção de que existe uma relação de aluguel não declarada. A Receita Federal poderá interpretar a situação como uma omissão de rendimentos por parte do proprietário, exigindo que o contribuinte produza provas robustas para afastar tal presunção. O contrato de comodato passa, portanto, de uma formalidade opcional para um instrumento indispensável de segurança jurídica.
4. Desafios jurídico-constitucionais da fiscalização algorítmica
A eficiência e a escalabilidade prometidas pela fiscalização baseada em inteligência artificial trazem consigo uma série de tensões com os direitos e garantias fundamentais dos contribuintes, consagrados na Constituição Federal. A transição de um modelo de fiscalização predominantemente humano para um sistema automatizado de tomada de decisão exige uma análise criteriosa sobre a preservação de princípios basilares do Estado Democrático de Direito.
4.1. O devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa frente às decisões automatizadas
O princípio do devido processo legal, em sua dimensão substantiva e processual (art. 5º, LIV, CF), assegura que ninguém será privado de seus bens sem o procedimento adequado. Quando uma notificação de lançamento ou uma multa é gerada automaticamente por um algoritmo, a questão que se impõe é se esse procedimento maquínico respeita as garantias do contribuinte. A decisão automatizada, por sua natureza, carece da cognição e da discricionariedade inerentes ao ato administrativo praticado por um agente humano.
O risco de erros, vieses nos algoritmos ou falhas na interpretação de dados é uma realidade6. Uma situação de comodato legítima, porém, não formalizada, pode ser erroneamente interpretada como locação, gerando uma autuação indevida. Nesse contexto, o ônus de provar a inexistência do fato gerador recai inteiramente sobre o contribuinte, que se vê obrigado a desconstituir uma presunção gerada por um sistema computacional. Isso representa uma inversão do ônus probatório que pode ferir o contraditório e a ampla defesa (art. 5º, LV, CF), uma vez que o contribuinte é colocado em uma posição de vulnerabilidade, tendo que lutar contra uma conclusão pré-estabelecida por uma máquina.
4.2. O princípio da transparência e a "caixa-preta" dos algoritmos
Todo ato administrativo deve ser motivado, explicitando os fundamentos de fato e de direito que levaram à sua prática. Este é um corolário do princípio da publicidade e da transparência (art. 37, caput, CF). A jurisprudência do STJ é pacífica ao exigir uma motivação clara e suficiente nos atos administrativos, inclusive os fiscais, como forma de garantir o seu controle e a defesa do administrado7.
No entanto, a fiscalização algorítmica opera, muitas vezes, como uma "caixa-preta" (black box). Os critérios exatos, as correlações de dados e a ponderação de variáveis que levam o algoritmo a uma determinada conclusão são complexos e, em geral, não são acessíveis ou compreensíveis para o cidadão comum. A simples notificação de que "foi identificada uma inconsistência" não satisfaz a exigência de motivação.
Para que o contribuinte possa exercer plenamente seu direito de defesa, é imperativo que ele conheça as razões precisas que fundamentaram a autuação, o que inclui o acesso à lógica do algoritmo ou, no mínimo, a um relatório detalhado e compreensível do seu funcionamento no caso concreto.
Nesse sentido, o PL 2.338/23, que visa estabelecer um marco legal para o uso de inteligência artificial no Brasil, aponta para a necessidade de transparência, explicabilidade e responsabilidade nos sistemas de IA, especialmente aqueles utilizados pelo poder público em decisões que afetam direitos8. A regulamentação será essencial para equilibrar a eficiência arrecadatória com a proteção contra a opacidade e a arbitrariedade algorítmica.
4.3. A necessidade de supervisão humana e o controle judicial
Diante dos riscos de erros e da complexidade dos sistemas de IA, a garantia de uma supervisão humana efetiva é fundamental. As decisões automatizadas não podem ser absolutas e irrecorríveis. É preciso assegurar que o contribuinte tenha o direito a uma revisão de seu caso por um agente fiscal humano, capaz de analisar as nuances e particularidades que o algoritmo pode não ter considerado. Essa supervisão funciona como uma salvaguarda contra a rigidez do sistema e um mecanismo de correção de injustiças pontuais.
Ademais, o papel do Poder Judiciário se torna ainda mais relevante. Compete aos juízes e tribunais exercer o controle de legalidade e constitucionalidade sobre essa nova modalidade de atuação fiscal. Isso envolverá não apenas a análise do caso concreto, mas também a avaliação da própria validade do sistema de fiscalização, verificando se os algoritmos utilizados respeitam os princípios constitucionais, se não são discriminatórios e se garantem a transparência e a motivação adequadas.
A atuação judicial será decisiva para moldar os limites da fiscalização tributária na era digital, impedindo que a busca por eficiência se sobreponha aos direitos fundamentais dos contribuintes.
5. Recomendações e medidas preventivas aos contribuintes
Diante do novo cenário de fiscalização intensiva e automatizada, a adoção de uma postura proativa e preventiva por parte dos contribuintes torna-se essencial para mitigar riscos e evitar litígios com o Fisco. A informalidade, antes tolerada pela dificuldade de fiscalização em massa, passa a representar um passivo tributário de alto risco. As seguintes medidas são recomendadas:
5.1. A importância da formalização contratual
O principal antídoto contra as presunções geradas pelo sistema de inteligência artificial é a prova documental robusta. Nesse sentido, a formalização de negócios jurídicos que envolvam a cessão de uso de imóveis é a medida mais crucial.
- Contratos de locação: Todos os aluguéis, independentemente do valor, devem ser objeto de um contrato escrito. O documento deve detalhar as partes, o objeto, o valor do aluguel e o prazo da locação. A existência de um contrato claro facilita a declaração correta dos rendimentos pelo locador e dos pagamentos pelo locatário, alinhando as informações que serão cruzadas pela Receita Federal.
- Contratos de comodato: Para situações de empréstimo gratuito de imóveis, especialmente comuns entre familiares, a celebração de um contrato de comodato é agora indispensável. Este documento serve como prova inequívoca da gratuidade da cessão, afastando a presunção de existência de uma locação não declarada.
Recomenda-se que o contrato tenha as firmas das partes reconhecidas em cartório e, para maior segurança jurídica, que seja registrado no Cartório de Títulos e Documentos. Além disso, é prudente que o comodatário (quem usa o imóvel) assuma o pagamento de despesas como IPTU, condomínio, água e luz, e que guarde os respectivos comprovantes em seu nome, reforçando a ausência de uma contraprestação financeira ao proprietário.
5.2. Regularidade cadastral e guarda de documentos
Manter a regularidade das informações e a organização dos documentos é outra linha de defesa fundamental. Os contribuintes devem revisar suas declarações de imposto de renda dos últimos cinco anos - período decadencial durante o qual a Receita Federal pode lançar tributos não pagos - para corrigir eventuais omissões ou inconsistências relacionadas a rendimentos de aluguel ou pagamentos efetuados.
É igualmente vital guardar todos os comprovantes de despesas relacionadas ao imóvel que possam corroborar a natureza da sua ocupação. Em uma eventual notificação, documentos como faturas de serviços públicos, boletos de condomínio e guias de IPTU em nome do ocupante podem ser decisivos para demonstrar a veracidade de um contrato de comodato ou para justificar determinadas particularidades de um contrato de locação.
5.3. Procedimentos de defesa contra notificações automáticas
Caso o contribuinte seja notificado pela Receita Federal, é importante agir de forma célere e técnica. As defesas e impugnações podem ser apresentadas por meio dos canais eletrônicos do Fisco, como o e-Defesa e o portal e-CAC. A defesa deve ser instruída com todos os documentos pertinentes - contratos, comprovantes de pagamento, extratos bancários, etc. - que demonstrem a realidade dos fatos e afastem a inconsistência apontada pelo sistema. Dada a complexidade técnica da matéria, a assistência de um advogado ou contador especializado em direito tributário é altamente recomendável para garantir a formulação de uma defesa robusta e aumentar as chances de êxito na esfera administrativa.
6. Conclusão
A implementação de inteligência artificial pela Receita Federal para o cruzamento de dados imobiliários representa um ponto de inflexão na história da fiscalização tributária no Brasil. Trata-se de um avanço tecnológico inegável, com potencial para aumentar significativamente a eficiência na arrecadação, combater a sonegação fiscal em operações de locação e induzir um maior grau de formalidade nas relações contratuais envolvendo imóveis.
A integração dos cadastros Sinter e CIB, materializada no "CPF do imóvel", cria um ecossistema de dados robusto, cujo poder de análise é exponencialmente amplificado pelo uso de algoritmos.
Contudo, como demonstrado ao longo deste artigo, a eficiência não pode ser o único critério a nortear a modernização da Administração Pública. A transição para uma fiscalização algorítmica impõe desafios profundos aos direitos e garantias fundamentais dos contribuintes.
A presunção de veracidade gerada por sistemas automatizados, a opacidade de seus critérios de decisão e o risco de erros sistêmicos colocam em xeque os princípios do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa e da transparência. A figura do contribuinte não pode ser reduzida a um conjunto de dados a ser processado, e a relação jurídico-tributária não pode prescindir da cognição, da motivação e da sensibilidade que caracterizam a atuação humana.
O caminho a ser trilhado exige um delicado equilíbrio. De um lado, é preciso abraçar a inovação como ferramenta para um sistema tributário mais justo e eficaz. De outro, é imperativo criar salvaguardas que protejam o cidadão contra a arbitrariedade e a opacidade das máquinas.
Isso passa pela criação de um marco regulatório claro para o uso de IA pelo Estado, pela garantia da transparência algorítmica, pela exigência de supervisão humana qualificada e pela manutenção de um controle judicial atento e rigoroso.
Para os contribuintes, a mensagem é clara: a era da informalidade consentida está chegando ao fim. A adequação ao novo paradigma exige uma mudança de cultura, pautada pela formalização de contratos, pela organização documental e pela busca de orientação profissional. Agir de forma preventiva não é apenas uma recomendação, mas uma necessidade para navegar com segurança jurídica em um ambiente fiscal cada vez mais digital e implacável. O futuro da tributação está na intersecção entre a tecnologia e o Direito, e o grande desafio será garantir que, nessa confluência, a justiça e os direitos fundamentais prevaleçam.
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1 BRASIL. Lei Complementar nº 214, de 16 de janeiro de 2025. Institui o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo (IS); cria o Comitê Gestor do IBS e altera a legislação tributária. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp214.htm. Acesso em: 17 set. 2025.
2 BRASIL. Decreto nº 11.208, de 26 de setembro de 2022. Institui o Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais e o Cadastro Imobiliário Brasileiro e dispõe sobre o compartilhamento de dados relativos a imóveis. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2022/decreto/D11208.htm. Acesso em: 17 set. 2025.
3 GIRELLI, André Ferronato; LIMA, Raphael Scheffer. "Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais - SINTER" e "Cadastro Imobiliário Brasileiro - CIB" são regulamentados pela Receita Federal no contexto da Reforma Tributária. Marins Bertoldi Advogados, 19 ago. 2025. Disponível em: https://marinsbertoldi.com.br/sistema-nacional-de-gestao-de-informacoes-territoriais-sinter-e-cadastro-imobiliario-brasileiro-cib-sao-regulamentados-pela-receita-federal-no-c/. Acesso em: 17 set. 2025.
4 BRASIL. Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018. Regulamenta a tributação, a fiscalização, a arrecadação e a administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/d9580.htm. Acesso em: 17 set. 2025.
5 CLICK PETRÓLEO E GÁS. Receita Federal usará IA para cruzar CINTER e CIB e notificar quem mora de favor a partir de janeiro de 2026. 16 set. 2025. Disponível em: https://clickpetroleoegas.com.br/receita-federal-usara-ia-para-cruzar-cinter-e-cib-e-notificar-quem-mora-de-favor-a-partir-de-janeiro-de-2026-mhbb01/. Acesso em: 17 set. 2025.
6 OLIVEIRA, Karina de. Reforma tributária e IA: Riscos da fiscalização algorítmica. Migalhas, 16 set. 2025. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/440070/reforma-tributaria-e-ia-riscos-da-fiscalizacao-algoritmica. Acesso em: 17 set. 2025.
7 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.907.044/GO. Relator: Ministro Herman Benjamin. Julgado em 23/02/2021. DJe 01/07/2021. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=133040959&num_registro=202003139500&data=20210825&tipo=5&formato=PDF. Acesso em: 17 set. 2025.
8 BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei nº 2.338/2023. Dispõe sobre o desenvolvimento, a implementação e o uso responsável de sistemas de inteligência artificial no Brasil. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2372222. Acesso em: 17 set. 2025.


