Advogado propõe comissão da OAB para conter abusos contra a imprensa
Advogado propõe à OAB/MA criar Comissão de Defesa da Liberdade de Expressão para conter abusos judiciais contra jornalistas e reafirmar a palavra livre como pilar do Estado Democrático.
quinta-feira, 9 de outubro de 2025
Atualizado às 11:10
A recente proposta de criação da Comissão de Defesa da Liberdade de Expressão e de Imprensa no âmbito da OAB/MA representa mais do que um ato administrativo interno - trata-se de uma afirmação institucional de resistência democrática. Em um Estado onde a liberdade de imprensa vem sendo frequentemente constrangida por ações penais de caráter punitivo e desproporcional, a advocacia maranhense assume o protagonismo que lhe é conferido pelo art. 44, I, do Estatuto da Advocacia (lei 8.906/94): a defesa intransigente da ordem jurídica e dos direitos fundamentais, em especial os consagrados nos arts. 5º, IV, IX e XIV e 220 da Constituição Federal.
O contexto que inspira a proposta é sintomático. O Maranhão tem assistido a uma preocupante distensão entre o dever de imparcialidade judicial e o ímpeto condenatório quando o réu é jornalista investigativo. Processos paradigmáticos sob esse prisma revelam órgãos que, em tese, deveriam fiscalizar a lei, céleres em acusar e omisso em garantir, que dispensam a aplicação instrumentos jurídicos previstos na legislação brasileira, instituto legalmente cabível e amplamente aplicado em supostos crimes de menor potencial ofensivo. O "silêncio" quanto a essa possibilidade processual e o uso de linguagem moralizante nas manifestações configuram uma conduta que se distancia da legalidade estrita e aproxima-se de um punitivismo institucionalizado, que ignora o princípio da intervenção mínima e a lógica do devido processo legal.
Mais do que um caso isolado, esse modelo de atuação reflete um padrão de assédio judicial à imprensa, onde a crítica política e o jornalismo investigativo são tratados como ameaça à ordem e não como exercício legítimo de cidadania. O resultado é o enfraquecimento do debate público e a instauração de um ambiente de medo jurídico, contrário à doutrina fixada pelo STF na ADPF 130 e nas Reclamações 22.328 (rel. min. Roberto Barroso) e 62.174 (Rel. Min. Flávio Dino), que vedam a censura prévia e determinam que eventuais excessos sejam corrigidos a posteriori por meios menos gravosos - como o direito de resposta ou indenização proporcional ao dano.
A proposta da OAB/MA, portanto, ganha contornos de necessidade histórica e jurídica. A criação da Comissão permitirá o acompanhamento técnico de ações que envolvam comunicadores, a emissão de pareceres e notas técnicas, e a atuação como amicus curiae em causas de censura e liberdade de imprensa. Mais do que proteger profissionais, o órgão será um freio institucional ao arbítrio, um espaço de racionalidade jurídica capaz de contrapor o ímpeto persecutório de órgãos que, em tese, deveriam zelar pela legalidade, mas vêm se comportando como partes interessadas na condenação.
A jurisprudência recente reforça a pertinência da medida. O STJ tem reafirmado, em precedentes como o AgInt no REsp 1.444.835/DF (rel. min. Raul Araújo), que a crítica política - mesmo dura, irônica ou impiedosa - não configura ato ilícito, desde que fundada em fatos verídicos ou verossímeis. O TSE, no REspEl 0600045-34/SE (rel. min. Edson Fachin), reconheceu que a mera reprodução de matéria jornalística não constitui propaganda negativa, mas manifestação legítima de expressão e fiscalização pública. E o próprio STF reafirma, de modo inequívoco, que a censura prévia é "ultima ratio", jamais instrumento ordinário do processo democrático.
Diante disso, a OAB/MA tem diante de si uma oportunidade atemporal: transformar a retórica da liberdade em política institucional permanente. A criação da Comissão de Defesa da Liberdade de Expressão e de Imprensa será um ato jurídico de afirmação democrática, um gesto de maturidade da advocacia maranhense diante de um Poder Judiciário que, não raras vezes, esquece que sua função é garantir, e não cercear, direitos fundamentais.
Em tempos de inversão de valores e de instrumentalização da Justiça para silenciar a crítica, a OAB/MA pode - e deve - reafirmar, com autoridade e coragem, que em um Estado Democrático de Direito, a palavra é livre, o processo é garantista e a censura jamais será rotina judicial.
O documento está tramitando sob o protocolo OAB/MA 10.0000.2025.013700-8.


