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Reforma tributária 42: A tributação do IOF para o IBS/CBS

Trata da passagem do IOF para o IBS/CBS.

sábado, 18 de outubro de 2025

Atualizado em 17 de outubro de 2025 15:04

O fim do IOF sobre operações financeiras e seguros não consta no cronograma da reforma tributária, porém, já em 2027, terá espectro reduzido.

O art. 23 da EC 132/23 determina que o art. 153, V, passará, a partir de 2027, a contar com a nova redação: "operações de crédito e câmbio ou relativas a títulos ou valores mobiliários", o que, por consequência, significa a exclusão sobre serviços financeiros e seguros.

A ausência de clareza e disciplina sobre essa transição em curso pode prejudicar o crédito financeiro para os fornecedores e, por consequência, para toda a sociedade.

Vamos tratar esse tema com algumas ponderações.

1. Tributação nas operações de crédito antes e após a reforma

As operações de crédito (empréstimos, financiamentos) eram sujeitas principalmente ao IOF, calculado sobre o valor total da operação, com alíquota variável (ex.: 0,38% + taxa diária para pessoas físicas). O imposto de renda continua a incidir sobre ganhos de aplicações. Contudo, as operações de crédito passarão a ser tributadas pelo IBS e CBS, com base na receita líquida (juros e rendimentos menos despesas de captação).

Não se inclui o valor do principal na base de cálculo, mas haverá a inclusão das variações cambiais e derivativos.

As operações entre cooperativa e associado, com recursos próprios ou públicos, não são tributadas, mas eram antes da reforma.

As operações de câmbio eram tributadas pelo IOF-Câmbio, com alíquotas diferenciadas (ex.: 1,1% para turismo; 0% para exportações). Agora serão tributadas pelo IBS/CBS sobre a receita líquida das operações, com dedução das despesas de câmbio, mantendo-se regras semelhantes às aplicadas ao crédito.

As operações com títulos e valores mobiliários, com ganhos de capital e rendimentos tributados pelo IR e, em alguns casos, pelo IOF-Títulos (para prazos curtos), também mudarão. No âmbito do IBS/CBS, a base será a diferença entre o valor de alienação e o custo de aquisição, com dedução de despesas autorizadas. Juros acima da SELIC podem ser excluídos para credores no regime específico.

Na securitização e factoring não havia incidência do IOF, porém a tributação ocorria pelo IRPJ/CSLL/PIS/Cofins sobre a receita da empresa. Agora, teremos também a incidência de IBS/CBS sobre o deságio (diferença entre valor de face e valor pago) na liquidação antecipada, com possibilidade de dedução de custos e perdas previstas em lei. Inclui também o FIDC - Fundo de Investimento em Direitos Creditórios para antecipação de recebíveis comerciais.

A alienação de bens dados em garantia não tem incidência de IBS/CBS (a tributação ocorria pelo ITBI em alguns casos e IR sobre ganho de capital) na consolidação da propriedade pelo credor. Porém, a venda do bem é tributada pelo IBS/CBS se o devedor original for contribuinte. Eventual valor devolvido ao devedor acima da dívida é sem tributos.

2. A EC 132/23

A EC 132 definiu os serviços financeiros contemplados nas reforma. Vejamos:

Art. 10. Para fins do disposto no inciso II do § 6º do art. 156-A da Constituição Federal, consideram-se:

I - serviços financeiros:

a) operações de crédito, câmbio, seguro, resseguro, consórcio, arrendamento mercantil, faturização, securitização, previdência privada, capitalização, arranjos de pagamento, operações com títulos e valores mobiliários, inclusive negociação e corretagem, e outras que impliquem captação, repasse, intermediação, gestão ou administração de recursos;

b) outros serviços prestados por entidades administradoras de mercados organizados, infraestruturas de mercado e depositárias centrais e por instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, na forma de lei complementar;

Não somente os serviços financeiros que estavam acobertados pelos IOF, outros serviços não contemplados também serão tributados com o IBS.

Também o próprio legislador resguardou alguns hipóteses de não incidência, conforme o § 1º, em relação às instituições financeiras bancárias: I - não se aplica o regime específico de que trata o art. 156-A, § 6º, II, da CF/88 aos serviços remunerados por tarifas e comissões, observado o disposto nas normas expedidas pelas entidades reguladoras;

O reformador constituinte também prevê a trava de arrecadação, pois os serviços financeiros sujeitam-se ao regime específico de que trata o art. 156-A, § 6º, II, da CF/88, devendo as alíquotas e as bases de cálculo serem definidas de modo a manter, em caráter geral, até o final do quinto ano da entrada em vigor do regime, a carga tributária decorrente dos tributos extintos. Mas como isso pode ser feito, essa é a questão.

3. Extinção gradual do IOF nas hipóteses contempladas na reforma tributária

O IOF será gradualmente extinto nessas operações e substituído pela CBS e, partir de 2029, pelo IBS, de forma que a base de cálculo passa a considerar receitas líquidas e não mais o valor total das operações. Mas as regras de 10/90, 20/80, 30/70 e 40/60 também se aplica ao IBS seguros e operações financeiras ou somente ao ISS e ICMS?

A atecnia do legislador ainda pode ser pior, pois prevê na nova redação ao art. 130, inciso I, alínea c: "do imposto previsto no art. 153, V, da Constituição Federal, sobre operações de seguros". Assim, questionamos como ficará o IOF sobre operações financeiras no periodo?

Independente, se incidência mitigada ou não, essa mudança tende a alterar a forma de precificação de crédito e investimentos, podendo aumentar o custo final ao tomador. O Brasil tem o sistema de crédito mais oneroso do mundo. E pode ainda encarecer mais, impondo uma restrição real ao crescimento do país. Além dessa constatação, a ausência de regulamentações mais detalhadas sobre o tema, disposto na EC 132/23, gera dúvidas para os debatedores, empresários e o sistema financeiro privado.

O ideal seria que a transição fosse gradual, permitindo adaptação do tomador de crédito no mercado financeiro. Mas não podemos afirmar que será gradativa, pois diferente do ISS e do ICMS não há previsão legal disciplinando a transição.

A tributação indireta, diferente da atual, também prejudica o contribuinte que não saberá o quanto de tributo tem no crédito contratado.

4. Linha do tempo - Transição IOF IBS/CBS

2025

  • IOF continua incidindo normalmente nas operações de crédito, câmbio, títulos, securitização e factoring.
  • IBS e CBS começam a ser aplicados em operações-teste para adequação das instituições financeiras (fase de calibragem).

2026

  • Primeiras operações efetivamente tributadas por IBS e CBS nas instituições financeiras, com base de cálculo sobre receita líquida.
  • IOF começa a ter alíquotas reduzidas em determinadas modalidades, conforme regulamentação do CMN e BACEN.

2027 a 2028

  • IOF sobre operações de crédito, câmbio, títulos e valores mobiliários deixa de existir nessas modalidades abrangidas.
  • IBS e CBS passam a ser a única tributação indireta sobre esses serviços financeiros (além de IR e CSLL, quando aplicável).
  • Fase de teste do IBS com alíquotas simbólicas: IBS-E (0,05%) e IBS-M (0,05%), totalizando 0,10%.

5. IBS/CBS sobre operações financeiras e seguros a partir de 2029

Sabemos que as alíquotas serão nacionalmente uniformes, com proporção mantida entre CBS e IBS. Mas nada se fala da entrada em vigor do IBS sobre seguros e operações financeiras.

De certo temos que o art. 189 da LC 214/25 estabelece que: de 2027 a 2033: alíquotas fixadas conforme art. 233 da mesma lei; e a partir de 2034: alíquotas fixadas para 2033.

O art. 233 prevê que as alíquotas devem manter a carga tributária incidente sobre as operações de crédito das instituições financeiras bancárias, tomando como base os dados de 1/1/22 a 31/12/23. A metodologia será definida por ato conjunto do ministro da Fazenda e do Comitê Gestor do IBS, com homologação do TCU.

O que questiono é: diante do silêncio da lei, diferente dos demais tributos, a entrada em vigor do IBS poderá antecipada para serviços financeiros e seguros?

A CBS incide a partir de 2027, mas o IBS sobre seguros e operações financeiras será a partir de quando?

6. Incompatibilidade entre o modelo do IOF e o CBS/IBS

Embora o legislador sustente que as alíquotas não encarecerão os serviços financeiros e de seguros, essa premissa é questionável, pois:

  • O IOF sobre seguros varia de acordo com o tipo: 0,38% (vida), 2,38% (saúde), 7,38% (bens) e isenção em financiamentos habitacionais.
  • As bases de cálculo são distintas: IOF incide sobre operações isoladas, enquanto IBS/CBS incide sobre a diferença entre ingressos e despesas.
  • Houve ampliação de hipóteses de incidência, como securitização e factoring.
  • Não é possível equiparar as duas estruturas, pois são de naturezas diversas.
  • O debate sobre reservas técnicas (Tema 1.309 do STF) continua pendente, o que pode afetar o cálculo da tributação.

Não me parece razoável tratar do não aumento de tributos quando a dinâmica de um e outro são absolutamente distintas. O modelo inscrito na norma é logicamente impraticável na realidade atual Não é possível sequer haver um prognóstico sobre se a arrecadação aumentará ou será reduzida, pois o modelo de arrecadação é difícil de fiscalização e controle.

Não me resta qualquer que o modelo novo muito pior do que o anterior.

Principais pontos

  • A EC 132/23 altera a incidência do IOF a partir de 2027, retirando seguros e parte dos serviços financeiros das hipóteses previstas no art. 153, V, da CF/88;
  • O IOF será gradualmente substituído por CBS e IBS, com base na receita líquida, mas essa transição não foi abordada na lei em relação ao IBS sobre seguros e operações financeiras;
  • As regras de transição apontam para o fim do PIS/COFINS e IPI, mas não tratam do IOF;
  • Operações de crédito, câmbio, títulos, securitização e factoring terão nova forma de cálculo, ou seja, a diferença entre entradas e despesas, o que torna impossível chegar a um bom termo de recebimento e fluxo da receita;
  • Não há nenhum dispositivo sobre a entrada em vigor antecipada do IBS para o setor financeiro em 2027 ou 2028, nem nada sobre transição do IOF para IBS a partir de 2029;
  • O fundamento do teto de arrecadação ou mesma a manutenção ou redução tem um grande entreve: a estrutura de cálculo e incidência do IOF e IBS/CBS são incompatíveis, o que pode gerar aumento de custos e/ou insegurança jurídica;
  • O IBS seguros e operações financeiras pode subsistir na fase de teste de 2027 a 2029, mas nada impede que seja cobrada a totalidade em 2027;
  • O fator STF ainda precisa ser considerado, pois o Tema 1309 pode impactar as reservas técnicas e tributação futura.

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BRASIL. Constituição (1988). Emenda Constitucional n.º 132, de 20 de dezembro de 2023.

BRASIL. Lei Complementar n.º 214, de 30 de dezembro de 2025.

BRASIL. Código Tributário Nacional (Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966).

BRASIL. Decreto n.º 6.306, de 14 de dezembro de 2007 (Regulamento do IOF).

STF - Supremo Tribunal Federal. Tema 1309 da repercussão geral: Incidência do PIS/Cofins sobre receitas financeiras das seguradoras - julgamento pendente.

BANCO CENTRAL DO BRASIL; CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL. Normas complementares sobre operações de crédito, câmbio e valores mobiliários.

Rosa Freitas

VIP Rosa Freitas

Doutora em Direito pelo PPGD/UFPE, advogada, professora universitária, Servidora pública, , palestrante e autora do livros "A nova Dogmática da tributação.dos Serviços no Brasil" e outros.

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