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37º aniversário da Constituição e o julgamento sobre pejotização

O texto discute o 37º aniversário da Constituição e o julgamento da pejotização, evidenciando preocupações sobre a dignidade do trabalho frente às recentes declarações do STF sobre pejotização.

sexta-feira, 10 de outubro de 2025

Atualizado às 10:21

No último dia 5/10, a Constituição completou 37 anos de sua promulgação. Filha de um conturbado cenário, em que se ladearam o entusiasmo democrático e as sequelas de um autoritarismo tacanho, ela nasceu apontando um caminho civilizatório, inspirada no ideário de segurança social e redemocratização por que também passaram os países ibéricos em tempos não tão distantes daquele 1988.

Assim como as anteriores, mas de maneira ainda mais profunda e fiel, ela sacramentou garantias fundamentais de liberdade, como o devido processo legal e o direito à propriedade, assim como impeliu o Estado a assegurar direitos mínimos fundamentais, agindo para assegurar saúde, educação, alimentação, previdência social e, também, trabalho digno!

Mesmo quando disciplinou a ordem econômica, o constituinte cuidou de destacar que ela era fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, com objetivo claro de assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.

Não por outra razão, muitos direitos trabalhistas, antes de estamento meramente legal, foram plasmados no art. 7º da CF, não com qualquer norma constitucional, mas entre os direitos e garantias fundamentais, insusceptíveis de supressão.

É certo que numa constituição tão exauriente como a nossa, evocar um sentido interpretativo originalista, como é comum nos conservadores americanos, beira à loucura. Ainda mais a se considerar que a Carta, em 37 anos, já passou por 136 emendas.

Os tempos mudam e assim a interpretação jurídica não pode ser escrava do passado. Por outro lado, a prudência de origem conservadora assim como o dinamismo de fundo progressista precisa um balancear o outro, a fim de que a estabilidade jurídica não seja deixada de lado em nome de um voluntarismo, de uma vontade de com uma canetada desconstruir anos de interpretação e, acima de tudo, o objetivo fundamental do constituinte, que ainda remanesce na Constituição: a salvaguarda à dignidade humana.

No campo do Direito do Trabalho, o STF vem se debruçando de maneira intensa nos últimos dias sobre dois temas correlatos: o trabalho mediante aplicativos e a pejotização. Ambos os temas polêmicos e que merecem atenção máxima da Suprema Corte, diante de tamanha celeuma.

É bom que se diga, no entanto, que é preciso prudência e não deixar de lado a Constituição. É imprescindível que os ministros olhem o tema da pejotização com sua individualidade e características próprias, não como faziam até a pouco, quando não o distinguiam da terceirização. Assim devem fazer na análise da chamada uberização, ou trabalho por aplicativos.

Quem é advogado trabalhista de ambos os lados da mesa da Justiça Obreira já tem notícias de empresas que, sob uma ideia que se tem passado por entrevistas de ministros do STF de que o que deve prevalecer é a liberdade da forma na contratação, tem arregimentado todo tipo de trabalhador via pejotização. Sim, operários, auxiliares de escritório, pessoal de faxina, enfim, tudo por meio de criação de empresas.

Caso prevaleça uma noção equivocada desta, não estaríamos só diante de uma refundação do direito do trabalho, não mais firmado no princípio basilar do contrato realidade - em que o hipossuficiente muitas vezes aceita condições indignas para poder alimentar-se -, mas testemunharíamos a olho nu a implosão de cláusulas pétreas e, via de consequência, da própria constituição.

Qual será o caminho que vamos seguir?

Nicolas Basilio

VIP Nicolas Basilio

Bacharel em direito no Largo de São Francisco-USP. Especialista em direito material e processual do trabalho na COGEAE-PUC/SP. Advogado trabalhista, sócio da TJ Martins Advogados.

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