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Afeto tem força de lei: STJ reconhece filiação socioafetiva após a morte

Por unanimidade, o STJ admitiu filiação socioafetiva post mortem, mesmo sem manifestação formal do falecido, consolidando a verdade afetiva como valor jurídico.

quarta-feira, 15 de outubro de 2025

Atualizado às 14:59

O caso: Quando o amor supera a ausência de formalidade

A 3ª turma do STJ, por unanimidade, reconheceu a possibilidade de declaração de filiação socioafetiva após a morte dos pais, mesmo sem manifestação formal de vontade do falecido.

O caso (REsp 2.227.835) envolvia uma mulher criada desde a infância por um casal já falecido. Embora nunca houvesse adoção formal, havia um vínculo real, público e contínuo de afeto.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que a questão não tratava de adoção - que exige consentimento formal -, mas sim de socioafetividade, cujo elemento essencial é a convivência duradoura.

"A filiação socioafetiva pós-morte pressupõe o reconhecimento de uma situação fática vivenciada pelas partes, independentemente de manifestação formal pelo de cujus", afirmou a relatora.

O ministro Moura Ribeiro fez ressalva de entendimento, apontando que o acórdão original tratava de mera guarda. Ainda assim, acompanhou a relatora "para preservar a coerência jurisprudencial da turma".

O fundamento: posse do estado de filho e publicidade da relação

O reconhecimento da paternidade socioafetiva tem como base a posse do estado de filho, formada pelo trato, fama e nome:

  • Trato: a convivência e o cuidado cotidiano;
  • Fama: o reconhecimento público da relação;
  • Nome: o vínculo simbólico e identitário.

Para o STJ, esses elementos foram amplamente demonstrados. O casal tratava a autora como filha, com afeto público e notório, o que impõe o reconhecimento da filiação socioafetiva.

"Negar a filiação nesse caso seria desconsiderar a dignidade da pessoa humana e a realidade afetiva consolidada", reforçou a ministra Nancy Andrighi.

O alcance jurídico: igualdade entre filhos e efeitos sucessórios

A decisão reafirma a igualdade plena entre filiação biológica, adotiva e socioafetiva, prevista no art. 227, §6º, da Constituição Federal e no art. 1.596 do CC.

Assim, o reconhecimento:

  • assegura registro civil como descendente;
  • garante participação na sucessão;
  • confere igualdade jurídica e moral entre todos os filhos.

O STJ também reforça que a ausência de manifestação formal não impede o reconhecimento de vínculos legítimos, desde que comprovada a convivência e o afeto público.

O cuidado necessário: prova robusta e equilíbrio jurídico

A decisão não abre portas para reconhecimentos automáticos. O voto do ministro Moura Ribeiro é um lembrete: a filiação socioafetiva post mortem exige prova robusta.

A comprovação deve ser consistente, sob pena de distorcer o instituto e fragilizar relações patrimoniais legítimas.

O STJ equilibrou a sensibilidade afetiva com a segurança jurídica, evitando que o Direito se torne refém da emoção, mas sem negar a sua humanidade.

Um novo marco de sensibilidade jurídica

O REsp 2.227.835 consolida o paradigma do afeto como valor jurídico. O STJ reconhece que a verdade do coração pode ter a mesma força que o vínculo biológico - desde que vivida, reconhecida e comprovada.

"A ausência de papel não apaga a presença do amor", resume o espírito da decisão.

Ao admitir a filiação socioafetiva post mortem, a Corte reafirma que o Direito de Família deve proteger realidades, não aparências.

Conclusão:

Ao reconhecer a filiação socioafetiva post mortem sem manifestação expressa, o STJ reafirma uma verdade que vai além das provas: quem foi pai ou mãe de coração merece ser reconhecido como tal pelo Direito.

A decisão é mais do que um precedente - é um gesto de justiça afetiva e coerência constitucional.

_______

Referência técnica

Processo: REsp 2.227.835

Relatora: Ministra Nancy Andrighi

Turma: 3ª turma do STJ

Julgamento: Unânime

Tema: Filiação socioafetiva post mortem sem manifestação expressa do falecido

Alessandro Junqueira de Souza Peixoto

VIP Alessandro Junqueira de Souza Peixoto

Advogado Especialista em Direito Imobiliário, Família e Sucessões, com 7 anos de experiência jurídica! Graduado pela PUC-GO. Pós-Graduado em Direito Imobiliário, Empresarial e Tributário Empresarial.

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