Desvendando os contratos de infoprodutos no ambiente digital
Descubra a validade dos contratos eletrônicos na aquisição de infoprodutos. Artigo esclarecedor sobre direitos e responsabilidades no mercado digital.
terça-feira, 21 de outubro de 2025
Atualizado às 14:35
1. Introdução
O mercado digital de infoprodutos cresceu significativamente, especialmente durante o período pandêmico, com consumidores adquirindo cursos, treinamentos e conteúdos diversos pela internet. Este artigo visa analisar a validade jurídica dos contratos eletrônicos de aquisição de infoprodutos, considerando os princípios contratuais e os direitos do consumidor. Para tanto, serão abordadas questões sobre a natureza dos infoprodutos, os termos e condições dos contratos digitais, bem como as obrigações e responsabilidades das partes envolvidas.
2. Da aquisição de produtos digitais (infoprodutos)
Os infoprodutos consistem em produtos digitais oferecidos no mercado online, tais como cursos, aulas, mentorias, e-books, entre outros. Sua aquisição geralmente ocorre por meio de plataformas digitais, onde o consumidor tem acesso às informações sobre o produto, seu conteúdo, preço e forma de pagamento. Importante destacar que os infoprodutos são produtos de meio, cujo propósito é fornecer conteúdo educativo, informativo ou de entretenimento, sem garantias de resultados específicos.
Neste sentido, é sabido que a prática costumeira do mercado digital é entregar treinamentos, aulas e conteúdos por meio da internet, sendo que o consumidor adquire o produto diretamente através de link, onde constam os dados do fornecedor, o conteúdo, o período de disponibilização, o valor e a forma de pagamento.
Ao adquirir um infoproduto, o consumidor exerce sua autonomia, ao adquirir ou não o produto, mediante o preenchimento de informações pessoais, o aceite dos termos acima elencados e após a escolha da forma de pagamento.
Não há, contudo, em qualquer produto digital, disponibilizado na internet, a restrição de que parte de conteúdos de aulas e treinamentos sejam alocados nas páginas de seus produtores, o que ocorre que por vezes até como forma de divulgação e publicidade de seus Infoprodutos, visando justamente levar a conhecimento de seus seguidores e possíveis consumidores os produtos ofertados.
O conteúdo dos produtos digitais podem ser disponibilizados através de diversas plataformas ao consumidor, ou seja, por meio de eBooks, podcasts, audiobooks, vídeos tutoriais, vídeo-aulas, aulas online através do Zoom ou de outras ferramentas, além de programas de mentorias online, cujos conteúdos são constituídos a partir de estudos teóricos e práticos, aliados à vivência de seus produtores, expostos pessoalmente ou por meio de profissionais convidados, não havendo quaisquer restrições nesse sentido.
Os Infoprodutos têm ganhado mercado no Brasil, principalmente decorrente do período pandêmico que vivenciamos, período em que as pessoas passaram a assistir aulas online, ou seja, por EAD - Ensino à Distância, bem como a consumir conteúdos na internet, através das plataformas acima mencionadas.
E não há promessa de resultado, até porque se trata de um produto de meio, em que se entrega conteúdo de maneira organizada, visando entreter, ensinar, gerar engajamento, apontar sugestões para resolução de situações cotidianas e/ou apoiar alguma necessidade da pessoa que adquiriu o infoproduto.
No entanto, é certo que a percepção do consumidor em relação ao conteúdo adquirido parte de questões próprias e individuais, a partir do que é entregue, não havendo condição do produtor interferir nesse animus de entender e praticar o conteúdo exposto.
Por mais que se trate de um "novo mercado", que cresceu a partir da pandemia, verifica-se que a relação jurídica estabelecida deve observar os ditames do CC e do CDC.
Sendo que, em relação ao direito contratual, exercido pelo consumidor ao pactuar com a rede ou instituição de ensino para adquirir o produto, deve inicialmente se cercar de cuidados como escolher instituição de ensino ou infoprodutor conceituado no mercado, buscar entender o que o produto oferece em termos de conteúdo e acesso, qual plataforma disponibiliza o conteúdo e por qual período. Ao mesmo tempo, precisa estar ciente de suas obrigações contratuais, sendo que inicialmente deve pagar o valor cobrado e, em seguida, inevitavelmente, se dispor consumir o conteúdo disponibilizado.
E, como toda relação de consumo, aquela estabelecida no ambiente virtual também está baseada nos princípios da boa-fé, da lealdade e da veracidade. Ora, se de um lado o produtor deve entregar o seu melhor, com base no escopo do conteúdo do produto ofertado, de outro lado, ao consumidor incumbe a obrigação de assistir às aulas e aos treinamentos, assimilar o conteúdo e praticá-lo na medida de sua realidade.
Contudo, seria leviano aceitar que o consumidor poderia alegar insatisfação pelo simples fato de que não conseguir colocar em prática todo o ensino, muito menos se sequer se dispõe a assistir às aulas para ter acesso a todo o conteúdo disponibilizado.
3. Do contrato eletrônico de venda de infoprodutos e sua validade
Consoante ensina Sales (2022), contrato eletrônico é, assim como os demais contratos pactuados através de outras ferramentas, a manifestação da vontade das partes, cujo objeto é constituir, modificar ou extinguir direitos, sendo que, nesse caso, a ferramenta utilizada será sempre de telecomunicação eletrônica ou digital, e sempre celebrado à distância. Trata-se da oferta do produto ou do serviço, e da sua aceitação pelas partes, por meio virtual, ou seja, desmaterializado.
Ora, o fato de o contrato eletrônico ser realizado através de ferramentas diferentes daquelas utilizadas em tempos pretéritos, normalmente de forma verbal ou escrito em papel, não se trata de um novo tipo de contrato. Sendo assim, para sua celebração é preciso ter em mente que se trata de um negócio jurídico bilateral, ou multilateral, em que se cria obrigações para ambas as partes, discorrendo sobre direitos titulados por elas ou por terceiros.
No entanto, continua prescindindo dos requisitos de validade previstos no art. 104 do CC, a saber, agente capaz, objeto lícito, possível, determinado, ou determinável, forma prescrita ou não defesa em lei.
Portanto, a forma é livre, ou seja, desde que não haja proibição na lei, será sempre válido ainda que pactuado pela forma eletrônica, uma vez que se trata de um ato volitivo, baseado na autonomia e no consenso das partes, em que a ferramenta de celebração do contrato é o meio eletrônico.
Sendo assim, o contrato pactuado pelas partes para entrega de treinamentos, aulas e/ou mentorias, por meio digital, é válido para os fins de direito e deve ser cumprido pelas partes.
Veja que o CDC relativiza o princípio da força obrigatória dos contratos por aplicação do princípio da onerosidade excessiva, pelo qual a jurisprudência já trazia a possibilidade de revisão dos atos negociais, quando presente situação que cause onerosidade excessiva para uma das partes, face à insurgência de situação imprevista.
No entanto não há que se considerar como situação imprevista ou que cause obrigação demasiadamente excessiva à parte contratante, o simples fato desta eventualmente não se sentir satisfeita com o conteúdo do produto digital que adquiriu ou de apresentar incapacidade pessoal de assistir às aulas.
Daí, importante que se diga que o princípio da boa-fé objetiva, previsto no art. 422 do CC, e reconhecido pelo art. 4º, inciso III do CDC, prevê que "os contratantes são obrigados a guardar assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e da boa-fé".
E, a boa-fé objetiva traz consigo conceitos que impõem às partes deveres implícitos, ou seja, deveres anexos de conduta, especialmente quanto à obrigação de cumprir o pactuado ou o que ficou convencionado pela intenção das partes, bem como o de exercer seus direitos inerentes ao contrato dentro do prazo estipulado ou do prazo legal.
Há que se considerar que no caso em apreço verifica-se violação de tais mandamentos, uma vez que, adquirindo um produto digital em que ficam claros os dados para usufruir do produto, o consumidor deixa de fazê-lo por simples ausência de vontade, e depois busca o cancelamento da compra ou a restituição de valores por simples alegação de insatisfação, deixando de realizar o comportamento assumido e esperado de assistir todas aulas, treinamentos e de comparecer aos encontros sugeridos, não cumpre o mínimo esperado.
E, ainda, em segundo lugar, quando o consumidor deixa de exercer o direito de arrependimento no prazo de 7(sete) dias, previsto no art. 49 do CDC, sendo que após esse prazo busca o cancelamento da compra, sob qualquer argumento, prejudicando o fornecedor contratado.
Observe-se que na página de venda do produto digital adquirido constavam todos os requisitos essenciais ao contrato, quais sejam, o objeto, o preço e as condições de pagamento. Sendo assim, foi cumprido o que determina o art. 31 do CDC, não havendo que se aplicar as penalidades previstas no art. 35 do CDC, pela ausência de cumprimento da oferta, sujeitando o fornecedor à rescisão contratual e à devolução de quantias pagas e/ou à suspensão de cobrança de parcelas do preço do produto.
Além disso, a validade dos contratos de infoprodutos celebrados por meio de termos de uso digitais encontra respaldo em diversos dispositivos legais, destacando-se o marco civil da internet, a LGPD - Lei Geral de Proteção de Dados e a lei de propriedade intelectual. Essas legislações estabelecem parâmetros importantes para garantir a segurança jurídica e a proteção dos direitos das partes envolvidas nas transações digitais.
O marco civil da internet, lei 12.965/14, estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil, incluindo as relações contratuais estabelecidas por meio dessa ferramenta.
A LGPD, lei 13.709/18, por sua vez, regula o tratamento de dados pessoais por parte de empresas públicas e privadas, impondo obrigações específicas quanto à coleta, armazenamento, uso, compartilhamento e exclusão desses dados. Os termos de uso dos infoprodutos devem estar em conformidade com as disposições da LGPD, garantindo a proteção da privacidade e dos direitos dos consumidores em relação às suas informações pessoais.
Além disso, a lei de direitos autorais, lei 9.610/1998, estabelece os direitos autorais do autor do conteúdo e da metodologia disponibilizados em forma digital, assim como qualquer outra produção de conteúdo físico.
Portanto, a validade dos contratos de infoprodutos celebrados por meio dos termos de uso digitais está diretamente relacionada ao cumprimento das normas estabelecidas pelo CDC, marco civil da internet, LGPD - Lei Geral de Proteção de Dados, bem como da lei de direitos autorais.
Ao observar essas legislações, os fornecedores de infoprodutos garantem a legalidade e eficácia de seus contratos, protegendo assim os direitos das partes envolvidas e promovendo uma relação contratual transparente e segura no ambiente digital.
4. Obrigações e responsabilidades das partes
Em regra, o produtor de infoprodutos assume a responsabilidade de fornecer conteúdo de qualidade, conforme o prometido na oferta do produto. Isso inclui garantir o acesso ao material, fornecer suporte técnico quando necessário e cumprir com eventuais garantias ou políticas de reembolso previstas nos termos de uso.
Por outro lado, ao adquirir um infoproduto, o consumidor assume o compromisso de assistir às aulas, treinamentos ou consumir o conteúdo disponibilizado de acordo com as orientações do produtor. Além disso, deve respeitar os prazos de acesso estabelecidos e agir de boa-fé em relação ao cumprimento das obrigações contratuais.
5. Princípios que norteiam os contratos eletrônicos de venda de infoprodutos
Assim, antes de chegar à conclusão sobre a validade e cumprimento dos contratos eletrônicos de aquisição de infoprodutos, é fundamental entender os direitos e obrigações que recaem sobre ambas as partes envolvidas. Segundo os princípios do direito contratual, as partes têm uma série de deveres e garantias que devem ser observados ao longo da relação contratual. Dentre esses princípios, destacam-se:
- Princípio da autonomia da vontade: As partes têm liberdade para estabelecer os termos e condições do contrato de acordo com seus interesses, desde que não violem a lei ou os direitos de terceiros.
- Princípio da boa-fé: As partes devem agir de boa-fé durante a negociação, celebração e execução do contrato. Isso implica em agir com lealdade, transparência e honestidade, buscando sempre cumprir com as obrigações assumidas e não agindo de maneira contrária aos interesses da outra parte.
- Princípio da equidade: O contrato deve buscar um equilíbrio entre as partes, garantindo que nenhum dos contratantes seja prejudicado de forma desproporcional. Isso inclui a revisão do contrato em caso de situações imprevistas que causem uma onerosidade excessiva a uma das partes.
- Princípio da boa execução do contrato: Ambas as partes têm a obrigação de cumprir com as obrigações assumidas de acordo com os termos do contrato. Isso implica em realizar todas as ações necessárias para alcançar os objetivos estabelecidos, seja por parte do produtor, fornecendo o conteúdo prometido, ou por parte do consumidor, consumindo o conteúdo de acordo com as orientações.
Além disto, estes contratos estão regulados pelo CDC, aplicando-se os princípios consumeristas a relação entre infoprodutor e consumidor.
Portanto, os contratos de infoprodutos devem ser conduzidos de acordo com esses princípios, garantindo uma relação contratual justa e equilibrada entre as partes envolvidas. A observância desses direitos e obrigações é essencial para o funcionamento adequado do mercado digital de infoprodutos e para a proteção dos direitos dos consumidores.
6. Conclusão
Em síntese, os contratos eletrônicos de aquisição de infoprodutos representam uma intersecção entre a tecnologia educativa e o Direito Contratual, proporcionando aos consumidores acesso a uma variedade de conteúdos digitais. Esses contratos, regidos pelos princípios do Direito Contratual, estabelecem direitos e obrigações claras para ambas as partes envolvidas.
Os contratos eletrônicos, como manifestações de vontade expressas por meio de ferramentas digitais, seguem os requisitos de validade previstos no ordenamento jurídico, garantindo assim sua eficácia e aplicabilidade. No entanto, a não observância das obrigações por qualquer das partes pode acarretar consequências adversas.
Se as obrigações do produtor não forem cumpridas, como a entrega do conteúdo prometido, o consumidor pode ter direito a rescindir o contrato e exigir a devolução do valor pago ou até mesmo buscar indenização por eventuais danos. Da mesma forma, se o consumidor não cumprir suas obrigações, como assistir às aulas ou utilizar o conteúdo disponibilizado, o produtor pode tomar medidas legais para garantir o cumprimento do contrato ou buscar reparação por prejuízos sofridos.
Portanto, é essencial que as partes ajam com boa-fé e cumpram com as obrigações assumidas nos contratos eletrônicos de aquisição de infoprodutos, promovendo assim uma relação contratual justa, equilibrada e satisfatória para ambas as partes.
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BRASIL. [Código de Defesa do Consumidor (1990)]. Lei n. 8.078/1990. Publicada em 12 de setembro de 1990. Disponível em: < L8078compilado (planalto.gov.br)>. Acesso em: 07 fev. 2024.
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SALES, Fernando Augusto de Vita Borges de. O direito digital e as relações jurídicas privadas na internet. Leme-SP: Mizuno, 2022. Pág. 109.


