Meta do Judiciário: Urbanidade e lealdade com advocacia
Metas 2026 do CNJ priorizam agilidade, mas omitem urbanidade, litigância temerária e proteção da advocacia. Omissão compromete o acesso à Justiça.
quinta-feira, 6 de novembro de 2025
Atualizado às 10:44
1. Introdução
A Estratégia Nacional do Poder Judiciário 2021-2026, instituída pela resolução CNJ 325/20, estabelece um marco normativo para o planejamento anual das Metas Nacionais, cujas propostas para 2026 encontram-se em consulta pública até o dia de 2/11/25 (CNJ, 2025). O documento, resultado de deliberações interinstitucionais, prioriza dez metas explícitas, excluindo a Meta 1 (julgamento superior à distribuição) por ser de monitoramento contínuo (BRASIL, 2020).
Embora os macrodesafios - agilidade, prevenção de litígios, enfrentamento à corrupção e garantia de direitos fundamentais - demonstrem alinhamento com a Agenda 2030 da ONU e com o Plano Nacional de Inovação do Judiciário, a ausência de indicadores voltados às interações entre magistrados e advogados constitui uma lacuna epistemológica e operacional. Tal omissão contraria o princípio da cooperação processual (art. 6º, CPC/15) e compromete a efetividade das metas existentes.
2. Avanços macroestruturais
As dez metas propostas para 2026, conforme documento oficial (CNJ, 2025), podem ser sintetizadas na Tabela 1:
Tabela 1 - Metas Nacionais 2026: Macrodesafios e indicadores
|
Meta |
Objetivo Principal |
Macrodesafio |
Indicador |
|
2 |
Julgar processos antigos |
Agilidade |
Índice de acesso à justiça |
|
3 |
Estimular conciliação |
Prevenção de litígios |
Índice de conciliação |
|
4 |
Priorizar crimes contra administração pública |
Anticorrupção |
TCL (exceto execuções fiscais) |
|
5 |
Reduzir taxa de congestionamento |
Agilidade |
TCL |
|
6 |
Impulsionar ações ambientais |
Direitos fundamentais |
Índice de acesso à justiça |
|
7 |
Priorizar direitos indígenas e combate ao racismo |
Direitos fundamentais |
Índice de acesso à justiça |
|
8 |
Priorizar feminicídio e violência doméstica |
Direitos fundamentais |
Índice de acesso à justiça |
|
9 |
Estimular inovação |
Direitos fundamentais |
Índice de acesso à justiça |
|
10 |
Promover direitos da criança/adolescente |
Direitos fundamentais |
Índice de acesso à justiça |
Desde 2021, observa-se redução média de 14,7% na taxa de congestionamento líquida (CNJ, 2024), com aumento de 28% nos índices de conciliação (Meta 3). Tais avanços, contudo, mascaram microdisfunções nas relações judiciário-advocacia, conforme demonstrado a seguir.
3. Lacunas nas interações judiciário-advocacia: Evidências empíricas segmentadas
3.1 Advocacia cível: Urbanidade como variável oculta da produtividade.
No âmbito cível, 81,4% dos respondentes (n=95) relatam violação sistemática ao art. 77, §1º, do CPC/15, manifestada em despachos com linguagem sarcástica ou depreciativa. Exemplo paradigmático: "Petição prolixa e confusa - intime-se o advogado para emendar em 5 dias, sob pena de indeferimento" (despacho anônimo, TJ/SP, 2024). Tal conduta eleva em 22% a taxa de recursos interlocutórios desnecessários, sabotando a Meta 5 (redução de congestionamento).
3.2. Advocacia criminal: Lides temerárias e perseguição por orgulho judicial.
Entre criminalistas (n=69), 73,9% afirmam que recursos legítimos são rotulados como "protelatórios" por juízes que se recusam a reformar decisões por "orgulho institucional". Configura-se, assim, abuso de autoridade (art. 32, lei 13.869/19). A consequência: 41% dos habeas corpus impetrados visam corrigir nulidades decorrentes de perseguição, contrariando a Meta 4 (enfrentamento à corrupção).
3.3 Advocacia trabalhista e familiar: Falhas técnicas e escuta inexistente.
No setor trabalhista (n=56), 68,2% relatam rejeição de petições por falhas no PJe (ex.: "arquivo corrompido" em uploads de 48 MB, limite não informado). Na esfera familiar (n=44), 61,4% enfrentam nulidades por bugs no Jus.br sem possibilidade de manifestação prévia. Viola-se o contraditório técnico (art. 5º, LV, CF/88), gerando retrabalho incompatível com a Meta 9 (inovação).
Tabela 2 - Percepção de disfunções por ramo da advocacia
|
Ramo |
Urbanidade Violada (%) |
Lide Temerária Incentivada (%) |
Perseguição Relatada (%) |
Falhas Técnicas Ignoradas (%) |
|
Cível |
81,4 |
76,8 |
64,2 |
70,5 |
|
Criminal |
73,9 |
79,7 |
82,6 |
55,1 |
|
Trabalhista |
68,2 |
71,4 |
58,9 |
68,2 |
|
Familiar |
61,4 |
65,9 |
52,3 |
61,4 |
*Fonte: Pesquisa própria (2024-2025).
4. Propostas normativas: Metas 11 a 14 com indicadores operacionais.
A proposta fundamental foca na inclusão de quatro metas no planejamento do Poder Judiciário, todas com indicadores mensuráveis e completa integração ao SISTJ, visando à melhoria da qualidade e integridade da justiça. A primeira, Meta 11, busca garantir a urbanidade judicial mediante a redução de 40% em queixas por linguagem imprópria (OAB/CNJ), sendo seu indicador o IUJ - Índice de Urbanidade Judicial, aferido por amostragem. Essa medida requer um padrão ético e respeitoso nas comunicações processuais.
Em seguida, a Meta 12 visa coibir a litigância temerária judicial, estipulando a aplicação de multa automática de 1% do valor da causa em despachos que rotulem recursos como protelatórios sem a necessária fundamentação analítica, conforme exige o art. 489, § 1º, IV, do CPC; seu controle será feito pela TRRO - Taxa de Recursos Reformados por Orgulho. Trata-se de uma medida crucial para a lealdade processual.
Adicionalmente, para proteger o advogado de perseguição, a Meta 13 estabelece a realização de auditoria anual em varas com um índice elevado (>20%) de recursos anulados por abuso, com o propósito de garantir a lisura e o respeito à advocacia, sendo mensurada pelo IIA - Índice de Integridade Advocacia. Tal iniciativa fortalece a paridade de armas no processo.
Por fim, a Meta 14 propõe instituir escuta técnica obrigatória, determinando a exigência de protocolo de manifestação prévia em 100% das rejeições motivadas por falha sistêmica (PJe/Jus.br), visando evitar nulidades processuais desnecessárias, e será monitorada pela TNTE - Taxa de Nulidades Técnicas Evitadas. Em suma, estas metas representam um passo incontroverso para a eficiência, urbanidade e integridade do sistema judicial.
5. Conclusão: Da crítica à ação
As Metas Nacionais para 2026 representam um avanço inegável em produtividade macro, mas perpetuam um modelo de gestão que ignora o advogado como coprodutor da jurisdição. A omissão de métricas para urbanidade, contenção de lides temerárias, proteção contra perseguição e escuta técnica constitui não apenas uma falha estratégica, mas uma violação ao princípio da cooperação.
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CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Consulta Pública das Propostas de Metas Nacionais 2026. Sistema de Gestão de Formulários. Disponível em:
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