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Prazos recursais no Direito de Trânsito

Uma multa não contestada dentro do prazo certo pode evoluir para suspensão, cassação ou bloqueio da CNH, e muitas vezes o condutor sequer sabe que tinha direito de defesa.

terça-feira, 11 de novembro de 2025

Atualizado às 08:58

Introdução: Prazos que decidem o futuro da sua CNH

No Direito de Trânsito, o tempo é o maior inimigo do motorista. Uma multa não contestada dentro do prazo certo pode evoluir para suspensão, cassação ou bloqueio da CNH, e muitas vezes o condutor sequer sabe que tinha direito de defesa.

A legislação brasileira, especialmente o CTB - Código de Trânsito Brasileiro e as resoluções do CONTRAN, garante a todo cidadão o direito de ampla defesa e contraditório. No entanto, esses direitos são condicionados a prazos muito específicos, e a perda de um único dia pode significar o fim da chance de reverter a penalidade.

Este artigo apresenta, de forma técnica e detalhada, os principais prazos recursais nos processos de multa, suspensão, cassação e bloqueio, além de um ponto especial sobre a recusa ao teste do bafômetro, uma das infrações mais polêmicas do sistema de trânsito atual.

2. Multa de trânsito: Do auto de infração à penalidade definitiva

O ponto de partida de qualquer processo administrativo de trânsito é o AIT - Auto de Infração. Quando um agente de trânsito registra uma infração - seja por abordagem direta ou por meio eletrônico (como radares e câmeras) - o órgão autuador tem até 30 dias para expedir a Notificação de Autuação, conforme o art. 281, parágrafo único, inciso II, do CTB.

Prazo para defesa prévia

Após o recebimento da notificação, o condutor tem 30 dias para apresentar a defesa prévia (art. 4º, resolução CONTRAN 918/22).

Nesta fase, é possível contestar erros formais, como:

  • Placa incorreta;
  • Inconsistência no horário, local ou tipificação da infração;
  • Falta de assinatura do agente;
  • Falha na identificação do condutor.

Se a defesa for indeferida ou não apresentada, o órgão expedirá a NIP - Notificação de Imposição de Penalidade, momento em que a multa é efetivamente aplicada.

Prazo para recurso à JARI

Contra a penalidade, o condutor tem 30 dias contados da data de notificação para apresentar recurso à JARI - Junta Administrativa de Recursos de Infrações, conforme o art. 285 do CTB.

Caso a decisão seja desfavorável, ainda cabe recurso em 2ª instância.

Prazo para recurso em 2ª instância

O prazo também é de 30 dias (art. 288, CTB), e o recurso será julgado pelo CETRAN - Conselho Estadual de Trânsito, pelo CONTRANDIFE (no DF) ou pelo Colegiado Especial (quando o órgão autuador for da União).

Somente após essa decisão o processo é considerado definitivamente encerrado.

Importante: enquanto houver recurso pendente, a penalidade não pode ser executada. Ou seja, pontos e valores não devem ser lançados definitivamente no prontuário do condutor até o trânsito em julgado administrativo.

3. Suspensão do direito de dirigir: O prazo mais ignorado e mais grave

A suspensão do direito de dirigir é uma penalidade prevista nos arts. 256, III e 261 do CTB, aplicada quando:

  • O condutor acumula 20, 30 ou 40 pontos, dependendo do histórico de infrações; ou
  • Comete uma infração autossuspensiva (como dirigir sob influência de álcool, art. 165).

O DETRAN é o órgão competente para instaurar o processo. O condutor recebe uma Notificação de Instauração de Processo de Suspensão, e a partir daí começam a contar os prazos recursais.

Defesa prévia

Prazo: 30 dias contados do recebimento da notificação.

Aqui, é possível alegar vícios no procedimento, duplicidade de autuação ou ausência de notificação válida da multa que originou o processo.

Recurso à JARI

Se a defesa for indeferida, o condutor poderá recorrer em 30 dias à JARI, conforme o art. 288 do CTB.

Recurso em 2ª instância

Caso a decisão continue desfavorável, ainda há 30 dias para recurso ao CETRAN.

Durante todo o trâmite recursal, a penalidade não pode ser executada. Só após o trânsito em julgado administrativo é que o condutor deve entregar a CNH e cumprir o prazo de suspensão determinado (entre 6 meses e 12 meses, podendo chegar a 24 meses em casos reincidentes).

4. Cassação da CNH: O processo mais definitivo

A cassação da CNH - Carteira Nacional de Habilitação está prevista no art. 263 do CTB e ocorre, principalmente, em três situações:

  1. Quando o condutor dirige com a CNH suspensa;
  2. Quando é reincidente em infrações gravíssimas específicas;
  3. Quando o condutor estrangeiro com permissão dirige após o prazo legal.

Trata-se de uma penalidade muito mais severa que a suspensão, pois o condutor perde o documento de forma definitiva e só pode solicitar nova habilitação após dois anos, passando novamente por todo o processo de formação de condutores.

Prazos recursais

  • Defesa prévia: 30 dias da notificação;
  • Recurso à JARI: 30 dias do indeferimento;
  • Recurso ao CETRAN: 30 dias após nova negativa.

Durante o trâmite, a CNH permanece válida. Só após decisão final e notificação da cassação é que o condutor deve entregar o documento. O descumprimento dessa obrigação pode gerar bloqueio administrativo e nova penalidade.

5. Bloqueio da CNH: Medida administrativa que exige atenção

O bloqueio da CNH não é uma penalidade em si, mas uma medida administrativa utilizada para impedir que o condutor pratique atos junto ao DETRAN enquanto houver pendências judiciais, administrativas ou financeiras.

Pode ocorrer por motivos como:

  • Falta de pagamento de multas;
  • Processos de suspensão ou cassação em aberto;
  • Determinação judicial.

Apesar de não ter um prazo recursal específico, o bloqueio pode ser questionado administrativamente com base no princípio do devido processo legal (art. 5º, LV, CF).

Assim, se o condutor não foi notificado devidamente do motivo do bloqueio, ele tem o direito de exigir a regularização imediata do procedimento ou apresentar defesa administrativa em até 30 dias, com base nas regras subsidiárias da lei 9.784/1999.

6. Recusa ao bafômetro: Um caso à parte

A recusa ao teste do etilômetro (popularmente conhecido como "bafômetro") é tratada no art. 165-A do CTB, introduzido pela lei 13.281/16.

O dispositivo determina que recusar-se a realizar o teste, exame clínico ou perícia destinados a comprovar embriaguez é uma infração autossuspensiva, sujeita às mesmas penalidades de dirigir sob influência de álcool, ainda que sem prova de embriaguez.

Penalidades

  • Multa de R$ 2.934,70 (dez vezes o valor da gravíssima);
  • Suspensão do direito de dirigir por 12 meses;
  • Recolhimento da CNH e retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado.

Controvérsias Jurídicas

Há intenso debate jurídico sobre a constitucionalidade da penalidade, uma vez que a recusa se apoia no direito à não autoincriminação (art. 5º, LXIII, CF).

Tribunais estaduais e federais têm decisões divergentes: alguns entendem que a recusa é legítima, outros afirmam que a penalidade é inconstitucional.

Enquanto o STF não pacifica o tema, os prazos recursais continuam válidos:

  • Defesa prévia: 30 dias da notificação;
  • Recurso à JARI: 30 dias;
  • Recurso ao CETRAN: 30 dias.

Por isso, é fundamental recorrer, especialmente quando não há prova concreta de embriaguez (como vídeos, testemunhas ou exame clínico), pois o auto de infração por mera recusa pode ser anulado por vício formal ou por falta de motivação.

7. Conclusão: Tempo, técnica e estratégia

Em todos os casos - multa, suspensão, cassação, bloqueio ou recusa ao bafômetro - o que separa a punição da absolvição é a observância dos prazos e a qualidade técnica da defesa.

Um único erro na data de protocolo, na identificação do órgão autuador ou na fundamentação legal pode inviabilizar a análise do mérito do recurso, transformando uma infração contestável em uma penalidade definitiva.

O sistema de trânsito brasileiro é complexo e, por vezes, contraditório. Por isso, contar com um advogado especializado em Direito de Trânsito e Transporte é essencial para garantir que o processo seja tratado com rigor técnico, dentro dos prazos legais e com todas as possibilidades de defesa administrativa e judicial asseguradas.

Carlos Eduardo Dias Djamdjian

VIP Carlos Eduardo Dias Djamdjian

Advogado especialista em Direito de Trânsito e Transportes, CEO da DJM Advogados, Pós Graduado em Direito de Trânsito, Presidente da Comissão de Trânsito e Transportes OAB/SP - Santana (2019-2022) .

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