Inteligência artificial aplicada à gestão jurídica em empresas de grande volumetria de processos
A tecnologia na advocacia de massa padroniza análise, reduz erros, otimiza recursos e potencializa decisões estratégicas, transformando processos em insights precisos e escaláveis.
segunda-feira, 17 de novembro de 2025
Atualizado em 14 de novembro de 2025 13:18
Em escritórios e empresas que lidam com uma grande volumetria de processos, a operação manual de análise e classificação de casos representa um desafio constante. Mesmo com equipes experientes, erros e inconsistências são inevitáveis: um processo pode ser classificado incorretamente, a defesa pode ser elaborada divergente ao objeto da ação ou informações cruciais podem passar despercebidas. O resultado prático? Defesas genéricas, retrabalho e, por fim, decisões menos estratégicas.
Gestores e responsáveis pela estratégia frequentemente se questionam: como os subsídios coletados estão sendo utilizados pelas equipes? Todo o esforço dedicado à análise e à coleta documental está, de fato, influenciando os resultados das defesas, ou a operação está, de certa forma, "às cegas", sem clareza do impacto real de cada decisão estratégica?
O grande desafio da operação manual reside na sua dependência do esforço humano, que é inerentemente limitado e suscetível à variabilidade. Cada colaborador pode adotar critérios distintos ao classificar processos ou ao coletar informações vitais, como por exemplo a causa de perda de uma ação. Isso gera inconsistência, dificuldade em manter padrões e, inevitavelmente, uma perda significativa de eficiência.
A metodologia tradicional de gestão de processos massivos frequentemente recorre à análise por amostragem, na qual apenas um subconjunto dos casos é examinado detalhadamente. Em contraste, o volume remanescente recebe uma análise superficial. Esta abordagem restringe a capacidade de obtenção de insights precisos e compromete a fundamentação das decisões estratégicas em dados abrangentes e confiáveis.
A inteligência artificial surge como uma solução robusta e escalável para esses desafios. Ela permite a padronização rigorosa de critérios de análise, o processamento de grandes volumes de informações de forma rápida e precisa, e a identificação de padrões que seriam praticamente impossíveis de serem percebidos manualmente. Além disso, viabiliza a personalização de defesas conforme o perfil do magistrado ou características da comarca.
Com a IA, é possível processar 100% dos processos, garantindo classificação adequada e utilização assertiva dos subsídios, especialmente na compreensão da causa de perda. O processo envolve análise de planilhas de processos, download integral dos autos nos tribunais, separação de inicial, contestação, sentença e acórdão, aplicação de agentes de IA para extração e classificação de informações e exportação de planilhas para análise estratégica. A tecnologia ainda identifica faturas em discussão, concessão de liminares e seu status.
Questões mais complexas, como a identificação da causa de perda atingiu 91,37% de acerto, um dado de extrema relevância estratégica, pois permite que os gestores compreendam e atuem diretamente sobre os fatores que levam à derrota processual em massa, corrigindo falhas na operação ou na tese jurídica.
É fundamental destacar que a IA não substitui o trabalho humano, mas sim potencializa a expertise jurídica. Ela libera profissionais para se concentrarem em estratégias mais complexas e decisões críticas, enquanto a tecnologia cuida do processamento, da organização e da análise minuciosa dos dados.
Entre os principais benefícios observados com a implementação da IA em processos do setor de energia elétrica, destacam-se a precisão e a padronização, com a aplicação de critérios únicos e consistentes a todos os processos; a redução do retrabalho e a otimização da alocação de recursos; a escalabilidade, com a capacidade de lidar com grandes volumes de dados sem a necessidade de aumentar a equipe na mesma proporção; e a estratégia adaptativa, que permite defesas personalizadas de acordo com as características de cada caso, magistrado, turma ou comarca.
Mais do que apenas uma melhoria operacional, a aplicação da IA transforma a forma como a advocacia é exercida, tornando-a mais assertiva, verdadeiramente estratégica e baseada em dados concretos.
A tecnologia trouxe à advocacia de massa um novo horizonte: aquele em que as decisões não são mais fundamentadas em esforço manual ou intuição, mas em informação precisa, padronizada e escalável. Escrever defesas com base em análises consistentes aumenta a eficiência, reduz a margem de erros e permite que os profissionais do Direito foquem naquilo que realmente importa: a estratégia, a personalização e a entrega de resultados concretos aos clientes.
Essa transformação, embora aplicada aqui ao setor jurídico, serve como um poderoso indicativo de que a IA tem o potencial de impactar positivamente qualquer área que lide com grandes volumes de dados e necessidade de padronização e análise estratégica.
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Referências
Mat Andrews, Patrick Bromiley, Elizabeth Chow, Thomas Gibson. A Machine Learning Framework for Legal Document Recommendations. ResearchGate, 2023. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/386158549_A_Machine_Learning_Framework_for_Legal_Document_Recommendations. Acesso em: 20 out. 2025.
Ana Julia de Freitas Correa
Acadêmica de Direito na Uniderp e profissional com atuação no escritório Mascarenhas Barbosa Advogados e Associados, com experiência no contencioso de massa cível e administrativo, além de participação em projetos de automação e aplicação de Inteligência Artificial voltados à gestão jurídica no setor elétrico.


