Fraudes e confusão patrimonial: Como o CCS desvenda o devedor oculto
O artigo aborda como o BACEN CCS ajuda a desvendar fraudes locais, ressaltando a ocultação de bens e a importância de uma resposta firme do Judiciário.
terça-feira, 9 de dezembro de 2025
Atualizado às 09:34
O esquema da ocultação: O devedor e o "laranja"
Uma das práticas mais insidiosas para frustrar a execução é a ocultação de bens. O sócio executado ou devedor repassa seu patrimônio para o nome de terceiros, conhecidos popularmente como "laranjas" ou "testas de ferro".
Seu TCC foca em uma modalidade particularmente sofisticada dessa fraude: a confusão patrimonial envolvendo procuradores e representantes de conta corrente.
Neste esquema, o devedor (réu na execução) aproveita sua posição de confiança - seja como procurador, representante legal ou simplesmente alguém com acesso - para utilizar a conta bancária de um terceiro.
Dessa forma, ele consegue:
- Ocultar ativos: O devedor transfere seu dinheiro para a conta do "laranja", passando a movimentá-la como se fosse sua.
- Evitar a penhora online: Valores depositados em seu nome poderiam ser atingidos pelo convênio BACEN JUD. Ao abrir contas em nome de terceiros (laranjas) e administrá-las via procuração, ele se mantém "aparentemente insolvente".
- Criar confusão patrimonial: Os limites entre o patrimônio do devedor e o do titular da conta (o laranja) tornam-se indistintos, dificultando a penhora.
Essa manobra não só obstrui a satisfação do credor, mas mina a base do processo executivo, que exige transparência e clareza patrimonial.
A confusão patrimonial e a fraude à execução
A confusão patrimonial é a interposição indissolúvel entre os bens de diferentes sujeitos, na qual os limites de titularidade se obscurecem. Quando essa confusão é deliberada e tem o objetivo de frustrar o crédito, ela se entrelaça com o instituto da fraude à execução.
A fraude à execução é um ato atentatório à dignidade da justiça, caracterizado por atos do devedor que esvaziam seu patrimônio durante o curso de um processo judicial. A lei visa, assim, proteger a função jurisdicional e o direito do credor de receber.
A complexidade da fraude via procurador reside justamente no fato de que o ativo a ser atingido está tecnicamente em nome de um terceiro, o "laranja", que muitas vezes confiava no devedor
O BACEN CCS como ferramenta de combate
Diante dessas artimanhas, o Poder Judiciário tem buscado meios legais para detectar tais estratagemas. O BACEN CCS - Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional surge como uma ferramenta fundamental.
O CCS foi criado por determinação legal (lei 10.701/03, que incluiu o art. 10-A na lei de lavagem de dinheiro) com o objetivo principal de auxiliar investigações financeiras. Sua relevância para a execução se deve à sua natureza cadastral.
O que o CCS faz:
- Natureza cadastral: O sistema identifica as instituições financeiras nas quais os clientes mantêm relacionamentos (contas, poupança, investimentos).
- Detecção de representação: Crucialmente, o cadastro contempla informações sobre relacionamentos bancários mantidos diretamente pelos clientes ou por intermédio de seus representantes legais ou procuradores.
- Revelação de sócio oculto: Ao identificar procurações outorgadas a pessoas que não figuram nos contratos sociais ou que administram valores para terceiros, o CCS pode revelar a existência de confusão patrimonial ou de um sócio de fato.
O STJ já reafirmou que a consulta ao CCS-Bacen é plenamente possível em procedimentos cíveis. A pesquisa atua como um subsídio à eventual constrição, pois, embora não informe saldos ou movimentações financeiras, permite "alargar a margem de pesquisa por bens".
A Justiça do Trabalho e o CNJ também reconhecem a utilidade desta ferramenta. O enunciado 11 da Jornada Nacional sobre Execução na Justiça do Trabalho considera o CCS um instrumento eficaz para identificar fraudes e tornar a execução mais efetiva.
Recentemente, a nova funcionalidade do Sisbajud - Sistema de Busca de Ativos do Poder Judiciário integrou a consulta ao CCS, tornando-a instantânea, o que agiliza a identificação de relacionamentos bancários do executado e seus procuradores.
Conclusão e perspectiva necessária
A fraude cometida por procuradores e representantes de conta corrente na execução civil, nutrida pela confusão patrimonial intencional, exige uma resposta firme e precisa do sistema jurídico.
Conforme apontado, a execução civil precisa de uma atuação judicial proativa. Não basta reagir; é preciso antecipar e prevenir. Para desmantelar esses esquemas, é fundamental que o sistema de justiça utilize ferramentas investigativas modernas, como o BACEN CCS/Sisbajud, permitindo a quebra de sigilo bancário do titular da conta usada fraudulentamente, se necessário, para rastrear e perseguir o patrimônio do devedor.
Essa abordagem deve buscar não apenas a recuperação dos ativos desviados, mas também a desmotivação da prática dessas condutas.
Ao combinar rigor técnico com uma interpretação crítica das normas, o Poder Judiciário poderá desmascarar a verdadeira titularidade dos bens confundidos e devolver a eficácia ao processo executivo, garantindo que a justiça se manifeste para todos.
A luta contra a confusão patrimonial é como desvendar um labirinto financeiro: sem as ferramentas investigativas certas, o credor fica preso, mas com o uso estratégico do CCS, o caminho para o patrimônio oculto se revela, passo a passo.


