A revogação do mandato judicial e o destaque dos honorários contratuais
O destaque dos honorários contratuais é "direito adquirido" do advogado e deve ser respeitado mesmo quando houver a revogação de seu mandato.
quinta-feira, 27 de novembro de 2025
Atualizado às 14:31
Em recente julgado, o STJ posicionou-se contrariamente à reserva dos honorários advocatícios sucumbenciais e contratuais pelo causídico que teve o seu mandato judicial revogado1.
O voto condutor fundamentou-se no entendimento de que a cassação do mandato judicial acarreta invariavelmente uma lide a respeito dos honorários, o que viria a constituir uma "lide secundária no bojo de uma relação jurídica já estabilizada"2 (sic), o que inexoravelmente criaria um indesejado "tumulto processual"3.
Este entendimento vem sendo mantido4 diante das mais variadas condições factuais pelas quais se opera a cassação do mandato judicial, muitas das quais sem que se cogite, sequer, se há de fato um "litígio" quanto aos honorários.
Se a revogação do mandato ocorre com o processo em fase de conhecimento, com certeza há uma situação de indefinição jurídica e não há como falar em "destaque de honorários" em tais circunstâncias, a não ser como um pedido previamente lançado nos autos, para ser apreciado quando do julgamento final.
Igual indefinição jurídica acontece com relação aos honorários sucumbenciais referentes ao cumprimento de sentença, advenientes da resistência do devedor. Nesta hipótese, assim como no exemplo anterior, também dependem de uma definição que virá quando do julgamento da impugnação.
Em todas estas hipóteses há "lide", uma "indefinição" a justificar o entendimento de que qualquer conversa a respeito do destaque de honorários - "lide secundária" - deve ser conduzida a latere, para que não se promova um indesejado "tumulto processual". A solução jurisprudencial apontada para esta situação é a de escantear o assunto para uma "ação autônoma", entre o causídico e seu ex-cliente.
Mas este não é o caso do pedido de destaque dos honorários contratuais relativos ao processo de conhecimento que transitou em julgado e cujo cumprimento de sentença se iniciou com o mesmo causídico.
Nesta hipótese, não só a "lide primária" (fase cognitiva) estará estabilizada para iniciar a sua execução (cumprimento de sentença), como também a relação jurídica cliente/advogado: afinal, se o contrato de honorários contiver previsão de pagamento sob condições cujo implemento possa ser apreciável summaria cognitio e estas se relacionarem apenas ao mérito da demanda (honorários devidos pelo êxito), não há lide alguma.
Se na fase de cumprimento de sentença houver o ingresso de um novo patrono no processo, este fará jus aos honorários sucumbenciais que forem fixados em decorrência da "resistência" do devedor na cobrança que lhe é feita, além, obviamente, daquilo que contratualmente tiver ajustado com o cliente, o que não tem qualquer correlação com o acordo do antigo patrono com o seu ex-cliente.
Revogar o mandato, como já salientado, não implica necessariamente a formação de uma lide quanto aos honorários. Lide haverá se houver uma "justa causa" para o ato revocatório, devidamente demonstrada pelo cliente. A tão só revogação do mandato judicial acarretará apenas...a substituição do patrono. Nada mais!
Conforme dispõe o Estatuto da Advocacia, "se o advogado fizer juntar aos autos o seu contrato de honorários antes de expedir-se o mandado de levantamento ou precatório, o juiz deve determinar que lhe sejam pagos diretamente, por dedução da quantia a ser recebida pelo constituinte, salvo se este provar que já os pagou"5.
O destaque de honorários não é uma "deferência" judicial, mas direito do advogado, estabelecido em lei. E para o seu exercício, o Estatuto da OAB estabelece em seu art. 22, § 4º, apenas uma condicionante: a juntada do contrato de honorários antes da expedição do mandado de levantamento ou precatório.
E a única exceção ao exercício deste direito é informada no mesmo dispositivo legal: se o cliente provar que já pagou os honorários contratuais. É, por assim dizer, a "justa causa legal" para a oposição ao destaque dos honorários contratuais.
Decerto, se for evidenciada uma "lide" a respeito dos honorários para além do pagamento já realizado, esta deverá ser objeto de "ação autônoma", estabelecida em juízo próprio. Neste caso, será o ex-cliente que terá o "interesse jurídico" de apresentar em juízo o obstáculo a ser oposto ao pagamento dos honorários, o que não deve obstar o destaque, mas tão somente condicioná-lo ao deslinde da "ação autônoma" proposta.
A lei estabelece as condições do "exercício do direito" daquilo que considera presumidamente ser um "direito adquirido". Não se ocupa de dizer se existe direito do causídico ou não, porque para isto considera bastante a juntada aos autos de seu contrato de honorários antes da expedição do mandado de pagamento ou precatório.
Outro aspecto processual a ser considerado é o de que a lei, ao estabelecer as condições para o destaque dos honorários advocatícios, implicitamente reconhece o "interesse jurídico" de seu titular - o advogado - e, por consequência, o seu direito de "postulá-lo em juízo".
Neste contexto interpretativo, eventual revogação de mandato que não venha acompanhada da única razão obstativa ao pagamento dos honorários contratuais estabelecida em lei - o seu anterior pagamento - não terá o condão de impedir que o seu titular postule em juízo aquilo que é, por presunção legal, o seu "direito adquirido".
E o fará, com todas as vênias, nos mesmos autos em que forem quantificados - esta é a razão teleológica do cumprimento de sentença! - os direitos do ex-cliente que profissionalmente representou em juízo.
_______
1 AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.399.080/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 28/10/2024, DJe de 30/10/2024.
2 AI n. 0012487-44.2024.8.16.0000, relator Desembargador Ruy Alves Henriques, 17ª Câmara Cível, TJPR, julgado em 10/5/2024.
3 Idem.
4 Decisões monocráticas proferidas no âmbito do Superior Tribunal de Justiça: AREsp n. 2.841.041, Ministro Antonio Carlos Ferreira, DJEN de 1/4/2025; e PET no AREsp n. 2.768.793, Ministro Gurgel de Faria, DJEN de 25/7/2025.
5 Artigo 22, § 4º, da Lei nº 8.906 de 4 de julho de 1994.


