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Reforma tributária: Setor pet é saúde? Vai ficar mais caro?

A reforma tributária quer excluir o setor pet das benesses da saúde humana. Entenda por que seu pet care ficará mais caro e como o setor luta para sobreviver.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

Atualizado às 13:34

A reforma tributária, prometida como um instrumento de simplificação e justiça, tem nos apresentado, a cada nova camada de regulamentação, algumas das suas faces mais bizarras. Uma delas é a que atinge em cheio um dos setores que mais cresceu e se profissionalizou no Brasil: o mercado pet, especialmente quando o assunto são as clínicas e hospitais veterinários.

Durante a pandemia, o setor de saúde animal participou ativamente do esforço nacional, fornecendo materiais, equipamentos e, em muitos casos, expertise que se mostrou essencial. A evolução da medicina veterinária é inegável, com hospitais equipados, exames complexos, cirurgias de alta complexidade e tratamentos que salvam vidas, garantindo a saúde e o bem-estar de milhões de animais de estimação, considerados membros da família.

Contudo, ao que tudo indica, para a reforma tributária, a saúde animal não é saúde.

Enquanto a Constituição Federal, em sua emenda 132/23, abre a porta para um tratamento diferenciado e alíquotas reduzidas para serviços de saúde humana (incluindo hospitais, clínicas e profissionais de saúde), o setor veterinário está sendo excluído dessa benesse. Isso não é apenas um lapso; é uma condenação ao aumento brutal da carga tributária, com consequências que vão muito além dos balanços e chegarão diretamente ao colo dos tutores de animais.

A disparidade que ninguém entende: Veterinários como "não-saúde"

O cerne do problema da reforma tributária para o setor veterinário reside na interpretação. Hospitais e clínicas humanas deverão ter alíquotas reduzidas em 60% do IVA Dual (IBS e CBS), e outros serviços de saúde também podem se beneficiar de alguma forma. Para o setor pet, o cenário mais provável é a aplicação da alíquota cheia do IVA, estimada em torno de 25-27%.

Pense nas implicações, consultas, exames, cirurgias, internações - o ato médico veterinário - se equipara, em complexidade e importância, a muitos procedimentos humanos. Mas, sob a nova lógica fiscal da reforma tributária, ele será tratado como um serviço "comum", sem a redução de carga tributária destinada ao setor de saúde.

O resultado é uma distorção perversa: a reforma tributária penaliza a formalidade e a alta qualidade da medicina veterinária, tornando mais caro o cuidado com os animais.

Impacto direto: Aumento de preços e a onda de informalidade

Um aumento de carga tributária dessa magnitude no setor veterinário não é um problema apenas para o empresário. Ele tem uma cadeia de consequências inevitável e socialmente danosa:

  • Aumento nos custos dos serviços: Clínicas e hospitais veterinários serão forçados a repassar esse aumento para os tutores de animais. Consultas, exames, cirurgias e internações ficarão significativamente mais caros.
  • Redução do acesso à saúde animal: Com custos mais elevados, famílias de menor renda ou aquelas que já vivem no limite do orçamento terão que abrir mão de tratamentos essenciais. Animais poderão ficar sem atendimento adequado, impactando a saúde pública (em casos de zoonoses, por exemplo) e o bem-estar animal.
  • Impulso à informalidade: A pressão por preços baixos e a impossibilidade de absorver o aumento de impostos empurrarão o mercado para a informalidade. O número de "consultas" e "procedimentos" feitos sem nota fiscal, em locais inadequados ou por profissionais sem a devida estrutura, tende a crescer, gerando riscos sanitários e éticos.

Alternativas inteligentes em um campo minado fiscal

Diante de um cenário tão desafiador imposto pela reforma tributária, talvez não fazer nada seja o pior dos venenos. O setor pet precisa de uma estratégia robusta e criativa:

  1. Lobby unificado e intensivo: Mais do que nunca, associações de classe (como o Conselho Federal de Medicina Veterinária e outras entidades representativas) precisam se unir para fazer um lobby técnico e político massivo em Brasília. É preciso demonstrar, com dados econômicos e sociais, o erro estratégico de não equiparar a saúde animal à saúde humana e o impacto negativo na economia e na sociedade. A luta para influenciar as leis complementares é agora.
  2. Reengenharia de negócios e estruturação legal: Clínicas e hospitais precisam auditar suas estruturas. Há possibilidades de separar legalmente atividades de venda de produtos (pet shop) de serviços veterinários? Avaliar modelos de associação ou cooperativas de clínicas para ganhar escala na compra de insumos e no lobby.
  3. Digitalização e eficiência operacional: Aumentar a eficiência interna através de tecnologia e otimização de processos será crucial para absorver parte do aumento de custos. Softwares de gestão, telemedicina (onde aplicável) e otimização de agenda podem ajudar.
  4. Criptoativos e informalidade seletiva (CUIDADO!): Em ambientes de alto custo, especialmente em procedimentos veterinários de altíssimo valor (cirurgias complexas, tratamentos oncológicos para pets com tutores de alta renda), a busca por formas de pagamento que minimizem a carga tributária pode crescer. Alguns tutores de pets podem estar dispostos a pagar "por fora" ou, em um cenário mais avançado, via criptomoedas, por serviços que se tornaram excessivamente caros no mercado formal. É uma rota de altíssimo risco e ilegal, mas a pressão tributária a impulsiona.

Advertência: Reafirmamos que qualquer estratégia que fuja da legalidade estrita é um risco enorme. A reforma tributária e o Fisco estão cada vez mais sofisticados no cruzamento de dados. A reputação, tanto da clínica quanto do profissional, e as consequências legais de uma autuação, são um preço alto demais a pagar.

Em suma...

A reforma tributária impõe ao setor de saúde animal uma realidade complicada. A omissão em equipará-lo à saúde humana é um erro que pode desorganizar um mercado pujante, reduzir o acesso à saúde dos animais e incentivar a informalidade.

Para os empreendedores e profissionais da medicina veterinária, o momento é de total mobilização:

  1. Engajamento ativo: Não espere a lei complementar. Sua voz, através das entidades de classe, precisa ser ouvida.
  2. Preparação para o pior cenário: Modele o impacto da alíquota cheia de IVA Dual em seus custos e preços. Como sua clínica sobreviverá?
  3. Busca por otimização legal: Explore todas as vias legais para otimizar a gestão tributária de sua operação, buscando assessoria especializada para redesenhar seu modelo de negócio para este novo ambiente.

A reforma tributária está testando a resiliência de setores inteiros. Que o setor pet não seja mais uma vítima silenciosa da complexidade fiscal brasileira.

Lucas Pereira Santos Parreira

VIP Lucas Pereira Santos Parreira

Sócio no Escritório Rosenthal e Sarfatis Metta Advogados Associados. Mestre em Direito Empresarial e Especialista em Direito Tributário, Direito Civil e Direito Contratual.

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