Recuperações judiciais em alta em 2025: Quando o mercado nos lembra que agir cedo é um ato de sabedoria
O avanço dos pedidos evidencia empresas vulneráveis e reforça que rapidez na cobrança e análise patrimonial é decisiva para evitar prejuízos crescentes aos credores.
quarta-feira, 3 de dezembro de 2025
Atualizado em 2 de dezembro de 2025 15:41
O Brasil encerra, em 2025, um daqueles momentos em que os números contam uma história maior que eles mesmos. O ano anterior já havia encerrado com 2.273 pedidos de recuperação judicial, segundo a FecomercioSP com base nos dados da Serasa Experian. Foi o maior registro desde 2006. Parecia muito. Mas então veio 2025.
Nos primeiros meses do ano, mais de 4.900 empresas já haviam buscado a recuperação judicial, revelando um cenário que não pode mais ser ignorado. As análises do setor indicam que a marca de 3 mil pedidos deve ser ultrapassada com folga até o fim do ano, reforçando que estamos diante de um ponto de inflexão no ambiente de negócios brasileiro.
A maior parte dessas recuperações, cerca de 80% vêm de micro e pequenas empresas. Isso significa que boa parte da base que sustenta o nosso dia a dia empresarial está fragilizada. São negócios que sentem quando os juros sobem, quando o consumo cai, quando os custos aumentam. Eles não têm reservas para longas tempestades. E quando um deles desaba, quase sempre alguém desaba junto: fornecedores, prestadores de serviço, credores que confiaram no fluxo e na palavra.
Os setores contam a mesma história com cores diferentes. Serviços e comércio continuam liderando os pedidos, seguindo a lógica da queda do consumo. A construção civil enfrenta um ciclo de custos elevados e crédito mais caro. E o agronegócio, que sempre foi visto como porto seguro, vive um aumento expressivo de recuperações entre 2024 e 2025, impulsionado por fatores climáticos, endividamento crescente e forte volatilidade nos preços das commodities. O que vemos é um país que tenta respirar em meio a pressões constantes por todos os lados.
Para o credor, tudo isso não é apenas estatística. É alerta. Quando um devedor ingressa com recuperação judicial, o credor perde a liberdade de conduzir sua própria cobrança. A execução é suspensa, o crédito passa a integrar um plano coletivo, e o futuro do recebimento deixa de ser uma escolha e passa a ser uma espera longa, incerta e muitas vezes frustrante. Prazos extensos, descontos e atualização reduzida são cenários cada vez mais comuns.
Nesse contexto, agir cedo deixou de ser uma vantagem para se tornar uma necessidade. A cobrança judicial ajuizada no tempo certo não é sobre apertar alguém. É sobre preservar a saúde do próprio negócio. É sobre impedir que um atraso de hoje vire um prejuízo irreversível amanhã. Quando o credor se antecipa, ele alcança um patrimônio que ainda existe, uma janela que ainda está aberta. Quando ele espera demais, encontra portas fechadas por um processo coletivo que, embora necessário para reorganizar empresas, raramente prioriza a recuperação integral de quem está na outra ponta.
É por isso que a investigação patrimonial se tornou tão importante. Ela não é uma busca por culpados, mas por realidade. Analisa-se vínculos societários, sinais de fragilidade financeira, existência de grupos econômicos, bens que não aparecem à primeira vista. A execução moderna não é uma corrida às cegas, mas um mapa. E quem tem o mapa chega antes.
Enquanto isso, o Congresso discute o PL 3 de 2024, que pretende atualizar a lei 11.101 de 2005 (lei de recuperação e falências). A proposta envolve ampliar o protagonismo dos credores, tornar o processo mais transparente e acelerar etapas essenciais da recuperação judicial. É um avanço, mas não muda a essência do problema. Nenhuma lei substitui o valor do tempo. Nenhum texto legal devolve ao credor o que ele deixou de buscar enquanto ainda era possível encontrar.
Para quem concede crédito, três atitudes práticas fazem diferença. A primeira é observar o comportamento financeiro dos clientes com mais atenção. Pequenos sinais costumam aparecer antes das tempestades. A segunda é realizar análises patrimoniais completas, mesmo quando o atraso ainda parece pequeno. A terceira é não esperar demais para ingressar com a cobrança. Em momentos de instabilidade, esperar é um risco que poucos podem correr.
Os números de 2025 são apenas a ponta visível desse cenário. A verdade profunda é que a cobrança judicial não é apenas uma reação ao inadimplemento. Ela se tornou parte da gestão financeira responsável. Significa proteger liquidez, reduzir perdas e manter a empresa viva em um ambiente onde o risco se espalha rápido.
Agir cedo, no fim das contas, não é apenas estratégia. É prudência. É leitura correta do tempo. E no mundo dos negócios, assim como na vida, quem entende o tempo entenderá sempre a direção.
Anderson Leite
Advogado na área de Contencioso Cível Consumidor e Cobrança em Martorelli Advogados.


