Impeachment de ministros do STF: O que Gilmar Mendes decidiu
A liminar mostra que, na separação de Poderes, nenhum instrumento é absoluto (nem impeachment, nem decisão monocrática). Cabe ao plenário do STF equilibrar e proteger a CF/88.
quinta-feira, 11 de dezembro de 2025
Atualizado às 14:32
A decisão liminar do ministro Gilmar Mendes na ADPF 1.259 provocou reações intensas. Manchetes sugeriram "blindagem", parlamentares denunciaram um "autoprotecionismo" do Supremo e a opinião pública rapidamente aderiu à narrativa de que a Corte estaria alterando as regras do jogo movida por interesses próprios.
Mas antes de abraçar versões simplificadas, é sempre útil lembrar um princípio elementar do processo: juízes não decidem por hobby. A jurisdição, como diz a melhor doutrina, é inerte, isto é, só age quando provocada.
E antes que o decano do STF decidisse, foi provocado duas vezes sobre o tema: por um partido político e por uma entidade nacional de magistrados.
Dessa forma, não são justas as tentativas de rotulá-lo como vilão, como se tivesse acordado "com vontade de mudar a lei do impeachment".
Feita essa breve observação didática, um tanto quanto ácida em decorrência do café horrível que acabei de fazer neste domingo de manhã, passemos ao ponto central: o que está sendo discutido?
Nos últimos anos, aumentou significativamente o número de pedidos de impeachment contra ministros do STF, muitos deles baseados mais em insatisfações com decisões judiciais do que em condutas que configurariam crimes de responsabilidade.
E antes que qualquer militante me bombardeie: é apenas a minha opinião, e você não é obrigado a concordar. É só não seguir em frente com a leitura.
Essa transformação do instrumento constitucional em mecanismo de pressão política levantou uma preocupação institucional legítima: quais são os limites?
Foi diante desse cenário que a ADPF 1.259 foi proposta, questionando dispositivos da lei 1.079/1950 que, no contexto atual, podem gerar distorções no equilíbrio entre os Poderes.
Gilmar Mendes adotou três balizas principais, todas provisórias e sujeitas ao crivo do plenário:
1) Reforço do filtro de admissibilidade.
A recepção de denúncia contra ministros passa a demandar quórum qualificado de 2/3 do Senado (a ideia é evitar que processos se iniciem com base em maiorias circunstanciais);
2) Vedação ao afastamento automático.
O simples recebimento da denúncia não suspende o ministro de suas funções, nem permite redução de vencimentos (evita impactos irreversíveis antes de julgamento definitivo);
3) Delimitação do que pode constituir crime de responsabilidade.
Divergência interpretativa ou descontentamento com votos não são fundamento legítimo para impeachment (até porque decidir, e desagradar, é parte da função jurisdicional).
Esses parâmetros não eliminam o controle político previsto na CF/88, mas buscam reduzir o risco de captura ou intimidação do órgão que deve funcionar com independência.
Além das provocações processuais já mencionadas, o ministro destacou um risco de dano institucional, em razão de denúncias sucessivas sem elementos concretos, ameaça constante ao exercício jurisdicional e exposição do STF a pressões externas incompatíveis com sua função.
E até por essa razão destacou que é atribuição exclusiva do procurador-geral da República a apresentação da denúncia, funcionando essa exclusividade como um mecanismo indispensável para garantir a seriedade, o rigor técnico, a responsabilidade e a excepcionalidade que devem nortear esse processo.
Segundo o ministro relator, permitir que qualquer cidadão possa apresentar denúncia pela prática de crime de responsabilidade cria ambiente propício à proliferação de denúncias motivadas por interesses político-partidários, desprovidas do rigor técnico necessário para uma acusação legítima.
A decisão liminar visa, portanto, estabilizar o ambiente institucional até que o plenário analise o mérito.
Ainda é cedo para conclusões definitivas, até mesmo porque o plenário poderá confirmar, ajustar ou revogar a decisão proferida por Gilmar Mendes.
E quando STF o fizer, o debate mais relevante não será sobre quem "ganha ou perde", mas sobre qual modelo de responsabilização política melhor protege o equilíbrio constitucional.
Se há uma mensagem que essa liminar deixa, ela talvez seja esta: em um regime de separação de Poderes, nenhum instrumento é absoluto. Nem o impeachment. Nem a decisão monocrática. E cabe ao plenário do STF, que é o guardião da CF/88, encontrar o ponto de equilíbrio.
E, claro, sempre lembrando: a jurisdição é inerte. Atua somente quando provocada.
Quando provocada, viu?


