Stalking digital e tutela jurídica na violência contemporânea
A análise expõe como o stalking digital inaugura uma nova e alarmante dimensão da violência, marcada por vigilância constante, rastreamento invisível e poder ampliado pelas tecnologias atuais.
quarta-feira, 17 de dezembro de 2025
Atualizado às 13:42
A violência silenciosa que se desloca para o digital
O fenômeno do stalking ganhou contornos inéditos na sociedade contemporânea. Se antes a perseguição se manifestava por meio da presença física constante, telefonemas insistentes ou vigilância direta, hoje ela se expressa de maneira fragmentada, distribuída entre aplicativos, redes sociais, geolocalização e comportamentos digitais repetitivos que produzem sensação permanente de vigilância. O perseguidor se oculta em perfis falsos, interações mínimas, capturas de tela, monitoramento de check-ins e coleta recorrente de informações aparentemente inocentes, criando um círculo de pressão psicológica que se retroalimenta.
A lei de perseguição e seus limites diante da tecnologia
A lei 14.132/21 representou um marco importante ao tipificar o crime de perseguição1. Todavia, a velocidade com que o stalking digital se reinventa demanda reflexão constante. O agressor não necessita mais abordar fisicamente a vítima; basta acompanhar sua vida digital, criando sensação de controle contínuo. O Direito Penal, por sua própria estrutura, demora a acompanhar esse ritmo, fazendo com que vítimas convivam por longos períodos com o medo, mesmo diante da formalização da denúncia.
As dificuldades probatórias em ambiente volátil
O ambiente digital traz um obstáculo central: a prova. A volatilidade das interações online - exclusões, alterações rápidas, bloqueios e múltiplas contas descartáveis - compromete o registro dos fatos. Produzir prova técnica exige ferramentas que preservem metadados, URLs, horários de acesso e capturas certificadas. A ausência de documentação adequada fragiliza o enfrentamento jurídico, e a vítima frequentemente demora a reconhecer que está sendo vigiada, permitindo que o perseguidor amplie sua atuação.
O papel do Judiciário e a ampliação da tutela preventiva
A jurisprudência tem reconhecido a gravidade da perseguição no ambiente digital2, reforçando que medidas protetivas devem ser interpretadas com amplitude, especialmente quando há risco à integridade emocional e psicológica da vítima. A perseguição contínua, ainda que silenciosa, cria estado de medo que constitui dano autônomo e exige respostas rápidas, inclusive bloqueio emergencial de contas, preservação de dados e intervenção policial especializada.
Conclusão
O stalking digital deslocou o eixo da violência da presença para a permanência. A perseguição tornou-se contínua, híbrida, silenciosa e potencializada pela tecnologia. Combater esse fenômeno exige articulação entre Direito Penal, prova digital, proteção preventiva e educação digital. A vítima não enfrenta apenas o agressor, mas um sistema que - se não for rápido - permite que a violência se torne rotina. A tutela jurídica precisa acompanhar a velocidade da ameaça para impedir que a perseguição se normalize como parte da vida online.
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1 Lei 14.132/2021.
2 STJ, REsp 2.012.345/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi.


