A ficção da imparcialidade judicial e como dados preveem decisões
Os juízes têm vieses intrínsecos ao ser humano, mas com dados e tecnologia é possível prever padrões de decisão e melhorar estratégias jurídicas com base em evidências.
terça-feira, 30 de dezembro de 2025
Atualizado às 09:09
Na advocacia, é quase um mantra ouvir "chances de sucesso". A expressão parece neutra, mas todos sabemos que, no fim do dia, ela tenta traduzir que tudo depende da decisão de um juiz. E aqui começa o problema.
O estudo "Behavioral Biases and Judicial Decision-Making in Brazil", de Benjamin Miranda Tabak, Liziane Angelotti Meira, Ana Clarissa Masuko dos Santos Araujo e Aline Guiotti Garcia, escancara algo que é óbvio, mas muitas vezes não é dito em voz alta: juízes são seres humanos e, portanto, carregam vieses heurísticos de representatividade, afeto, coerência e confirmação. Não há toga que neutralize completamente o que é intrínseco ao humano.
É fato que as normas brasileiras tentam reduzir essa influência pessoal, e o faz de forma bastante clara. A Constituição, por exemplo, exige decisões fundamentadas (art. 93, IX). O sistema de precedentes impede que a experiência individual do magistrado prevaleça sobre a tese jurídica fixada. Corregedorias, inspeções, normas internas, tudo isso existe para puxar a Justiça para o campo do objetivo. Mas regras, por si só, não eliminam vieses. No máximo, colocam trilhos.
Os mesmos autores do estudo citado anteriormente apontam possíveis caminhos para mitigar a parcialidade: técnicas de debiasing para magistrados, a substituição de juízes por algoritmos e revisão ampliada das decisões. Me detenho no primeiro.
Segundo o relatório Justiça em Números 2024 do CNJ, juízes de 1º grau lidam com mais de 7 mil processos por magistrado; no 2º grau, mais de 3 mil. A sobrecarga é evidente, mas há outro ponto por trás desse número que é importante perceber: eles geram dados. Dados que geram inteligência, que mostram como juízes decidem, quais padrões se repetem, em que circunstâncias há mais rigor ou mais flexibilidade. Dados que, se tratados com seriedade, permitem formular estratégias mais eficientes e até corrigir desigualdades históricas.
Hoje, a maior parte da instrução e visitas a magistrados, feita por times jurídicos e escritórios de advocacia, é executada à moda antiga: fazendo uso de planilhas, coleta manual, análise fragmentada. Não há estratégia de longo prazo que sobreviva a esse nível de dispersão informacional.
É justamente aqui que entram legaltechs como a DeltaAI que criam painéis de análise de magistrados e permite enxergar, de forma rápida e objetiva, o que antes dependia de um trabalho manual do jurídico. Com robôs de scraping, LLMs e modelos estatísticos, é possível capturar decisões, interpretar nuances semânticas, integrar tudo em big data e identificar padrões de julgamento com precisão.
Isso significa que empresas e escritórios podem melhorar a roteirização de defesas com base em evidências, ajustar estratégias internas, cortar deslocamentos inúteis, trocar escritórios parceiros quando necessário e, principalmente, aumentar suas taxas de sucesso de forma consciente.
Porque, sim, a imparcialidade absoluta é uma ficção. Mas a possibilidade de entender como um magistrado decide e agir a partir disso já é uma realidade. E ignorar essa realidade, em 2025, não é uma escolha sábia.


