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A "Compensação" da CPMF: as inconstitucionalidades na elevação da alíquota da CSL

Eduardo Carvalho Caiuby e Marcelo de Azevedo Granato

Como noticiado e reconhecido por integrantes do Governo Federal, a majoração da alíquota da CSL, no início deste ano, consistiu num meio de recomposição orçamentária frente à perda de arrecadação decorrente da não prorrogação da CPMF. Abaixo, serão reportados os aspectos mais relevantes desse aumento da CSL, seguidos de nossos comentários.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Atualizado em 19 de fevereiro de 2008 13:48


A "Compensação" da CPMF: as inconstitucionalidades na elevação da alíquota da CSL

Eduardo Carvalho Caiuby*

Marcelo de Azevedo Granato*

Como noticiado e reconhecido por integrantes do Governo Federal, a majoração da alíquota da CSL, no início deste ano, consistiu num meio de recomposição orçamentária frente à perda de arrecadação decorrente da não prorrogação da CPMF. Abaixo, serão reportados os aspectos mais relevantes desse aumento da CSL, seguidos de nossos comentários.

Conforme o artigo 17 MP 4131 (clique aqui), publicada em 3/1/08, a alíquota da CSL aplicável às "pessoas jurídicas de seguros privados, as de capitalização e as referidas nos incisos I a XII do § 1º do art. 1º da Lei Complementar n.º 105, de 10 de janeiro de 2001"2 passa a ser 15% (não mais 9%, como para as demais pessoas jurídicas). Os efeitos dessa medida, de acordo com o artigo 18, II, da mesma MP, foram remetidos ao "primeiro dia do quarto mês subseqüente ao de publicação desta Medida Provisória". Assim, quanto às pessoas jurídicas acima, os fatos geradores da CSL ocorridos a partir de 1º de maio serão gravados à alíquota de 15%3.

A iniciativa do Poder Executivo esbarra num óbice constitucional. Nos termos do artigo 246 da Constituição Federal (clique aqui), "é vedada a adoção de medida provisória na regulamentação de artigo da Constituição cuja redação tenha sido alterada por meio de emenda promulgada entre 1º de janeiro de 1995 até a promulgação desta emenda, inclusive"4. No caso, o artigo 195 da Constituição, que embasa a cobrança da CSL e contém, em seu § 9º, a previsão de alíquotas diferenciadas da contribuição5, teve sua redação alterada pela EC 20 (clique aqui), de 15/12/98. Logo, a teor do artigo 246, a diferenciação de alíquotas (15%/9%) sob exame - pautada no artigo 195 - não poderia ter sido concretizada por uma MP.

Como observou o então Ministro do STF Octavio Gallotti nos autos da ADIn 1518-4 (clique aqui), o artigo 246 da Constituição comporta "o sentido e a finalidade lógica de excluir, do campo de atuação das medidas provisórias, a regulamentação destinada a dar eficácia às inovações constitucionais porventura introduzidas [...]".

Ora, o artigo 17 da MP 413 visou justamente "dar eficácia" aos termos do § 9º do artigo 195 da Constituição, introduzido pela EC 20/98, que ainda alterou a redação do mesmo artigo em diversos outros pontos. Desse modo, afirma-se a possibilidade de argüir a inconstitucionalidade do aumento da alíquota da CSL, trazido pela MP 413.

Além disso, é importante registrar que a alegação de violação ao princípio da isonomia, no aumento das alíquotas da CSL para as instituições financeiras (já implementado outras vezes ao longo dos anos), até hoje não foi debatida - e definida - no STF, por meio de seu Tribunal Pleno. Apesar de haver precedentes contrários, julgamos que o tema pode ser retomado, afinal, a fixação de alíquotas (ou bases de cálculo) diferenciadas para as contribuições do inciso I do artigo 195 da Constituição, trazida pelo § 9º desse artigo, somente pode ocorrer "[...] em razão da atividade econômica, da utilização intensiva de mão-de-obra, do porte da empresa ou da condição estrutural do mercado de trabalho".

Dizer que é possível a diferenciação de alíquotas "em razão da atividade econômica" não é o mesmo que fundamentar uma tal diferenciação. Para tanto, é necessário que, no contexto de dada atividade econômica, seja demonstrada a disparidade fática motivadora do tratamento diferenciado. Nesse plano, releva notar que, em entrevista publicada no jornal Folha de São Paulo em 3/1/086, o Presidente da FEBRABAN, Fábio Barbosa, afirma que pesquisas apontam que o segmento bancário "ocupa a 9ª posição no quesito rentabilidade sobre o patrimônio líquido e que está abaixo dos segmentos de Mineração, Mecânica, Petróleo e Gás, Metalurgia e Siderurgia, Serviços Especializados, Comércio Exterior, Farmacêutica e Comércio e Veículos e Peças".

Se a lucratividade foi o critério adotado pelo Governo para a elevação da alíquota da CSL aplicável às instituições financeiras (e a Exposição de Motivos da MP 413 não deixa dúvidas a respeito7), trata-se de um critério contestável, aparentemente estranho à eqüidade que deve informar a participação no custeio da seguridade social (artigo 194, V, da Constituição). Afinal, desconhecido qualquer estudo do Governo em torno do tema, e à luz dos dados acima, não se afigura isonômico que o aumento de alíquota se volte, unicamente, às pessoas jurídicas referidas no artigo 17 da MP 413. Nessa perspectiva do princípio da isonomia, encontra-se outro argumento contrário ao aumento sob exame.

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1Que alterou o artigo 3º da Lei n.º 7.689/88.

2Art. 1o As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.

§ 1o São consideradas instituições financeiras, para os efeitos desta Lei Complementar:

I - os bancos de qualquer espécie;

II - distribuidoras de valores mobiliários;

III - corretoras de câmbio e de valores mobiliários;

IV - sociedades de crédito, financiamento e investimentos;

V - sociedades de crédito imobiliário;

VI - administradoras de cartões de crédito;

VII - sociedades de arrendamento mercantil;

VIII - administradoras de mercado de balcão organizado;

IX - cooperativas de crédito;

X - associações de poupança e empréstimo;

XI - bolsas de valores e de mercadorias e futuros;

XII - entidades de liquidação e compensação; [...]

3O cômputo da anterioridade nonagesimal e seus efeitos na aferição da CSL devida no ano-base (ou apenas no ano-base seguinte) comportam discussão específica - tema, inclusive, da ADIN recentemente proposta pelo Partido Democratas. Essa discussão, porém, não será desenvolvida aqui.

4No julgamento da ADIN 1518-4, o Ministro Marco Aurélio qualificou o artigo 246 como um "preceito [...] salutar [...] em boa hora tivemos um freio, um freio tênue é certo, considerada a extensão, essa fúria de se normatizar, no Brasil, via medida provisória".

5"Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: [...]

§ 9º As contribuições sociais previstas no inciso I do caput deste artigo poderão ter alíquotas ou bases de cálculo diferenciadas, em razão da atividade econômica, da utilização intensiva de mão-deobra, do porte da empresa ou da condição estrutural do mercado de trabalho"

6Caderno "Dinheiro".

7"10. A medida proposta no art. 18 [artigo 17 da MP, como editada] visa estabelecer incidência tributária compatível com a capacidade contributiva dos setores econômicos abrangidos. Esses setores vêm apresentando forte dinamismo, expansão e lucratividade, proporcionados pelo crescimento econômico do País, fruto das medidas macroeconômicas adotadas".

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*Sócio e Associado da Área Tributária de Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

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