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Associação de moradores e os índios de Camboinhas

Os mais antigos diziam que, "quando o gato não está, os ratos tomam conta", com isto querendo significar que a falta de um chefe, tudo vira uma geléia geral. No caso específico, a ausência do Estado organizado no cumprimento de um dever social, gera o caldo de cultura propício ao surgimento de estranhas forças, cujo único objetivo é tirar partido da situação, dispondo-se a substituir o Estado na ânsia de obter lucro fácil. Tudo, é claro, feito à sorrelfa, eis que providência não autorizada por Lei.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Atualizado em 3 de junho de 2008 10:36


Associação de moradores e os índios de Camboinhas

Sérgio Couto*

Os mais antigos diziam que, "quando o gato não está, os ratos tomam conta", com isto querendo significar que a falta de um chefe, tudo vira uma geléia geral. No caso específico, a ausência do Estado organizado no cumprimento de um dever social, gera o caldo de cultura propício ao surgimento de estranhas forças, cujo único objetivo é tirar partido da situação, dispondo-se a substituir o Estado na ânsia de obter lucro fácil. Tudo, é claro, feito à sorrelfa, eis que providência não autorizada por Lei.

Em meio ao clima de insegurança que o povo vive, surgiram as milícias de proteção social, impondo taxas obrigatórias e trazendo como instrumento de coerção a própria brutalidade. Se os moradores não pagam, correm riscos, porque os próprios "serviços de segurança", podem voltar-se contra os inconformados.

E tudo segue assim, num clima de impunidade e de olímpica indiferença por parte dos que são ungidos como autoridades. Por tal razão, arvoram-se em associações de moradores em bairros tão vastos que abrigam populações consideráveis e cujos infelizes moradores arcam com IPTU, iluminação pública, água, luz, taxas diversas. Nesses bairros, há hotéis, pousadas, shoppings, farmácia, padaria e outros prestadores de serviços. Como não há - nem pode haver - controle de portaria, todos vão e vêm, usando do mais pleno direito constitucional, num ir e vir contínuo. Turistas, estrangeiros, moradores de outras cidades têm, como é óbvio, livre acesso. Exemplo claro disso é o bairro oceânico de Camboinhas, em Niterói.

E o que acontece? Um punhado de espertos, com liderança ilegítima, leva a registro uma convenção que mesmo sem lei e até contra ela, gera validade contra terceiros que constituem a maioria e que jamais foram ouvidos a respeito. E a minoria esperta cria os supostos serviços e, evidentemente, uma taxa que todos devem pagar. Todos? Nem tanto. Apenas os infelizes moradores.

Pobre Constituição Brasileira não permite a soez manobra e diz que ninguém pode ser obrigado a associar-se contra a vontade. Mas a Carta, que também diz que só se deve fazer algo ou deixar de fazê-lo em virtude de Lei, afinal está aí é para ser violada mesmo!

Também não interessou aos legisladores da novel associação de Camboinhas, decisões várias do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o proprietário não está obrigado a concorrer para o custeio de serviços prestados por associação de moradores, se não os solicitou (Resp nº. 444.931-SP, Rel, Min. Ari Pargendler, in DJ 6, 1º 2003).

Mas o que vem a ser STJ, se um grupo de denodados legisladores de Camboinhas decidiu ao contrário? E valentemente prosseguem em sua cruzada tributatuva, também esquecidos de que qualquer taxa, mesmo a tributária, só é impositiva em função de lei.

A sensata conclusão aponta para a ilegalidade da cobrança, eis que tais "taxas de manutenção", não podem ser impostas a proprietário de imóvel que não é associado, nem aderiu ao ato que criou o encargo. Tal é, novamente, o entendimento do STJ, em decisão da Segunda Seção, Rel. Ministro Gomes de Barros, ao julgar embargos de divergência (DJ 1.2.2006).

Sucede que, como diria o poeta, "no meio do caminho tinha uma pedra, tinha uma pedra no meio do caminho"...

No caso, não uma pedra, mas uma centena de índios. Na crista dessa hilária onda brasileira de resgatar o passado, sempre sob o incentivo e estímulo do líder de São Bernardo, um grupamento indígena adonou-se de uma parte da praia de Camboinhas, onde supostamente existiriam vestígios arqueológicos onde viveram seus antepassados. E, em meio à bucólica praia, afloraram suntuosas ocas, aparentemente com ânimo definitivo.

Há, dizem, duas vertentes de pensamento em embate no seio da Associação. Uma, pugna pela imediata extração de boletos bancários para que o cacique e seus súditos passem a pagar a taxa de manutenção ; a segunda, pensa seriamente em expulsar os herdeiros dos ocupantes pré-coloniais, mandando-os procurar abrigo noutra freguesia, quem sabe na famosa e fantástica Portelinha.

E nós outros, que apenas queremos habitar em paz no lugar que compramos, pagamos e escolhemos, quase nos sentimos tentados a sonhar com a proteção do Juvenal Antena, o adorável chefão que, como outros, locupletou-se às custas dos moradores da utópica favela.

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*Advogado





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