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Algumas implicações da lei de propriedade intelectual brasileira

Falar em propriedade intelectual é falar sobre marcas, patentes, direitos autorais e proteção de programas de computador. A legislação brasileira é bastante recente e as discussões igualmente.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Atualizado às 09:47


Algumas implicações da lei de propriedade intelectual brasileira

Alajuiara dos Reis Brum*

Falar em propriedade intelectual é falar sobre marcas, patentes, direitos autorais e proteção de programas de computador. A legislação brasileira é bastante recente e as discussões igualmente. É um novo direito que praticamente começou a ser pensado na legislação e pelos especialistas da área com a expansão das novas áreas de tecnologia, porém o direito à proteção dessas criações intelectuais é garantia constitucional desde 1988 com previsão no artigo 5º, incisos XXVII, XXVIII e XXIX da Constituição Federal (clique aqui).

Em abordagem prática ao leitor, busca-se esclarecer sem esgotar o assunto - até porque vai muito além do que aqui se expõe - de que a propriedade intelectual em suas diversas áreas de abrangência como bem jurídico protegido que é, levanta implicações de ordem jurídica relevantes em razão das inovações crescentes pelo uso da tecnologia.

Algumas situações são colocadas a título de ilustração como os programas de computador versus pirataria, direitos autorais versus cópias desautorizadas, patente da Monsanto sobre sua soja transgênica versus produtores de soja e a patente de alguns laboratórios sobre medicamentos para HIV versus a quebra da patente (compulsória) pelo governo. Essa licença compulsória determinada pelo governo se dá em razão do alto custo dos medicamentos aos usuários permitindo a produção local ou importação de genéricos; via reflexa as empresas que detêm patentes desse tipo acabam reduzindo margem de lucro e o preço do medicamento para continuar com o privilégio de exploração da patente até sua expiração.

No Brasil o Instituto Nacional de Propriedade Industrial, autarquia federal, possui a incumbência de conceder patentes, registrar marcas, averbar contratos de transferência de tecnologia e registrar programas de computador, desenho industrial e indicações geográficas.

Assim pela lei 9.679/96 a patente é um processo temporário concedido pelo Estado a quem fizer o pedido de depósito no INPI, sendo objeto de patente a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial. Os prazos de vigência das patentes, sempre contados da data do depósito: 20 anos para a patente de invenção, 15 anos para o modelo de utilidade e 10 anos, prorrogável por mais três períodos de cinco anos para o desenho industrial.

A patente confere ao seu titular o direito de impedir que terceiros explorem o objeto patenteado, sendo possível indenização pela exploração indevida ou então a sua exploração com o pagamento dos chamados royalties. A patente também pode ser concedida internacionalmente, mas para sua validade em outro país necessita que seus registros também sejam depositados no país ou países onde houver o interesse comercial. Essa relação se dá via tratados internacionais em que o Brasil é signatário da Convenção de Paris, dos tratados sobre direito de patentes da Organização Mundial de Propriedade Intelectual (WIPO)1 e dos acordos entre países sobre os direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio (TRIPS). De forma bastante didática o site do INPI (clique aqui) explica as especificidades da lei que regulamenta o setor e os diversos tratados relacionados à área.

Ainda, conforme o artigo 18 da lei não são consideradas patenteáveis o que for contrário à moral, aos bons costumes e à segurança, à ordem e à saúde públicas; as substâncias, matérias, misturas, elementos ou produtos de qualquer espécie, bem como a modificação de suas propriedades físico-químicas e os respectivos processos de obtenção ou modificação, quando resultantes de transformação do núcleo atômico; e o todo ou parte dos seres vivos, exceto os microorganismos transgênicos que atendam aos três requisitos de patenteabilidade - novidade, atividade inventiva e aplicação industrial e que não sejam mera descoberta.

Os microorganismos transgênicos que para a lei são organismos, que expressem, mediante intervenção humana direta em sua composição genética, uma característica normalmente não alcançável pela espécie em condições naturais, são patenteáveis. Tanto é assim que ainda se debate sobre o pagamento de royalties à Monsanto em razão da exploração da soja transgênica desenvolvida com a tecnologia Roundup Ready, haja vista que o processo de uma de suas patentes já expirou no ano passado.

Sobre as plantas e animais recentemente o INPI fez conhecer que o Instituto pretende abrir espaço para o registro de inovações em novas áreas, como matérias vivas, que envolvam células geneticamente modificadas e produtos criados a partir da cana-de-açúcar e ligados ao biodiesel (Jornal do Comércio de 31.07.08, p.15)2. Em relação às novas variedades de plantas, que por enquanto não são patenteáveis, há a proteção através da Lei das Cultivares nº 9.456/97 (clique aqui), gerenciada pelo Serviço Nacional de Proteção de Cultivares (SNPC) do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento.

Já o registro de marca no INPI não é obrigatório, entretanto confere segurança e exploração exclusiva do titular do direito a partir do seu registro, salvo se ceder seu registro, pedido de registro ou uso da marca para um terceiro através de contrato. Para explicar a sua importância imagine que você possua um empreendimento e agregue a seu produto ou serviço uma marca. Se não registrar pode correr o risco de tempos depois seu concorrente imitar ou ainda ingressar com uma ação judicial por uso indevido da marca porque ele já tem registrado a mesma marca sua e você não. A marca registrada garante a propriedade e o uso exclusivo em todo o território nacional, por dez anos, sendo que seu titular deve mantê-la em uso e prorrogá-la de dez em dez anos. Aliás, hoje em dia uma marca pode significar o maior objeto de uma transação comercial.

Com relação ao direito autoral a Lei 9.610/98 (clique aqui) protege os direitos patrimoniais do autor em relação à obra (livros, poesias, filmes, músicas, etc.) que criou e também protege os direitos morais, pois esses direitos se vinculam à personalidade de seu autor (nome, honra, imagem, direito ao resguardo e ao segredo). O prazo de proteção dos direitos patrimoniais do autor perduram por setenta anos contados de 1° de janeiro do ano subseqüente ao de seu falecimento, obedecida a ordem sucessória da lei civil. Decorrido esse tempo, se não houver sucessores do falecido as obras pertencerão ao domínio público. Por exemplo, o "Mickey" é protegido por essa lei para que a imagem do personagem da Disney não caia em domínio público tão rapidamente. As músicas e direitos inerentes a ela também são protegidas pela lei, inclusive com a arrecadação pelo ECAD desses direitos autorais que são repassados aos artistas. Dentre um feixe de direitos a lei confere ao autor o direito de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à sua reputação e imagem, inclusive com a possibilidade de obter indenização civil por violação de direitos autorais e responsabilizar criminalmente o infrator.

Sobre os programas de computador seu registro também é feito no INPI. A Lei 9.609/98 (clique aqui) conhecida como Lei do Software regulamenta a área juntamente com a proteção e todos os seus reflexos dada pela Lei de Direitos Autorais. O registro é opcional, entretanto conveniente que o autor sempre proteja sua obra. A validade do registro é internacional e perdura por cinqüenta anos contados a partir do dia 1º de janeiro do ano subseqüente à sua publicação, ou na ausência dessa, da sua criação.Assim os programas registrados no INPI não precisam ser registrados em outros países, desde que esses países concedam direitos equivalentes.

Com toda essa revolução mundial na área de tecnologia cabe ressaltar, por oportuno, esse conjunto de várias redes de computadores que se comunicam por protocolos dando origem a internet, ferramenta essencial à comunicação e aproximação, mas no que diz respeito ao seu mau uso (cibercrimes), nos encontramos, por assim dizer, em uma lacuna jurídica. Os "crimes de internet" propiciados pela evolução tecnológica não encontram no Brasil uma legislação específica dificultando sobremodo a sua repressão efetiva. A tendência à filtragem de informações nocivas ou autocontrole exercido do ponto de vista extrajudicial, ainda é o meio mais utilizado para controle da área. Contudo, espera-se que o Projeto de Lei nº 89/2003, que desde o último dia 10.7.08 foi enviado novamente para a Câmara dos Deputados e aguarda apreciação, seja em breve votado e aprovado, mas por guardar pontos ainda muito polêmicos que tipificam e criminalizam uma extensa pauta de condutas talvez saia do papel somente no ano que vem.

Por hora, parece que na questão das condutas ilícitas praticadas sob o manto da internet devemos nos guiar pela orientação da jurisprudência dos tribunais brasileiros, entretanto não é porque não temos a "lei específica ou proteção jurisdicional específica" que não se aplicam sanções; existem as legislações já comentadas e o próprio Código Penal para enfrentar direta e indiretamente essas infrações até que a nova lei entre em vigência com toda a força que se espera.

Diante desses novos desafios calcados pela tecnologia e na expressão consagrada ubi societas, ibi jus, "onde existe sociedade, existe direito", nem legisladores, nem judiciário, nem empresas e nem a comunidade em geral ficam imunes à influência da tecnologia e desse mediador das relações em sociedade que é o Direito; sobretudo porque quando falamos em temas como os ora em debate, estamos falando em direitos patrimoniais e extrapatrimoniais, ou bens materiais e imateriais que integram o patrimônio individual de cada pessoa e que por já estarem consagrados na legislação interna e externa pelos diversos tratados e convenções internacionais merecem toda a atenção dado o avanço tecnológico.

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1 (clique aqui)

2 (clique aqui) acesso em 31.7.2008

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*Advogada





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