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A duvidosa constitucionalidade da Lei Estadual nº 5.373/09

Desde a promulgação do novo Código Civil instaurou-se no setor imobiliário uma justificada preocupação com o aumento da inadimplência de cotas condominiais causada, ao que tudo indica, pela redução da multa por atraso no pagamento fixada no patamar quase simbólico de 2%.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Atualizado às 09:00


A duvidosa constitucionalidade da Lei Estadual nº 5.373/09

Oswaldo Angarano*

Desde a promulgação do novo Código Civil (clique aqui) instaurou-se no setor imobiliário uma justificada preocupação com o aumento da inadimplência de cotas condominiais causada, ao que tudo indica, pela redução da multa por atraso no pagamento fixada no patamar quase simbólico de 2%.

Com efeito, na prática não são poucos os condôminos que, escudados no favor legal previsto no § 1º, do art. 1.336 do novel diploma legal, descumprem ou postergam a obrigação de pagar o valor do rateio das despesas condominiais, onerando os demais comunheiros e, muitas vezes, impossibilitando a manutenção do bem comum.

É consenso geral que a estabilização da moeda tornou exagerada a multa de 20% até então prevista nas convenções condominiais; porém, a redução desta para a alíquota de 2% tirou da coima o poder de dissuasão que exercia sobre o condômino desidioso, passando a estimulá-lo a inadimplir a obrigação mercê de uma penalidade flagrantemente irrisória.

Nestes quase sete anos de vigência do novo Código Civil muito já se discutiu sobre as providências que deveriam ser adotadas para solucionar a questão, não sendo poucas as propostas apresentadas por juristas atuantes no ramo imobiliário do Rio de Janeiro e de São Paulo.

O Estado de São Paulo foi o pioneiro na edição de uma lei destinada a dar aos síndicos um instrumento jurídico destinado a tornar a prática da inadimplência de cotas condominiais desvantajosa para o condômino desidioso, a ele seguindo-se o Estado do Rio de Janeiro com a recém promulgada Lei Estadual nº 5.373/09 (clique aqui).

Embora exultem os síndicos e administradores de imóveis com o novel instrumento jurídico com que foram contemplados - o protesto das cotas condominiais impagas - há um vício de origem na nova lei que compromete a sua conformidade com a Constituição da República (clique aqui) e, portanto, a invalida como solução para as agruras dos condomínios.

Isto porque ao dipor que "... os tabelionatos de protestos de títulos e de outros documentos de dívida ficam obrigados a recepcionar para protesto comum ou falimentar (...) o crédito decorrente de cotas de condomínio edilício, decorrente das quotas de rateio de despesas e da aplicação de multas, na forma da lei ou convenção de condomínio edilício, devidos pelo condômino ou possuidor da unidade ...", a Lei Estadual nº 5.373/09 invadiu a competência privativa da União Federal, fixada no art. 22, inciso I, da Carta Política, para legislar sobre matéria de direito civil.

Antes que se cogite de um equívoco de interpretação, convém dizer que a competência concorrente atribuída pela Carta Política aos Estados, Municípios e Distrito Federal para legislar sobre a matéria não pode ser exercida de forma tão elástica de molde a ampliar ou limitar o conceito fixado na Lei Federal nº 9.492/97 (clique aqui), cujo escopo é a regulamentação do protesto de títulos, matéria inerente ao Direito Comercial e, por isso mesmo, essencialmente dirigida aos títulos de crédito.

Ademais se, de um lado, é induvidosa a existência de uma relação jurídica obrigacional entre o condômino e o condomínio, de outro não se afigura correto entender esta relação jurídica como sendo de natureza tipicamente comercial, de molde a que um eventual crédito do condomínio possa gerar um título executivo judicial ou extrajudicial tal como definidos pela legislação processual, é dizer, aqueles indicados no artigo 585, do Código de Processo Civil (clique aqui).

De rigor, o "título" representativo de cota condominial impaga, ostentado pelo condomínio, não se inclui na hipótese do inciso V, do artigo 585, do CPC ("...o crédito decorrente de aluguel de imóvel, bem como os de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio ..."), pois que esta se refere aos aluguéis e encargos titulados pelo locador credor de obrigações resultantes de uma relação locatícia finda por inadimplência do locatário, e não do crédito ostentado pelo condomínio em face do condômino.

Tanto é assim, que a iterativa jurisprudência dos Tribunais Pátrios não admite a cobrança de cotas condominiais pela via da execução, impondo ao condomínio a observância do rito processual previsto no art. 275, inciso II, do Código de Processo Civil.

Malgrado o voluntarismo do legislador fluminense de dotar o setor imobiliário de um instrumento capaz de reduzir a inadimplência de cotas condominiais, não se afigura a Lei nº 5.373/09 como suporte jurídico idôneo que síndicos e administradores de imóveis possam valer-se para desestimular a inadimplência, sendo previsível uma enxurrada de medidas cautelares de sustação de protesto fundadas na inconstitucionalidade da referida lei estadual como resposta ao exercício desta duvidosa prerrogativa legal.

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*Sócio do escritório Angarano & Advogados Associados - RJ





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