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Planos de saúde e a legislação atual: os reajustes dos planos de saúde face ao CDC e o Estatuto do idoso

A estratégia que o governo vem utilizando há alguns anos, demonstra o interesse na diminuição de sua responsabilidade quanto ao serviço de saúde pública.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Atualizado em 7 de julho de 2009 08:05


Planos de saúde e a legislação atual: os reajustes dos planos de saúde face ao CDC e o Estatuto do idoso

Sylvia Maria Von Atzingen Venturoli Auad*

A estratégia que o governo vem utilizando há alguns anos, demonstra o interesse na diminuição de sua responsabilidade quanto ao serviço de saúde pública. Neste sentido estimulou a criação no Brasil e a vinda de outros países, de empresas especializadas em planos de saúde privada, cooperativas médicas, convênios e outras modalidades de atendimento médico particular e hospitalar, exames, enfim, assistência à população.

Essa tentativa de transferência de responsabilidade de uma obrigação essencialmente estatal demonstrou ser parcial e falha, uma vez que grande parcela da população não tem condições de arcar com esse ônus, que é essencial e historicamente utilizado em nosso país.

Entretanto, o sistema de saúde privado, criado com falhas, vem aos poucos sendo aperfeiçoado e amoldado pela interpretação jurisprudencial da legislação específica ou afim, como o CDC (clique aqui), a lei 9.656/98 (Planos de Saúde - clique aqui), o Estatuto do Idoso e também de diversas regulamentações da Agência Nacional de Saúde, além, obviamente, da CF/88 (clique aqui).

Tais interpretações vêm restabelecer um equilíbrio na concepção de cidadania, uma vez que o poder das empresas frente ao particular deixava-o à mercê dos contratos essencialmente unilaterais e leoninos formalizados pelas mesmas.

No entanto, isso não significa que se pretenda retirar a força dos contratos, mas apenas que nos dias de hoje os princípios da autonomia da vontade, da intangibilidade e da obrigatoriedade não são mais encarados pelas concepções clássicas antes reinantes, eis que modernamente é inegável o prestígio da boa-fé e da função social dos contratos, principalmente nas relações caracterizadas como de consumo.

Na busca do equilíbrio contratual, a sociedade de consumo moderna, utiliza a lei como limitadora e como adequada legitimadora da autonomia da vontade. A legislação atual valoriza a confiança, as expectativas e a boa fé dos contratantes frente ao acordo. No entanto, normas imperativas reduzem o espaço de vontade e a dominação particular.

A concepção moderna de contrato, cunhada no princípio da função social e da boa fé, ganha lugar frente ao interesse privado fazendo surgir um componente alheio às partes, mas fundamental para a coletividade como um todo: o interesse social.

Neste contexto, em muitos planos de saúde, na proposta de adesão fica estabelecido unilateralmente pela empresa, que o valor mensal do plano quando os consumidores completarem 60 anos de idade será dobrado, ou seja, haverá um reajuste de cerca de 100% (alguns planos tal reajuste é ainda superior).

O reajuste em virtude da existência da cláusula contida no contrato em razão da idade é absolutamente ilegal, pois viola o art. 15, § 3º da lei 10.741/03 - Estatuto do Idoso (clique aqui), que estabelece que "É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade".

Tal dispositivo resulta da proteção Constitucional conferida aos idosos/consumidores, como fundamento da República (dignidade da pessoa humana, art. 1º, III), como direito fundamental no art. 5º, XXXII, como princípio geral da ordem econômica (art. 170, V), como mandamento constitucional (art. 48 ADCT), bem como princípio constitucional de amparo às pessoas idosas (art. 230), com mandamento de tutela de sua dignidade e bem estar.

De se observar que a aplicação do Estatuto do Idoso a um contrato de prestação de serviços firmado anteriormente à sua entrada em vigor, por diversas razões jurídicas, não viola o princípio do ato jurídico perfeito (art. 5º, XXXVI, da CRFB/88).

Inicialmente, porque as normas constitucionais acima descritas são de aplicação imediata, pois considerados direitos fundamentais desde a publicação da CF/88, não dependendo de normas infraconstitucionais para garantir-lhes efetividade. Não é crível se imaginar que antes da publicação do Estatuto do Idoso era permitida a discriminação aos idosos!

Em seguida, porque o reajuste da mensalidade, a par de sua flagrante abusividade de tais reajustes face ao CDC, somente poderia acorrer quando e apenas se os consumidores viessem a completar os 60 anos de idade, ou seja, o direito ao reajuste estava sujeito a condição (fato futuro e incerto), que em muitos casos quando implementada já não mais era permitida pelo ordenamento jurídico.

A cláusula relacionada ao aumento da mensalidade em função da implementação dos 60 anos de idade passou a gerar efeitos concretos quando o direito brasileiro, agora de forma explícita, não mais contemplava a validade dessa espécie de ajuste.

Sobre o assunto, importante ressaltar que o STJ já se manifestou pela aplicação imediata do Estatuto do Idoso aos contratos de plano de saúde celebrados anteriormente à sua vigência, no julgamento do REsp. 989380/RN (clique aqui).

Em trecho do seu voto, a Ministra Relatora Nancy Andrigh, consignou que "O interesse social que subjaz do Estatuto do Idoso, exige sua incidência aos contratos de trato sucessivo, assim considerados os planos de saúde, ainda que firmados anteriormente à vigência do Estatuto Protetivo (...) Veda-se a discriminação do idoso em razão da idade, nos termos do art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso, o que impede especificamente o reajuste das mensalidades dos planos de saúde que se derem por mudança de faixa etária (...)".

Assim, pode-se afirmar que a majoração de cobrança de mensalidades dos Planos de Saúde em razão da mudança de faixa etária, está em flagrante desacordo com o Estatuto do Idoso, a CF/88 e o CDC.

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*Advogada. Integrante da Auad Advogados Associados. Associada ao IAMG - Instituto dos Advogados de Minas Gerais







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