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Fraude

Cliente do MercadoLivre não será indenizado após mensagem falsa

E-mail fraudado confirmava venda de aparelho de vídeo e pedia envio do produto.

Da Redação

segunda-feira, 26 de março de 2012

Atualizado às 08:34

A 1ª vara Cível de Jacareí/SP negou pedido de indenização a cliente vítima de fraude em site de compras. O autor utilizou o site MercadoLivre.com para oferecer equipamento de filmagem no valor de R$ 17,8 mil e alega ter recebido e-mail falso em nome da empresa solicitando que enviasse o produto a comprador que já havia efetuado depósito.

Após o envio e não recebimento do pagamento, o autor entrou em contato com o site e descobriu que havia sido vítima de fraude. Em razão disso, pediu que a empresa fosse condenada a lhe pagar o valor do bem, a título de danos materiais, além de danos morais, estimados no mesmo valor.

Para o juiz Paulo Alexandre Ayres de Camargo, a ação é improcedente, uma vez que o site não agiu com culpa, bem como não houve falha na prestação do serviço, o que não possibilita que seja reconhecida a responsabilidade do requerido. O magistrado afirma que o site disponibiliza meios para que o vendedor verifique a veracidade da negociação, o que, ao que parece, não foi feito pelo requerente.

Leia a íntegra da sentença.

__________

Sentença

Requerente: P. M. S.

Requerido: MERCADOLIVRE.COM ATIVIDADES DE INTERNET LTDA.

P. M. S ajuizou a presente ação em face de MERCADOLIVRE.COM ATIVIDADES DE INTERNET LTDA., visando à condenação do requerido a indenizá-lo por danos materiais e morais.

Em síntese, afirma que utilizou-se da plataforma de compra e venda virtual do requerido para vender equipamento de filmagem de sua propriedade, cujo valor era de R$ 17.800,00. Dias depois, recebeu um email do réu, dizendo que seu equipamento havia sido vendido, determinando o envio do bem para o comprador. O requerente, então, enviou-o, via sedex, mas não recebeu o pagamento.

Em contato com o requerido, descobriu que o email que havia recebido era falso e que havia sido vítima de fraude. Descobriu, também, que o mesmo equipamento, dias depois, estava sendo vendido na mesma plataforma, mas por usuário diferente, localizado no mesmo Estado da Federação que o comprador (Ceará). Pede, então, que o requerido seja condenado a lhe pagar o valor do bem, a título de danos materiais, mais danos morais, estimados no mesmo valor.

O requerido, citado, contestou a ação (fls. 53/70), afirmando que quem deve compor o polo passivo é a empresa MERCADOPAGO.COM REPRESENTAÇÕES LTDA. e afirmando, no mérito, que o autor foi vítima de fraude praticada por terceiro, sem nenhuma responsabilidade do requerido, e que o autor não tomou as cautelas recomendadas pelos Termos e Condições Gerais de Uso do MERCADO LIVRE, pois deveria, antes de encaminhar a mercadoria ao suposto comprador, verificar no extrato do "Mercado Pago" se de fato havia ocorrido o pagamento. Não tendo tomado essas cautelas, o autor acreditou no email falso (que não foi enviado pelo requerido) e foi vítima da fraude. Diz, então, que não tem nenhuma responsabilidade sobre os fatos, não tendo o dever de indenizar o autor. Houve réplica (fls. 260/272).

É o relatório.

Independentemente de quem deva compor o polo passivo da lide (MERCADOLIVRE.COM ou MERCADOPAGO.COM), a ação é improcedente. É fato incontroverso - porque admitido pelo próprio autor - que houve uma fraude praticada por terceiro, utilizando-se de email falso que simulava email verdadeiro do requerido. Pois bem. O autor não imputa nenhuma falha ao sistema de pagamento do requerido e não afirma ter havido participação de funcionários do réu na fraude.

A suposta responsabilidade do réu, segundo o autor, decorre do fato de ter recebido um email com logomarca do requerido, com características de verdadeiro, que o induziram a erro e fizeram com que tivesse um prejuízo de R$ 17.800,00, posto ter perdido equipamento profissional de alto custo. Esses fatos, no entanto, não geram responsabilidade ao requerido, que em nenhum momento agiu com culpa, nem mesmo a mais leve. Também não houve falha na prestação de serviço. O que houve - e como já dito é fato incontroverso - foi uma fraude praticada por terceiro, utilizando-se do nome do requerido e do fato de o autor ter colocado à venda seu equipamento de filmagem.

A plataforma de vendas "Mercado Livre" é aberta para consulta de qualquer pessoa e quem o utiliza, como o autor, sabe disso. Portanto, o requerente sabia que ao colocar à venda sua filmadora, qualquer pessoa do mundo teria condições de saber que o requerente a estava vendendo. Essa, aliás, é uma das grandes vantagens das plataformas de compra e venda virtual, como o Mercado Livre, na América Latina, e o "e-Bay", nos Estados Unidos da América, entre diversos outros existentes mundo afora. Mas se a grande exposição é uma vantagem para quem quer vender, de outro lado deixa o vendedor muito mais exposto e sujeito a fraudes. De estelionatários, o Poder Judiciário bem sabe disso, o Brasil está cheio. A imprensa noticia, quase diariamente, reiteradas fraudes praticadas através da internet.

O uso da rede mundial de computadores (ou World Wide Web, o famoso "www"), requer cautela. O requerente utilizou-se da plataforma MERCADO LIVRE, mas parece que se esqueceu de que estelionatários existem. Ao receber um email com a logomarca "Mercado Livre", acreditou em seu conteúdo e, sem sequer conferir a veracidade de seu teor e a sua origem, enviou o equipamento de R$ 17.800,00 ao suposto comprador. O requerente tinha motivos para acreditar no email, afinal, realmente estava vendendo sua filmadora pelo "Mercado Livre". Mas a confiança da vítima é exatamente o fator mais eficaz para praticar as fraudes. E estelionatários sabem disso. Fraudadores sabem que se encaminharem um email de um banco do qual a "vítima" não é cliente, pouco ou nada conseguirá, porque a vítima desconfiará de sua origem e conteúdo. Por isso, aliás, é que em regra as fraudes virtuais bancárias são realizadas com bancos de maior alcance popular, como o Itaú, o Bradesco, o Banco do Brasil, entre outros. O potencial de êxito do fraudador cresce na mesma proporção da aparência de realidade dos argumentos e dos meios por ele utilizados, já que é apoiado na confiança da vítima que ele atua. No caso concreto, o fraudador, aproveitando-se do fato de que o autor já estava esperando receber algum comunicado do Mercado Livre e ciente de sua pouca experiência na plataforma[1], apropriou-se de equipamento relativamente caro, auferindo, com isso, indubitável vantagem econômica. É o típico estelionato, que agora vem sendo praticado virtualmente.

Como já dito, toda essa trama praticada pelo fraudador foi feita sem nenhuma conduta culposa do requerido, que apenas atendeu à solicitação do autor, disponibilizando espaço em sua plataforma para a venda da mercadoria. Mais do que isso o réu não fez. E mais: o requerido disponibiliza meios ao vendedor para confirmar se está ou não sendo vítima de fraude. O vendedor cadastrado pode consultar seu extrato do "Mercado Pago" para saber se foi feito algum depósito em sua conta. Pode, também, contatar o requerido para confirmar a venda. E o autor, ao que parece, nada disso fez, certo de que o email que havia recebido era verdadeiro.

O requerido não pode ser responsabilizado pelo fato de terceiro, sem sua autorização, ter utilizado sua logomarca para praticar a fraude. Cita-se, para que a questão seja bem entendida pelo autor, o seguinte exemplo: "Ricardo" (nome fictício), estelionatário "profissional", cria uma conta de email gratuita (Yahoo, Gmail, Hotmail entre outras) em nome de "P. M. S" (nome do autor) e, logo em seguida, encaminha a "João" (nome também fictício), amigo do requerente (informação obtida através de sites de relacionamento, como o Facebook), um email passando-se pelo requerente e dizendo estar enfrentando sérias dificuldades financeiras, precisando com urgência de R$ 500,00, que deverão ser depositados em uma determinada conta bancária, sendo restituídos em no máximo uma semana. "João", sensibilizado pelas condições financeiras do amigo e acreditando no teor do email (afinal, veio com o nome do P.), faz o depósito, responde ao email desejando-lhe sorte e aguarda a restituição do valor emprestado. Passados quinze dias sem recebê-lo, "João" liga para seu amigo P. (o autor) questionando-o sobre a melhora de sua situação financeira e sobre a devolução do valor emprestado. Nesse momento é que P., que até então de nada sabia, toma conhecimento de que seu nome foi utilizado para a prática de uma fraude. Pergunta-se, então: por ter sido utilizado seu nome, o autor seria responsável pela devolução dos R$ 500,00 a "João"? Teria, também, a obrigação de indenizá-lo por danos morais, porque "João" teria sido enganado por seu amigo P.? A resposta, evidentemente, é negativa, sendo o autor, no exemplo citado, também vítima do estelionatário, já que teve seu nome usado para a prática da fraude. É, mutatis mutandis, o que ocorreu entre o autor e o requerido.

E não se pode falar, no caso concreto, em relação de consumo, já que, como já dito, tudo o que o requerido fez foi disponibilizar sua plataforma virtual ao autor, sem que tivesse sido constatado nenhum erro ou falha no serviço do requerido. O dano foi causado por ato ilícito extracontratual, praticado por terceiro, que não participou da relação jurídica existente entre autor e réu.

Por tudo isso, lamentando o fato ocorrido com o autor, não há como se reconhecer responsabilidade do requerido. Em face das considerações tecidas, julga-se IMPROCEDENTE a ação. Sucumbente, arcará o autor com as custas do processo e com os honorários advocatícios do patrono do requerido, fixados em 10% do valor atualizado da causa. Para a execução da sucumbência, observe-se o contido no art. 12 da lei 1.060/50. P. R. I. C.

Jacareí, 22 de março de 2012.

PAULO ALEXANDRE AYRES DE CAMARGO

Juiz de Direito

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