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Justiça Eleitoral

Para MP, prisão de diretor do Google não se justifica

Crime tipificado no art. 347 do Código Eleitoral é de menor potencial ofensivo.

Da Redação

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Atualizado às 08:36

No TRE/PB, o MP eleitoral manifestou-se em HC pela ilegalidade da ordem de prisão contra o diretor financeiro do Google Brasil, Edmundo Luiz Pinto Balthazar. Para o parquet, o crime tipificado no art. 347 do Código Eleitoral é de menor potencial ofensivo, não comportando a prisão em flagrante.

No dia 15/9, o juiz eleitoral Miguel De Britto Lyra Filho, do TRE/PB, concedeu liminar em HC para revogar ordem de prisão contra o diretor financeiro do Google Brasil, Edmundo Luiz Pinto Balthazar. A prisão do diretor foi determinada com a alegação de desobediência, uma vez que o Google não teria cumprido ordem judicial para remover do YouTube um vídeo que ridicularizaria um dos candidatos à Prefeitura da cidade de Campina Grande, Romero Rodrigues (PSDB).

O HC foi impetrado pelo advogado Leonardo Sica, do escritório Sica, Tangerino, Quito Advogados. Procurado, o causídico preferiu não se manifestar fora dos autos, mas a empresa, em seu blog, reiterou que continuará "campanha global pela liberdade de expressão - não apenas porque essa é uma premissa das sociedades livres, mas também porque mais informação geralmente significa mais escolhas, mais poder, melhores oportunidades econômicas e mais liberdade para as pessoas".

Veja abaixo a íntegra do parecer.

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PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL

Procuradoria Regional Eleitoral Da Paraíba

PROCESSO: 188-50.2012.6.15.0000
CLASSE: 16 (HABEAS CORPUS)
RELATOR: EXMO. JUIZ MIGUEL DE BRITTO LYRA FILHO
IMPETRANTES: LEONARDO SICA E BRUNO MACELLARO
PACIENTE: EDMUNDO LUIZ PINTO BALTHAZAR
IMPETRADO: JUÍZO DA 17ª ZONA ELEITORAL PARECER EM HABEAS CORPUS

Eminente Relator,

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor do paciente Edmundo Luiz Pinto Balthazar, contra quem foi determinada a imediata prisão em flagrante, nos autos da Representação n. 60-76.2012.6.15.0017, por crime de desobediência previsto no art. 347 do Código Eleitoral, ante a recusa do paciente, na qualidade de Diretor Geral da empresa GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA., ao cumprimento de decisão judicial direcionada a esta pessoa jurídica.

Decisão monocrática nº 234/2012 concedendo a liminar como requeri-da, por entender que, como provedor de pesquisa, o Google não seria o responsável pela postagem e, bem assim, por não vislumbrar o dolo na conduta perpetrada pela empresa de internet, tendo em vista as dificuldades narradas em sua defesa para o efetivo cumprimento da decisão judicial (ff. 57/61).

Informa a autoridade coatora que a determinação de prisão em flagran-te não se deu por responsabilidade pela postagem do vídeo, mas pelo descumpri-mento da ordem judicial de retirá-lo, com fundamento no art. 347 do Código Eleitoral c/c o art. 57-F da Lei n. 9.504/97 (ff. 65/67).

Juntada de documentos às ff. 18/55.

É o breve relatório. Passo a manifestação.

Alegam os impetrantes que não se encontram presentes os requisitos legais para a caracterização da prisão em flagrante, nos termos do art. 302 do CPP. Aduzem, ainda, que, na espécie, não se trata de propaganda eleitoral, mas de mani-festação protegida pelo princípio constitucional da liberdade de expressão.

Na decisão que concedeu a liminar, o eminente Relator assentou, em síntese, que o Google não seria o autor intelectual do vídeo e, em razão disso, não poderia responder penalmente pela veiculação do seu conteúdo. Ademais, afirmou não vislumbrar dolo na conduta perpetrada, em razão da dificuldade técnica relatada pelo paciente e desconsiderada pelo Juízo Zonal.

Em que pesem os argumentos expostos pelos impetrantes e as razões de decidir assentadas pelo eminente Relator, o Ministério Público Eleitoral entende que deve ser revogada a liminar concedida e denegada a ordem de habeas corpus requerida em favor do paciente, pelas seguintes razões.

Inicialmente, verifico que o GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA. não é, conforme assentado pelo eminente Relator, tão somente, um provedor de pesquisa, cujo papel se restringe à identificação de páginas na web onde determinado dado ou informação, mesmo que ilícito, está sendo livremente veiculado, o que o isentaria de qualquer conteúdo anonimamente publicado.

Ocorre que a empresa dirigida pelo paciente também é a proprietária do sítio de compartilhamento de vídeos YOUTUBE e do provedor de e-mail GMAIL, entre outros serviços de internet. Ressalte-se que a ordem judicial foi direcionada à retirada do vídeo cujo conteúdo foi considerado irregular do YOUTUBE e não dos re-sultados disponibilizados no provedor de pesquisa GOOGLE.

Nesse norte, como proprietária do sítio de compartilhamento de vídeos YOUTUBE, a empresa GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA. é, também, um prove-dor de conteúdo, hospedando, organizando e gerenciando as páginas virtuais indica-das no dispositivo de busca próprio disponibilizado neste serviço.

Sendo assim, revela-se plenamente possível e assaz simples o atendi-mento à decisão judicial emanada da 17ª Zona Eleitoral, ordem a que está sujeito o provedor de conteúdo GOOGLE nos termos do art. 57-F da Lei n. 9.504/97:

Art. 57-F. Aplicam-se ao provedor de conteúdo e de serviços multimídia que hospeda a divulgação da propaganda eleitoral de candidato, de partido ou de coligação as penalidades previstas nesta Lei, se, no prazo determinado pela Justiça Eleitoral, contado a partir da notificação de decisão sobre a existência de propaganda irregular, não tomar providências para a cessação dessa divul-gação. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009) (grifou-se)

Aqui, a responsabilização é cível eleitoral, compatível com o tipo penal previsto no art. 347 do Código Eleitoral. Ou seja, a decisão da 17ª Zona Eleitoral não imputou ao dirigente da pessoa jurídica a prática de conduta criminosa suposta-mente perpetrada pelo responsável pela publicação do vídeo, mas determinou sua prisão em flagrante em razão de sua recusa em cumprir a ordem judicial, nos termos do art. 347 do Código Eleitoral.

Ora, o conteúdo do vídeo considerado irregular não é responsabilidade da empresa dirigida pelo paciente, mas a permanência de sua veiculação, sim. Se a Justiça Eleitoral não pudesse determinar a retirada do vídeo até que fosse identifica-do o responsável pela postagem, qual seria a utilidade da norma proibitiva?

Não há falar, inclusive, em suposta ausência de ordem individualizada, nem tampouco em ausência de dolo, já que, devidamente intimado da decisão judi-cial proferida, o dirigente da empresa GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA. e ora pa-ciente, o Sr. Edmundo Luiz Pinto Balthazar, negou-se a dar cumprimento, insistindo em defender a regularidade do conteúdo anonimamente publicado.

Ora, mesmo em sede de habeas corpus, os patronos do paciente e ora impetrantes insistem em dizer que o conteúdo do ato (a ordem de retirada do vídeo) não está em conformidade com o que seria exigível à luz da lei. Ou seja, continuam questionando os fundamentos da decisão judicial, embora não sejam parte na repre-sentação que originou a ordem judicial sob exame.

Essa recalcitrância em cumprir a determinação judicial, além da total ausência de justificativa plausível para o seu não cumprimento, vez que hospeda o conteúdo considerado irregular demonstra, de forma inconteste, o dolo exigido pelo tipo previsto no art. 347 do Código Eleitoral.

O fato de não concordar com as fundamentos de decidir assentados pelo Magistrado da 17ª Zona Eleitoral não lhe confere a faculdade de recusar cum-primento à decisão judicial, nos termos do art. 347 do Código Eleitoral.

Por oportuno, trago à colação trecho de decisão do TJRS, citada pelo Exmo Juiz Eleitoral em suas informações:

Se as ordens judiciais não forem imperativas e se não houver sanção para o seu descumprimento não haverá mais necessidade nem de sua concessão e nem mais de Judiciário, pois de nada mais adiantaria ao cidadão, que teve seus direitos feridos, recorrer à Justiça, uma vez que as ordens judiciárias não passa-riam de "conselhos" ou "recomendações" de um juiz sem qualquer autoridade, de um Judiciário falido e de um Estado Democrático de Direito absolutamente inane. (Agravo Interno 7000302176-3, 1ª Câmara Especial Cível, Desembargador Adão Sérgio do Nascimento, data 27.03.2002)

No entanto, mister verificar que o crime tipificado no art. 347 do Código Eleitoral é de menor potencial ofensivo, não comportando a prisão em flagrante, nos termos do art. 69 da Lei nº 9.099/95. Na hipótese, deveria o Magistrado ter determi-nado à autoridade policial a condução coercitiva do paciente para lavratura de TCO.

Entendo, ainda, que a inércia do Google em cumprir a decisão judicial poderia ter sido evitada com a fixação de multa diária à pessoa jurídica ou, ainda, com a cominação de outras medidas cabíveis para assegurar a efetivação da ordem judicial de obrigação de fazer, nos termos do art. 461 do CPC.

Diante do exposto, o Ministério Público Eleitoral se manifesta pela concessão parcial da ordem de habeas corpus, apenas para revogar a ordem de prisão em flagrante expedida, devendo, todavia, ser lavrado o competente TCO e ultimadas as providências necessárias ao seu processamento.

João Pessoa, 24 de setembro de 2012.

YORDAN MOREIRA DELGADO
Procurador Regional Eleitoral

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