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Meio ambiente

STF valida lei que proíbe testes de cosméticos em animais

Os ministros, por outro lado, julgaram inconstitucional a proibição da comercialização de produtos desenvolvidos a partir de testes em animais.

Da Redação

quinta-feira, 27 de maio de 2021

Atualizado em 28 de maio de 2021 07:35

Nesta quinta-feira, 27, o plenário do STF julgou constitucional a proibição de testes de cosméticos em animais prevista em lei do Estado do RJ.

Por maioria, os ministros também decidiram que, embora o Estado-membro possa, sim, dispor sobre a proibição dos testes; o ente-federado não pode proibir a comercialização de produtos testados em animais, pois é competência privativa da União legislar sobre comércio interestadual. Veja como ficou o placar:

  • Testes em animais

A ação foi ajuizada em 2018 pela ABIHPEC - Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos contra a lei 7.814/17, do Estado do RJ.

A lei "proíbe a utilização de animais para desenvolvimento, experimentos e testes de produtos cosméticos, higiene pessoal, perfumes, limpeza e seus componentes, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, sem prejuízo de proibições e sanções previstas em outros dispositivos legais: municipal, estadual ou Federal".

O artigo 1º da lei dispõe o seguinte:

"Art. 1º - Fica proibida, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, a utilização de animais para desenvolvimento, experimento e teste de produtos cosméticos, higiene pessoal, perfumes, limpeza e seus componentes.

Parágrafo único - Fica também proibida a comercialização dos produtos indicados no caput deste artigo, quando derivados da realização de testes em animais."

A Associação também impugnou o artigo 4º da lei, que estabelece uma obrigação de rotulagem aos produtos cosméticos, de higiene pessoal, perfumes, de limpeza e seus componentes.

Para a Associação, a Assembleia Legislativa do RJ, ao editar a norma, usurpou a competência conferida à União para (i) estabelecer normas gerais sobre fauna, conservação da natureza e proteção do meio ambiente (ii) estabelecer normais gerais sobre produção e consumo (iii) legislar privativamente sobre direito civil e comercial.

"A lei impugnada extrapolou, e muito, a competência reservada aos Estados-membros, pois, além de contrariar a norma geral Federal, estabeleceu comandos que impactam a produção, consumo e relações privadas de natureza civil e comercial."

Leia petição inicial.

 (Imagem: Freepik)

(Imagem: Freepik)

  • Estado pode proibir testes e pode proibir comercialização

Para Edson Fachin, a lei inteira do RJ é constitucional porque tem "nítido caráter de regulação protetiva do consumidor e do meio ambiente". O ministro entendeu que não cabe ao Judiciário retirar a competência normativa de determinado ente da federação "sob pena de tolher-lhe sua autônima institucional". De acordo com Fachin, a legislação estadual, ao estabelecer exigências para rotulagem e comercialização dos produtos, está atuando na esfera legislativa concorrente e não na esfera privativa da União.  

Para Rosa Weber, a íntegra da lei fluminense é válida. Segundo a ministra, a legislação estadual, ao proibir o uso de animais para testes de produtos cosméticos, não regrou hipótese normativa contrária à lei 11.794/08. 

No mesmo sentido, votaram Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Luiz Fux. Para os ministros, a lei trata de um "avanço de humanidade" e não há nenhuma inconstitucinalidade na norma. 

  • Estado pode proibir testes, mas não pode proibir comercialização

Gilmar Mendes acolheu o pedido da Associação de forma parcial, de modo a validar a proibição de testes em animais, mas julgar inconstitucional a proibição da comercialização dos produtos testados em animais e a obrigação de rotulagem aos produtos cosméticos.

O ministro explicou que o STF tem reconhecido a possibilidade de os Estados ampliarem proteções dadas por norma Federal, especialmente, quando voltadas ao direito à vida e à proteção do meio ambiente. Como exemplo, Gilmar Mendes citou a lei fluminense 5.517/19, que vedou o consumo de cigarros, e afirmou que a norma não extrapolou o âmbito de atuação legislativa e nem exacerbou a competência concorrente para legislar sobre saúde pública.

O relator frisou que o conteúdo da lei fluminense e o da lei Federal 11.794/08 veiculam hipóteses normativas distintas, "assim, a rigor, não há que se falar em usurpação de competência da União para editar leis gerais sobre o tema definido no art. 24,6º da CF".

No entanto, Gilmar Mendes entendeu que o parágrafo único da lei e o seu artigo 4º - que regulam a comercialização e a rotulagem dos produtos testados em animais - afronta a CF: "a vedação imposta genericamente a toda e qualquer produto no Estado do RJ sema distinção de sua respectiva origem parece invadir a própria competência da União para legislar sobre comércio interestadual".

"Não vejo nessa norma nada que afronte a lei Federal", afirmou Alexandre de Moraes. O ministro frisou que todos os entes federados têm o dever da proteção da fauna e da flora. Para Moraes, a lei Federal excepcionou o uso de animais apenas para ensino e pesquisa científica: "a regra é a proteção aos animais", não incluindo os testes para indústrias cosméticas. 

"Não se justifica uma exploração aos animais para questão cosmética, principalmente na atual fase em que a química permite várias outras possibilidades."

Alexandre de Moraes seguiu Gilmar Mendes no que se refere à comercialização dos produtos. Para o ministro, se "fecha as fronteiras" para a comercialização dos produtos e fere competência da União para legislar sobre comércio interestadual. Assim, julgou parcialmente o pedido.

Luís Roberto Barroso afirmou que há competência concorrente do Estado para legislar sobre fauna e proteção ambiental. Dessa forma, o ministro disse não ter "dúvida em afastar a alegação de inconstitucionalidade formal para assentar que o Estado pode, sim, prover acerca dessa matéria".

Além disso, o ministro observou que a proteção dos animais evoluiu para reconhecê-los como seres sencientes, capazes de sofrimento de sentir dor. "Acho que evoluímos para uma proteção autônoma dos direitos dos animais", disse. Todavia, quanto à comercialização dos produtos testados, Barroso entendeu que a previsão é inconstitucional, por entender que o Estado usurpou competência privativa da União.

Em breves votos, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski seguiram o relator. 

  • Estado não pode proibir testes em animais

Nunes Marques votou por invalidar a lei; ou seja, na prática o voto do ministro vai no sentido de liberar os testes em animais para indústrias cosméticas. De acordo com o ministro, não há qualquer peculiaridade regional do Estado do RJ justificadora da edição de uma lei "discrepante" daquelas existentes ou inexistentes na maioria dos outros Estados-membros da União.

Para o ministro, a proibição deve ser feita pela União, em disciplina uniforme. Nunes Marques, frisou que não é despropositado imaginar que a permissão para que Estados legislem sobre a proteção de animais na atividade industrial pode conduzi-los a uma guerra de regulamentação, semelhante àquela que se passou com os tributos. "Uma regulamentação fragmentada pode levar a perplexidades", afirmou.

De acordo com o sócio do escritório Mauro Menezes & Advogados, Gustavo Ramos, que representou a HSI - Humane Society Internacional no caso (amicus curiae): "a decisão do STF, ao declarar constitucional a lei do Estado do Rio de Janeiro na parte que veda a utilização de animais em testes para a produção de cosméticos e afins, representa uma vitória da causa do bem-estar animal em todo o mundo, em prol da eliminação da imposição desnecessária de sofrimento aos animais. Privilegiou-se a diretriz constitucional de proteção à fauna e do reconhecimento da ética animal como um valor intrínseco e independente do interesse dos humanos. A decisão do STF impulsiona ainda, haja vista a densidade dos votos vencedores, a edição de legislações semelhantes em outros Estados no Brasil e até mesmo a edição de uma lei semelhante em nível federal, na linha do movimento global capitaneado por entidades como a Humane Society Internacional".

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