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6ª turma

STJ: Decretar cautelar mais grave que sugerida não é atuação de ofício

Decisão veio na análise de recurso interposto contra acórdão do TJ/RO, em que o réu alegou ter sido a sua prisão preventiva decretada de ofício.

Da Redação

quinta-feira, 10 de março de 2022

Atualizado em 23 de março de 2022 14:05

A 6ª turma do STJ entendeu que a opção judicial por medida cautelar mais grave do que aquela requerida pelo MP, pela autoridade policial ou pelo ofendido, não pode ser considerada atuação de ofício do magistrado.

A decisão veio na análise de recurso interposto contra acórdão do TJ/RO, em que o réu - acusado dos crimes de lesão corporal e ameaça no contexto de violência doméstica e familiar - alegou ter sido a sua prisão preventiva decretada de ofício, em afronta ao que determina a lei 13.964/19 (lei anticrime).

 (Imagem: Freepik)

Decretação de medida cautelar mais grave que a requerida pelo MP não caracteriza atuação de ofício.(Imagem: Freepik)

Segundo os autos, durante a audiência de custódia, o MP defendeu a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, incluindo o monitoramento eletrônico. Entretanto, o magistrado decretou a prisão preventiva, fundamentada na garantia da ordem pública, por entender preenchidos os requisitos dos artigos 312 e 313, III, do CPP.

Na decisão recorrida, o TJ/RO consignou que, embora a lei 13.964/19 tenha estabelecido (ao modificar o artigo 282, parágrafo 2º,  do CPP) que a prisão preventiva depende de requerimento do MP, do querelante, do assistente de acusação ou de representação do delegado de polícia, não houve alteração legislativa em relação às medidas desse tipo decorrentes de violência doméstica - as quais poderiam ser decretadas de ofício pelo juiz, conforme o artigo 20 da lei 11.340/06 (lei Maria da Penha).

Livre convencimento

Relator do processo no STJ, o ministro Rogerio Schietti Cruz ponderou que, diferentemente do entendimento do tribunal de origem, o princípio da especialidade não autoriza a atuação judicial de ofício, mesmo em se tratando de crime de violência doméstica e familiar contra a mulher. Por esse princípio, o dispositivo da Lei Maria da Penha (lei especial) se sobreporia ao CPP (lei geral).

"Não obstante o artigo 20 da lei 11.340/06 ainda autorize a decretação da prisão preventiva de ofício pelo juiz de direito, tal disposição destoa do atual regime jurídico. A atuação do juiz de ofício é vedada, independentemente do delito praticado ou de sua gravidade."

Entretanto, ele destacou que, no caso analisado, o que ocorreu não foi uma decisão de ofício, visto que houve requerimento do MP, durante a audiência de custódia, para que fossem fixadas cautelares diversas da prisão preventiva, mas o juiz optou pela cautelar máxima, por entender que apenas as medidas alternativas seriam insuficientes para a garantia da ordem pública.

"Uma vez provocado pelo órgão ministerial a determinar uma medida que restrinja a liberdade do acusado em alguma medida, deve o juiz poder agir de acordo com o seu convencimento motivado e analisar qual medida cautelar pessoal melhor se adequa ao caso."

Não vinculação do juiz

Schietti apontou o recente entendimento do STF no HC 203.208, segundo o qual, embora o juiz não possa decretar a prisão de ofício, ele não está vinculado ao pedido formulado pelo MP.

"Impor ou não cautelas pessoais, de fato, depende de prévia e indispensável provocação; contudo, a escolha de qual delas melhor se ajusta ao caso concreto há de ser feita pelo juiz da causa. Entender de forma diversa seria vincular a decisão do Poder Judiciário ao pedido formulado pelo Ministério Público, de modo a transformar o julgador em mero chancelador de suas manifestações, ou de lhe transferir a escolha do teor de uma decisão judicial."

De acordo com o ministro, a decisão do juiz pela cautelar mais grave teve "motivação suficiente e concreta a justificar a segregação preventiva, sobretudo diante do modus operandi da conduta e da periculosidade do agente, que ameaçou de morte e agrediu sua filha menor de 11 anos de idade e sua companheira - grávida de dez semanas à época dos fatos -, de modo a causar-lhe lesões que acarretaram sua internação".

Divergência

O ministro Sebastião Reis Jr. divergiu do relator ressaltando ter grande dificuldade em admitir, em especial no processo penal, que um juiz vá além daquilo que foi requerido pela parte interessada, no caso, pelo órgão acusador e titular da ação penal.

"Tendo o dono da ação penal requerido a imposição de cautelares que não a prisão, a meu ver, não pode um juiz ir além do pleiteado e impor ao investigado/réu a cautelar mais gravosa de todas."

Para Sebastião, ir além do que foi pedido será permitir que o juiz tenha uma iniciativa incompatível com o sistema acusatório, substituindo ou corrigindo, a seu bel prazer, a vontade do órgão de acusação ou suprindo suas eventuais falhas ou omissões.

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