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Voto de qualidade | Carf

STF forma maioria contra voto de qualidade no Carf; Nunes pede vista

O dispositivo que os ministros analisaram determina que, na hipótese de empate, o resultado deve ser favorável ao contribuinte.

Da Redação

quinta-feira, 24 de março de 2022

Atualizado em 13 de janeiro de 2023 11:19

Pedido de vista do ministro Nunes Marques suspendeu o julgamento, pelo plenário do STF, de três ações que questionam o fim do voto de qualidade para desempatar julgamentos do Carf - Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, ligado ao ministério da Economia. A alteração legislativa é objeto de três ADIns (6.399, 6.403 e 6.415). Já há maioria formada pela improcedência das ações (Marco Aurélio, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski).

O Carf é responsável pelo julgamento administrativo, em segunda instância, de recursos de contribuintes notificados pela fiscalização tributária na esfera Federal. 

A mudança que levou ao fim o voto de desempate no Conselho tornou o empate favorável ao contribuinte. A lei 13.988/20 se originou da MP 899/19, que tratava dos requisitos e das condições para a realização de transação resolutiva de litígio entre a União e os devedores de créditos fiscais.

 (Imagem: STF)

Nunes Marques pede vista em análise do voto de qualidade no Carf.(Imagem: STF)

  • Voto de qualidade (ou de desempate)

O Carf integra o ministério da Economia e é responsável pelo julgamento administrativo de segunda instância do contencioso administrativo fiscal na esfera Federal. As turmas do Carf são compostas paritariamente por representantes dos contribuintes e da Fazenda Pública, reservada à representante desta última a função de presidente.

Pela regra anterior (artigo 25, parágrafo 9º, do decreto 70.235/72), o voto de desempate era proferido pelo presidente da turma julgadora - é o chamado voto de desempate ou voto de qualidade.

O fim deste voto foi incluído pela MP 899/19, que deu origem à lei 13.988/20. Com a suspensão, ficou determinado que, na hipótese de empate, o resultado deve ser favorável ao contribuinte. O fim do voto, no entanto, não constava no texto original e foi incluído por emenda parlamentar na tramitação do projeto de lei de conversão da MP.

  • Ações no STF

Na ADIn 6.399, Augusto Aras assinala que houve vício no processo legislativo em razão da inserção de matéria de iniciativa reservada e sem pertinência temática com o texto originário por meio de emenda parlamentar. Aras alegou ainda que a Constituição Federal reservou ao presidente da República a disciplina da organização e do funcionamento dos órgãos da Administração Pública.

O PSB, na ADIn 6.403, afirma que a mudança implicará a alteração da própria natureza do Carf, que passará a ter caráter eminentemente privado, pois os representantes dos contribuintes, indicados por entidades privadas, passam a ter poder decisório soberano.

O partido argumenta que a alteração resultará numa perda de arrecadação aos cofres públicos de cerca de R$ 60 bilhões por ano e que, entre 2017 e 2020, mais de R$ 110 bilhões tornaram a integrar a carta de créditos tributários da União em decorrência da utilização do voto de qualidade.

Já a Anfip, na ADIn 6.415, aponta violação ao princípio democrático e ao devido processo legislativo, pois a alteração resultou de emenda parlamentar apresentada após a emissão de parecer pela Comissão Mista e não tem qualquer relação com a medida provisória que lhe deu origem. A associação ressalta ainda violação ao princípio constitucional implícito da prevalência do interesse público sobre o privado.

  • Votos proferidos

O julgamento teve início em abril de 2021, no plenário virtual. Na ocasião, o ministro Marco Aurélio (aposentado), relator, votou pela inconstitucionalidade formal da alteração, por considerar que, durante a tramitação do projeto que originou a lei, foi inserido no texto previsão sem afinidade com o conteúdo original. Na ocasião, se superada a questão da formalidade da lei, o relator se manifestava pela manutenção da modificação legislativa.

"Não há conexão da matéria com o texto original. O cenário é de molde a reconhecer a crise legislativa há tempos existente na frágil democracia brasileira, marcada pela opção por atalhos à margem da Constituição Federal - o que, na quadra vivenciada, tem se mostrado regra, e não exceção."

Em seguida, Barroso pediu vista. Os autos foram devolvidos para julgamento em junho de 2021, ocasião em que o ministro divergiu do relator e votou pela validade formal da alteração e pela improcedência das ADIns, porém ressalvando a possibilidade de a Fazenda poder rediscutir, em juízo, esse crédito tributário. Eis a tese proposta:

"É constitucional a extinção do voto de qualidade do Presidente das turmas julgadoras do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), significando o empate decisão favorável ao contribuinte. Nessa hipótese, todavia, poderá a Fazenda Pública ajuizar ação visando a restabelecer o lançamento tributário."

Depois disso, o caso foi novamente suspenso por pedido de vista, dessa vez de Alexandre de Moraes. Os processos voltaram a julgamento na sessão desta quinta-feira, ocasião em que Moraes votou pela improcedência das ações.

Em relação ao procedimento legislativo, Alexandre afirmou que a alteração normativa no critério de desempate de julgamento não exige a iniciativa privativa do presidente da República, pois não altera a estrutura do órgão do executivo. Ele também avaliou que não houve acréscimo de conteúdo estranho à matéria tratada na MP (o chamado "jabuti"), mas de assunto conexo. E lembrou que o Supremo já se manifestou pela possibilidade constitucional de emendas parlamentares durante o processo legislativo de MPs, desde que haja pertinência temática entre os assuntos.

Quanto ao aspecto material da lei, o ministro afirmou que a definição da forma de desempate no tribunal administrativo é opção legítima do legislador. Observou, contudo, que a Constituição prevê um sistema protetivo ao contribuinte em relação a eventuais abusos e distorções do Estado, o que torna mais razoável, a seu ver, que o empate seja a favor do contribuinte, e não do Fisco.

Para o ministro, não se pode afirmar que essa alteração vai prejudicar a Fazenda Pública, pois a maioria dos julgamentos, nos últimos anos, foram unânimes, o que mostra que o voto de qualidade é a exceção.

Alexandre fez pequena ressalva em relação ao voto do ministro Barroso apenas para afastar a possibilidade de a Fazenda ajuizar ação visando a restabelecer o lançamento tributário em caso de empate.

Os ministros Edson Fachin e Ricardo Lewandowski e a ministra Cármen Lúcia acompanharam Moraes. Em seguida Nunes Marques pediu vista.

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