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Operação Edema

Corte Especial do STJ mantém afastamento do governador de Alagoas

Por 9 a 2, colegiado manteve decisão da ministra Laurita Vaz que afastou o governador de Alagoas no bojo da operação Edema, que apura a prática sistemática de desvios de recursos públicos.

Da Redação

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Atualizado às 18:18

Nesta quinta-feira, 13, a Corte Especial do STJ, em sessão extraordinária, manteve decisão monocrática da ministra Laurita Vaz que determinou o afastamento do governador de Alagoas Paulo Dantas, suspeito de envolvimento em desvio de recursos públicos. O colegiado determinou que o político fique afastado até 31 de dezembro.

A relatora foi seguida pelos ministros Francisco Falcão, Herman Benjamin, Og Fernandes, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Paulo de Tarso Sanseverino e Antonio Carlos, e pelas ministras Nancy Andrighi e Isabel Gallotti.

Os ministros João Otávio de Noronha e Jorge Mussi divergiram para revogar o afastamento.

 (Imagem: Arte Migalhas)

Corte Especial mantém afastamento de Paulo Dantas.(Imagem: Arte Migalhas)

Entenda o caso

Em 29 de outubro de 2021, a superintendência regional da PF de Alagoas recebeu notícia-crime anônima delatando existência de suposta organização criminosa especializada em crimes financeiros e lavagem de dinheiro. O grupo supostamente realizaria saques diários no início de cada mês, nas agências da Caixa Federal.

Em março de 2022, após autorização do juiz de Direito da 17ª vara Criminal de Maceió/AL, foi deflagrada a operação Edema, com cumprimentos de busca e apreensão em vários endereços, além da quebra do sigilo bancário, fiscal e telemático dos investigados.

A denúncia apontou que a operação policial rendeu arrecadação de "vasto acervo potencialmente probatório dos crimes sob investigação".

Segundo a denúncia, mesmo com a análise parcial do material apreendido, ficou evidenciada a existência de grave esquema de recursos públicos com origem na Assembleia Legislativa de Alagoas, onde salários recebidos por servidores fantasma, em torno de 93 servidores, eram sacados em espécie e movimentados em favor de terceiros.

No dia 27 de junho de 2022, a ministra Laurita Vaz proferiu decisão acolhendo parecer ministerial para declarar a competência do STJ para o processamento da investigação, em razão de possível envolvimento da autoridade com prerrogativa de foro, o governador do Estado de Alagoas Paulo Dantas.

Circunstâncias

Segundo relatório policial, uma das circunstâncias que denota continuidade da atividade criminosa deriva da noticiada condução pelo policial José Everton Santos Gomes. O inquérito policial diz que encontrou na posse de José Everton a quantia de R$ 32 mil em espécie recém sacados na Caixa Federal em cartões em nome de terceiros.

A entrevista policial afirma que José Everton confessou que os cartões eram de funcionários fantasmas da Assembleia Legislativa de Alagoas.

De acordo com o relatório, comparando-se a relação de titulares de cartões apreendidos em agosto de 2022, na posse de "José Everton", e as mencionadas listas manuscritas encontradas no aparelho celular de "Paulinho", depara-se com 15 nomes, ou seja, dentro dos 18 cartões bancários usados por "José Everton", 15 constituíam parcela do lote sob a responsabilidade do operador "Paulinho".

"Essa ocorrência evidencia a verossimilhança da hipótese criminal sob investigação. Notadamente o protagonismo do governador Paulo Dantas, de seus cunhados Antônio Fontes Cintra Neto, Toinho Cintra e Teobaldo Cavalcante Bisneto", ressaltou Laurita.

Busca e apreensão

Na busca e apreensão de terça-feira, 11, ministra Laurita Vaz informou que foi encontrado R$ 104 mil em espécie na casa de Paulo e Marina Dantas.


Relatora - Afastamento mantido

Diligências

A denúncia diz que no celular de operador "José Carlos" foram localizados diversos arquivos a indicar que, em 2019, ano que o esquema criminoso supostamente teve início, Paulo Dantas e sua esposa adquiriram unidade de edifício por R$ 1,6 milhões quitados em 16 parcelas com pagamento em espécie realizados pelo operador "José Carlos".

A ministra relatora ressaltou que diligência realizada nas últimas duas semanas revelaram que o casal tinha uma cobertura, que correspondia a 300m², onde acredita-se que o casal residia entre 2019 e 2022. Todavia, diligências realizadas nas últimas duas semanas revelaram que eles repassaram essa cobertura como parte do acabamento de uma casa localizada no principal condomínio fechado de Maceió em negócio cujo valor total foi de R$ 8 milhões.

"Em pesquisa a fontes abertas foi possível identificar detalhes do imóvel, que conta com elevador e sete suítes, em condomínio denominado Laguna Heliport. As investigações apontaram que o casal experimentou aumento exuberante no padrão de vida, pois passaram de um apartamento avaliado em R$ 500 mil para mansão recém adquirida por R$ 8 milhões."

Para a ministra, é nítida a relação entre os crimes investigados e o acréscimo patrimonial. S. Exa. acrescentou que há robusto indício que o apartamento foi pago integralmente com o dinheiro do desvio, mediante quitação mensal constante nas planilhas de controle do principal operador do esquema.

Investigação

A relatora salientou que o relatório policial e a manifestação do MPF indicaram "fartos e robustos" indícios de que a organização criminosa prosseguiu mesmo após Paulo Dantas assumir o governo do Estado de Alagoas.

"Chama atenção o tamanho da ousadia dos criminosos de continuar esquema de corrupção dessa magnitude, baseado em saques regulares de vencimento de servidores fantasmas da Assembleia Legislativa e pagamento de simulações de movimentações."

Para a ministra, "é emblemático depoimento prestado à PF por José Everton narrando ameaça de morte feita por João Ferreira Jr. e Alexandro dos Santos por não ter entregado os R$ 32 mil apreendidos pela polícia junto com os cartões bancários".

Segundo a ministra, os ameaçadores teriam afirmado que "investigação sempre vai ter e nunca vai dar em nada".

Decisão

A ministra entendeu que a eventual decretação de prisão preventiva deve ficar reservada para a sequência da persecução, tão logo cumpridas as medidas cautelares em apreço, sobretudo a apreensão e análise de documentos, mídias, celulares, e outros elementos.

"Momento em que se espera ter melhor delineamento do iter criminis e dimensão e consequência dos ilícitos, além de mensurar, com mais elementos, a participação dos envolvidos, quando as cautelares poderão ser revistas."

Quanto ao afastamento cautelar do governador, a ministra disse que levou em conta a gravidade concreta das condutas, em tese, praticadas, por conta absolutamente incompatíveis com o exercício das funções de chefe do Poder Executivo.

"As investigações mostraram de forma bastante contundentes o possível envolvimento de Paulo Dantas em crimes gravíssimos, cujos empasses negativos na sociedade são incalculáveis, mais perfeitamente inestimáveis, por se tratar de um Estado como o de Alagoas, que ostenta o último lugar no ranking de IDH entre os Estados e DF."

Por fim, a ministra considerou "absolutamente necessário" o afastamento do governador Paulo Dantas, pois seria "medida imprescindível para obstar a continuidade da atuação da organização criminosa, evitar mais prejuízo aos cofres públicos, assegurar colheita e elementos de provas e evitar interferências indevidas".

Assim, manteve o afastamento do governador por 180 dias, proibição de acesso às dependências da sede do governo e da Assembleia Legislativa e manter contato com servidores ou funcionarios lotados na casa Legislativa.


Divergência - Não afastamento

João Otávio de Noronha divergiu da relatora quanto ao afastamento do governador, e seguiu quanto às demais cautelares.

O ministro ressaltou que o afastamento liminar do governador de cargo eletivo, dado seu caráter excepcional, exige a demonstração de: a) prova da materialidade; b) indícios veementemente da autoria praticada delitiva e c) risco efetivo de obstrução das investigações e do prejuízo erário em decorrência de sua permanência em cargo público.

Para o ministro, a imposição de medida dessa natureza exige do Poder Judiciário ainda maior cautela quando se tem por alvo agente público candidato a reeleição por potencial risco de afetar o resultado do pleito eleitoral em curso.

Noronha considerou que os indícios colhidos até o presente momento com a participação direta de Paulo Dantas nas condutas recentes apuradas pela autoridade policial não parecem suficiente para o afastamento do cargo.

"A narrativa policial e as informações prestadas pelo delator-informante José Everton não apontam para fatos contemporâneos diretamente vinculados ao governador Paulo Dantas, mas sim ao prefeito de Major Izidoro Theobaldo Cintra."

Ainda que eles tenham trabalhado na Assembleia para Paulo Dantas, sua legislatura como deputado estadual encerrou-se em agosto de 2022, não estando devidamente esclarecido seu atual vinculo com esses servidores municipais, nem com servidores fantasmas.

"Desde que ele saiu e passou a ser governador não tem nenhuma demonstração de vinculo dele com esses funcionários fantasmas ou ex-assessores. Aqui tudo se supõe. Nem mesmo o delator afirma de forma inequívoca que a liderança do grupo é do governador. Ao contrário, suas declarações apontam diretamente para o papel de liderança exercido por Theobaldo Cintra no esquema investigado."

Principal acusado não foi afastado

Segundo Noronha, não se ignora que Theobaldo é cunhado do governador, porém, o vinculo familiar não comprova materialidade delitiva, muito menos traz indícios do governador nos crimes em apuração.

Portanto, entendeu que os elementos informativos até agora colhidos não corroboraram a narrativa policial, não se justificando a imposição de medida extrema de afastamento de cargo eletivo, por não estar cabalmente demonstrado o fumus comício delicto.

O ministro ressaltou que foi concluído que até o momento não há provas suficiente para o afastamento do prefeito Theobaldo Cintra, sobre quem recaem os maiores indícios, tendo sido apontado como mandante dos crimes.

Então, o ministro indagou: "Se quem comandava os funcionários não está sendo afastado sob o argumento de que não tinha provas, imagine o governador, que já não tem vínculo com eles?"

"Percebe-se que o eventual risco que se pretende prevenir com o afastamento do governador já está neutralizado pela circunstância da operação ser conduzida pela Polícia Federal, não havendo risco efetivo de obstrução das investigações por parte da Polícia Civil."

Para Noronha, não se nega que há fatos graves que precisam ser apurados, mas o juízo condenatório melhor dirá ao final, em consignação exauriente, as medidas condenatórias, mas não agora com mera presunção.

Competência

O ministro João Otávio de Noronha ainda citou o caso de "rachadinha" no Rio de Janeiro, em que a competência ficou com a Assembleia do RJ.

"Entendo que depois do julgamento do STF e do STJ de rachadinha do RJ, a competência não seria do STJ. Lá a competência ficou com a Alerj."

Diante disso, votou pela revogação do afastamento liminar do governador do Estado do AL.

Votos

A relatora Laurita Vaz foi seguida pelos ministros Francisco Falcão, Herman Benjamin, Og Fernandes, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Paulo de Tarso Sanseverino e Antonio Carlos, e pelas ministras Nancy Andrighi e Isabel Gallotti.

Humberto Martins declarou-se suspeito por foro íntimo alegando que conhece todas as partes do processo.

Os ministros João Otávio de Noronha e Jorge Mussi divergiram para revogar o afastamento.

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