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Investigação

"Manterrupting" será analisado pelo CNJ após falas de desembargador

Corregedor abriu processo para apurar postura de desembargador com colegas magistradas.

Da Redação

quarta-feira, 11 de outubro de 2023

Atualizado às 19:55

CNJ vai apurar a postura do desembargador Georgenor de Sousa Franco Filho, presidente da 4ª turma do TRT da 8ª região, diante de suas colegas magistradas.

Nesta terça-feira, 10, o colegiado negou o pedido de adiamento de audiência que partiu de uma advogada puérpera,

A postura do magistrado, não só com relação à advogada, mas também com relação às desembargadoras participantes do julgamento, a relatora do caso, desembargadora Sulamir de Almeira, e outra colega, a desembargadora Alda Couto, se tornou alvo de reclamação disciplinar instaurada pelo corregedor Nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão.

A relatora do caso explicava o pedido da advogada quando foi interrompida. Veja parte do diálogo:

GF: - Excelência, eu queria ser bastante prático. Há um pedido. V. Exa. defere ou nega?

SA: - Eu vou deferir o pedido.

GF: - Para adiar o julgamento?

Em seguida, ele afirma que "gravidez não é doença, adquire-se por gosto".

A relatora tenta argumentar, quando é novamente interrompida:

SA: - Sim, Excelência. Não é doença, mas é um direito que a...

GF: - Mas ela não é parte no processo, é apenas advogada no processo.

O presidente do colegiado prosseguiu a análise, informando que nem todos os desembargadores presentes comporiam o quórum do julgamento, e que ele mesmo não iria votar. Neste momento, dirigiu-se à desembargadora Alda:

GF: - Desembargadora Alda também, calada está, calada permanecerá. Não podemos falar, não fazemos parte do quórum. Calemo-nos!

O processo é, possivelmente, a primeira apuração de "manterrupting" no âmbito do Conselho.

"Com efeito, a postura do desembargador GEORGENOR DE SOUZA pode, em princípio, ter violado deveres inerentes à magistratura, dentre os quais o dever de urbanidade para com os colegas e partes."

Assista à cena:

Manterrupting - O que é?

O termo "manterrupting" é um neologismo surgido a partir da junção das palavras em inglês "man" (homem) e "interrupting" (interrompendo) para indicar a interrupção desnecessária de uma mulher por um homem. O termo foi criado pela jornalista Jessica Bennett em janeiro de 2015 para um artigo da revista Time.

Um estudo publicado no Journal of Language and Social Psychology apontou que, em comparação aos homens, mulheres têm mais chances de serem interrompidas durante uma conversa tanto por homens quanto por outras mulheres.

Outro estudo, realizado por pesquisadores da Escola de Direito da Universidade Northwestern, mostrou que, na Suprema Corte americana, juízas durante suas argumentações eram interrompidas por seus pares ou por advogados litigantes com três vezes mais frequência do que seus colegas homens.

Em 2017, quando presidia o STF, ministra Cármen Lúcia criticou as interrupções.

"Foi feita agora uma pesquisa. Em todos os tribunais constitucionais onde há mulheres, o número de vezes em que as mulheres são aparteadas é 18 vezes maior do que entre os ministros."

E destacou: "Em geral, eu e a ministra Rosa, não nos deixam falar, então não somos interrompidas".

Veja o momento:

Perspectiva de gênero

Na decisão, o corregedor Nacional, ministro Luis Felipe Salomão lembrou que, desde março deste ano, com aprovação da resolução 492 do CNJ, a adoção de perspectiva de gênero nos julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário passou a ser imperativa, o que antes era apenas uma recomendação.

"Nesse passo, é preciso, durante todo o processo judicial, questionar se as assimetrias de gênero estão, de qualquer forma, presentes no conflito apresentado, com especial atenção ao 'tratamento das partes envolvidas, como advogadas, promotoras, testemunhas e outros atores relevantes'."

Salomão destacou que "o magistrado comprometido com o julgamento com perspectiva de gênero deve estar sempre atento às 'desigualdades estruturais que afetam a participação dos sujeitos em um processo judicial'".

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