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Responsabilidade

STF decide que União deve indenizar família de vítima de bala perdida

Ministros não definiram tese para fins de repercussão geral.

Da Redação

sábado, 9 de março de 2024

Atualizado em 11 de março de 2024 15:44

STF decidiu que o Estado deve ser responsabilizado pela morte de vítima de disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares quando a perícia que determina a origem do disparo for inconclusiva.

O julgamento do ARE 1.385.315, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.237), aconteceu em plenário virtual, encerrado na última sexta-feira, 8.

O entendimento pela responsabilização se deu por 9 a 2, mas com critérios distintos. Não houve, no entanto, uma definição sobre a tese para fins de repercussão geral. Isto porque foram apresentadas quatro correntes diferentes de votos. Neste caso, os ministros definirão a tese posteriormente, em sessão presencial.

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)
 

O caso concreto envolve a morte de Vanderlei Conceição de Albuquerque, ocorrida em 2015, durante troca de tiros envolvendo a Força de Pacificação do Exército no conjunto de favelas da Maré, no Rio de Janeiro.

Risco assumido

Relator do caso, ministro Edson Fachin entendeu que, diante da falta de investigação sobre a morte, o Estado deve ser responsabilizado pelos danos causados em operação policial "haja vista que o nexo causal entre a conduta e o resultado configura-se pelo fato de o Estado assumir o risco de realizar operação em área habitada, e a responsabilidade estatal somente poderia ser afastada acaso comprovada a ocorrência de força maior, caso fortuito, ou fato exclusivo da vítima".

Eis a tese proposta:

"Sem perícia conclusiva que afaste o nexo, há responsabilidade do Estado pelas causalidades em operações de segurança pública."

Quanto ao caso concreto, o ministro concluiu que os familiares de Vanderlei devem receber R$ 300 mil de indenização, sendo R$ 200 mil para os pais e R$ 100 mil para o irmão, além de ressarcimento dos gastos com funeral e pensão vitalícia.

Os ministros Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e Rosa Weber acompanharam Fachin.

Leia o voto do relator.

Alvejamento plausível

Para o ministro André Mendonça, o Estado pode ser responsabilizado, "desde que se mostre plausível o alvejamento por agente de segurança pública". Além disso, Mendonça também definiu que o Estado tem direito a se eximir da responsabilização civil caso haja "total impossibilidade da perícia" de origem da bala.

O ministro propôs a seguinte tese:

"a) o Estado é responsável por morte de vítima de disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidade, quando a perícia que determina a origem do disparo for inconclusiva, desde que se mostre plausível o alvejamento por agente de segurança pública;

b) Poderá o Estado se eximir da responsabilização civil, caso demonstre a total impossibilidade da perícia, mediante o emprego tempestivo dos instrumentos técnicos disponíveis, para elucidação dos fatos."

Em relação ao caso concreto, o ministro votou para condenar somente a União nos valores indenizatórios arbitrados, em parcial provimento do recurso extraordinário, haja vista a não participação da PM/RJ no momento dos fatos.

Os ministros Dias Toffoli e Nunes Marques acompanharam Mendonça.

Leia o voto de Mendonça.

Risco administrativo

O ministro Cristiano Zanin concordou, em parte, com a ideia de Fachin sobre a responsabilização do Estado, porém seguiu a teoria do risco administrativo, que sugere a possibilidade de isenção de responsabilidade do Estado caso fique demonstrado que não houve nexo causal entre o comportamento e o dano. 

Ele reforça que a perícia inconclusiva não é suficiente, por si só, para afastar a responsabilidade. 

Eis a tese proposta:

"i) a responsabilidade civil do Estado, na forma do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, opera sob a teoria do risco administrativo, cabendo a oposição, se o caso, de excludentes de responsabilidade pelo ente federativo;

(ii) a perícia inconclusiva sobre a origem de disparo fatal durante operações policiais e militares não é suficiente, por si só, para afastar a responsabilidade civil do Estado."

Quanto ao caso concreto, Zanin teve conclusão oposta: considerou que o governo estadual não pode ser responsabilizado pela morte, já que não há registro de operação da Polícia Militar do Rio de Janeiro no dia em questão.

O ministro Luís Roberto Barroso seguiu entendimento de Zanin.

Leia o voto de Zanin.

Dano direto e imediato

Ministro Alexandre de Moraes, por sua vez, divergiu integralmente, por considerar que a União não pode ser responsabilizada. A responsabilização só pode ocorrer se houver prova de que a bala partiu de um agente do Estado, ou seja, em relação aos efeitos diretos e imediatos causados pela conduta.

Ele sugeriu a seguinte tese:

"A responsabilidade estatal por morte de vítima, por disparo de arma de fogo durante operações policiais ou militares em comunidade, pressupõe a comprovação de que o projétil partiu dos agentes do Estado".

O ministro Luiz Fux seguiu entendimento de Alexandre de Moraes.

Leia o voto de Moraes.

Entenda o caso

O caso diz respeito à morte de Vanderlei Conceição de Albuquerque, de 34 anos, em junho de 2015, atingido por projétil de arma de fogo dentro de casa, na comunidade de Manguinhos, no RJ, durante tiroteio entre moradores, militares do Exército e policiais militares.

Sua família moveu ação contra a União e o Estado, mas o juízo de 1º grau julgou improcedentes os pedidos de indenização por danos morais, ressarcimento das despesas do funeral e pensão vitalícia. A decisão baseou-se na ausência de comprovação de que o disparo que causou a morte teria sido realizado por militares do Exército.

O TRF da 2ª região manteve a decisão. Segundo o Tribunal, não havia dados que vinculem o ocorrido à atuação dos militares da Força de Pacificação do Exército na comunidade, pois o laudo pericial foi inconclusivo quanto à origem do projétil. Ainda de acordo com a decisão, também não ficou comprovada nenhuma conduta omissiva específica dos agentes públicos que configure a responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar.

No STF, a família argumentou que é totalmente desnecessária a discussão sobre a origem da bala que vitimou o morador, porque o Estado, de acordo com o parágrafo 6° do artigo 37 da CF, responde objetivamente pelos danos causados por seus agentes a terceiros.

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