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STJ valida busca domiciliar às 5h, independentemente de haver luz solar

Por maioria, a 3ª seção rejeitou nulidade e adotou o intervalo definido pela lei de abuso de autoridade para o cumprimento de mandados domiciliares; Schietti ficou vencido ao propor novo marco de 6h às 20h.

Da Redação

quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

Atualizado às 18:52

A 3ª seção do STJ decidiu, por maioria, que mandados de busca e apreensão podem ser cumpridos a partir das 5h da manhã, ainda que antes do nascer do sol, à luz do marco objetivo previsto na lei de abuso de autoridade, lei 13.869/19. O colegiado negou provimento aos RHCs 196.481 e 196.496, que questionavam a legalidade de diligências iniciadas às 5h05, em João Pessoa/PB.

Prevaleceu o voto do relator, ministro Sebastião Reis Júnior, enquanto o ministro Rogerio Schietti ficou vencido ao propor que o cumprimento de mandados observe o intervalo entre 6h e 20h.

Entenda o caso

As defesas de duas advogadas investigadas na Operação Escoliose - ação que apura suposto cartel na venda de órteses e próteses a hospitais públicos e privados - sustentaram que a busca realizada em julho de 2023 violou a inviolabilidade domiciliar porque ocorreu em período noturno, já que o sol nasceu apenas às 5h33 naquele dia.

Argumentaram que a diligência, iniciada às 5h05, afrontou o art. 5º, XI, da Constituição e o art. 245 do CPP, que autorizam o ingresso domiciliar somente "durante o dia".

As defesas apresentaram dados astronômicos, fotografias, metadados e testemunhos para demonstrar que as equipes teriam chegado ainda antes das 5h, o que configuraria crime de abuso de autoridade.

Relataram ainda os impactos da medida em lares onde dormiam idosos, crianças e famílias inteiras.

 (Imagem: Arte Migalhas)

STJ valida busca domiciliar às 5h, independentemente de haver ou não luz solar.(Imagem: Arte Migalhas)

Sustentações orais

Os advogados sustentaram que o Estado violou o direito fundamental ao lar ao cumprir mandados em plena noite. Defenderam que a Constituição e o CPP exigem luz solar efetiva para caracterizar o período diurno e que o mero marco cronológico de 5h não atende à proteção assegurada pela cláusula pétrea da inviolabilidade domiciliar.

Citaram precedentes do STF e do próprio STJ que reconhecem a ilegalidade de buscas iniciadas antes da aurora, bem como a jurisprudência da 6ª Turma, que anulou diligência realizada às 5h30 diante da comprovação de ausência de luz natural.

Lembraram ainda que a Corte Interamericana de Direitos Humanos já advertiu que incursões policiais feitas à noite produzem efeitos mais traumáticos e ampliam o risco de abusos, sobretudo contra mulheres, crianças e grupos vulneráveis.

No caso concreto, afirmaram que houve falta de diligência do MP ao direcionar a operação para residências onde as investigadas não moravam mais, gerando constrangimento a idosos e expondo famílias a situação abusiva durante o repouso noturno.

O MPF, por sua vez, defendeu a legalidade da operação, argumentando que a lei de abuso de autoridade resolveu o debate ao criminalizar o cumprimento de mandado antes das 5h e após as 21h.

Para o órgão, se o legislador definiu expressamente esses limites, todo o período a partir das 5h deve ser considerado lícito, ainda que não haja luz natural no momento da diligência.

Para o relator, marco legal prevalece sobre critérios astronômicos

O ministro Sebastião Reis Júnior reconheceu que a definição de "dia" sempre gerou divergências doutrinárias, com critérios que variam entre o físico (existência de luz solar), o cronológico (horário fixo) e o misto.

No entanto, afirmou que essa disputa foi superada pela lei 13.869/19 (lei de abuso de autoridade), que criminalizou o cumprimento de mandado antes das 5h e após as 21h, delimitando, assim, o início do período em que o cumprimento é permitido.

Assim, a norma passou a definir "horário certo e definido" para o cumprimento de mandados, dispensando considerações sobre luminosidade natural.

O relator destacou ainda que o auto circunstanciado - assinado por testemunhas e por representantes da OAB - não registrou ausência de luz no local da diligência, e que eventual alegação de ingresso anterior às 5h exigiria reexame de provas, o que é inviável em habeas corpus.

Diante disso, votou por negar provimento aos recursos, validando o cumprimento do mandado às 5h05.

Diligência ainda noturna afronta inviolabilidade do lar

O ministro Rogerio Schietti divergiu, sustentando que a lei de abuso de autoridade não definiu o que é "dia", mas apenas delimitou quando o cumprimento do mandado configura crime. Isso não significa, segundo afirmou, que uma diligência feita às 5h - ainda em plena noite - seja automaticamente válida do ponto de vista constitucional.

Para Schietti, o cumprimento de mandados em período de escuridão afronta a proteção reforçada do lar, uma das garantias mais sensíveis do Estado de Direito. Citou decisão recente da Corte Interamericana de Direitos Humanos que reconhece o caráter especialmente lesivo das invasões domiciliares noturnas, com impactos acentuados sobre mulheres, crianças e adolescentes.

Ressaltou também o histórico brasileiro de abusos em operações policiais e lembrou que, em grande parte do país, o amanhecer ocorre bem depois das 5h, especialmente no inverno.

S. Exa. defendeu que o critério adequado deve ser o previsto no CPC, aplicável por analogia ao processo penal, fixando o intervalo entre 6h e 20h. Advertiu que autorizar incursões às 5h equivale a ampliar o espaço para operações ainda noturnas, o que reputou perigoso em um país marcado por práticas policiais violentas.

Propôs, por fim, a modulação de efeitos, para que o novo marco valha apenas para casos futuros, sem anular diligências já praticadas sob entendimento diverso.

Resultado

Por maioria, a 3ª seção negou provimento aos recursos, validando o cumprimento do mandado às 5h05 e adotando, como referência, o intervalo de 5h às 21h definido pela lei de abuso de autoridade.

Ficou vencido o ministro Rogerio Schietti que defendia a nulidade da diligência e a adoção do marco de 6h às 20h para cumprimento de mandados no futuro.

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