Fux suspende análise de embargos contra extensão do foro privilegiado
Ministro pediu vista em caso no qual PGR pede definição de balizas para aplicação da tese que manteve prerrogativa de foro após fim do mandato.
Da Redação
sexta-feira, 19 de dezembro de 2025
Atualizado às 17:11
Ministro Luiz Fux pediu vista e suspendeu a análise de recurso da PGR que busca delimitar o alcance da tese que estendeu a prerrogativa de foro.
O entendimento permite que crimes praticados no cargo e em razão das funções continuem sob competência da Corte mesmo após o afastamento do agente público. Isso vale ainda que o inquérito ou a ação penal tenham sido instaurados apenas depois do término do mandato.
A análise dos embargos não reabre o mérito da decisão tomada pelo plenário, em março, por maioria de 7 a 4, mas tem por objetivo esclarecer os efeitos práticos do entendimento fixado e estabelecer parâmetros para a aplicação, diante de dúvidas surgidas com a remessa de inquéritos e ações penais ao STF.
Até o pedido de vista, haviam se manifestado os ministros Gilmar Mendes (relator), acompanhado por Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin, no sentido de acolher os embargos de declaração com efeitos integrativos, fixando parâmetros para a aplicação da tese sobre o foro por prerrogativa de função.
Ministro Flávio Dino também acompanhou o relator quanto à conclusão, mas apresentou ressalvas pontuais em relação a um dos critérios adotados, especialmente no que diz respeito ao exercício sucessivo de cargos sujeitos a foros distintos.
Veja como estava o placar até o pedido de vista:
Decisão de mérito
Em março, o Supremo alterou a orientação que vigorava desde 2018 (AP 937) e fixou a seguinte tese:
"A prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício."
Prevaleceu o voto do relator, ministro Gilmar Mendes, para quem o entendimento anterior reduzia indevidamente o alcance constitucional da prerrogativa de foro e produzia oscilações constantes de competência, com prejuízos à estabilidade, à eficiência da persecução penal e ao princípio do juiz natural.
O HC foi impetrado pelo senador Zequinha Marinho, ex-deputado Federal, denunciado por suposta prática de "rachadinha" durante o exercício do mandato.
O inquérito foi instaurado em 2013, inicialmente sob supervisão do STF, mas acabou remetido a outras instâncias após a renúncia do parlamentar.
Desde então, o processo tramitou por mais de uma década em diferentes órgãos do Judiciário, sem conclusão da instrução processual.
Ao fixar a nova tese, o STF determinou sua aplicação imediata aos processos em curso, com preservação dos atos já praticados sob a jurisprudência anterior.
Embargos
Ao embargar do acórdão, a PGR indicou quatro pontos que, a seu ver, demandariam esclarecimento:
- ampliação da modulação de efeitos para manter na 1ª instância processos com instrução já encerrada;
- definição de critérios para casos de exercício sucessivo de cargos sujeitos a foros distintos;
- aplicação da tese a cargos vitalícios;
- incidência do foro em crimes praticados durante o processo eleitoral.
Voto do relator
1. Ampliação da modulação de efeitos
No voto apresentado nos embargos, ministro Gilmar Mendes rejeitou o pedido da PGR para ampliar a modulação de efeitos.
Segundo o relator, regras de foro por prerrogativa de função têm natureza de competência absoluta e, por isso, devem incidir imediatamente sobre os processos em curso, independentemente da fase em que se encontrem - inclusive aqueles já sentenciados e em grau recursal.
Para Gilmar, admitir a permanência de ações na 1ª instância após a mudança de entendimento poderia resultar em julgamento por juízo absolutamente incompetente, violando o princípio constitucional do juiz natural.
2. Regras para mandatos ou cargos sucessivos
Quanto aos casos em que o agente exerce mandatos ou cargos sucessivos sujeitos a diferentes foros, o relator propôs a adoção da regra da prevalência do órgão de maior graduação, prevista no art. 78, III, do CPP.
Assim, quando houver dúvida sobre o momento exato da prática do crime ou quando a conduta se estender por mais de um mandato, a competência deverá ser fixada, em regra, no tribunal hierarquicamente superior, que poderá avaliar a necessidade de eventual desmembramento.
3. Cargos vitalícios
Gilmar Mendes também afirmou que a tese aprovada pelo STF se aplica aos ocupantes de cargos vitalícios, como membros do Poder Judiciário, do MP, dos Tribunais de Contas, das Forças Armadas e da carreira diplomática.
Segundo o relator, a prerrogativa de foro visa garantir independência e liberdade de atuação do agente público, inclusive após o desligamento do cargo, protegendo-o de eventuais retaliações decorrentes de atos praticados no exercício da função.
4. Crimes durante eleições
Em relação a crimes praticados durante o processo eleitoral, o relator esclareceu que não há foro por prerrogativa de função quando a conduta ocorre antes da investidura no cargo e apenas a pretexto de seu exercício futuro.
A exceção ocorre quando tais crimes são conexos a delitos funcionais praticados após a diplomação, hipótese em que a competência do tribunal poderá ser atraída para julgamento conjunto.
5. Conclusão
Ao final, Gilmar Mendes votou pelo acolhimento dos embargos com efeitos integrativos, para fixar as seguintes balizas:
- a tese alcança todos os titulares de foro, inclusive ocupantes de cargos vitalícios;
- é cabível a aplicação da prevalência do órgão de maior graduação nos casos de exercício sucessivo de cargos;
- o foro não alcança, em regra, crimes eleitorais, salvo nas hipóteses de conexão com crimes funcionais posteriores.
O relator reafirmou, contudo, a incidência imediata da nova orientação, rejeitando a ampliação da modulação de efeitos.
- Veja o voto.
S. Exa. foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin.
Acompanhou com ressalvas
Ministro Flávio Dino acompanhou o relator quanto ao acolhimento dos embargos de declaração com efeitos integrativos e às balizas gerais fixadas para a aplicação da nova tese sobre foro por prerrogativa de função.
Contudo, S. Exa. fez ressalva específica em relação ao ponto da tese que trata do exercício sucessivo de cargos sujeitos a diferentes foros.
Para Dino, a aplicação do critério da prevalência do órgão de maior graduação - previsto no art. 78, III, do CPP - deve ser orientada por objetivos de racionalidade, estabilidade e segurança jurídica, de modo a evitar o chamado "sobe e desce" processual entre instâncias, fenômeno que, segundo Dino, compromete a eficiência da persecução penal e amplia o risco de nulidades.
Nessa linha, o ministro defendeu que, uma vez fixada a competência no órgão jurisdicional de maior graduação, em razão do exercício sucessivo de cargos públicos, a posterior cessação do vínculo funcional - seja por aposentadoria, término de mandato, renúncia ou outra forma de desligamento - não deve ensejar nova remessa do processo a instância inferior.
Segundo Dino, a estabilização da competência no tribunal superior prestigia os princípios da segurança jurídica, da duração razoável do processo e da coerência do sistema de prerrogativa de foro, evitando deslocamentos sucessivos que apenas retardam a prestação jurisdicional.
Confira o voto.
- Processos: HC 232.627 e Inq 4.787




