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Diferenças e semelhanças entre a tutela antecipada e a tutela cautelar no novo CPC

Anwar Mohamad Ali

Nesta esteira, há que se considerar a absoluta necessidade do juiz indicar, expressamente, se está deferindo a tutela antecipada ou a tutela cautelar.

quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Atualizado em 30 de agosto de 2016 12:55

O novo CPC procurou acabar com a discussão doutrinária e jurisprudencial acerca da diferença entre os requisitos autorizadores para a concessão da tutela antecipada e tutela cautelar1. Com efeito, o art. 294, caput, indica que a tutela provisória pode ser fundada em urgência ou evidência. A tutela de urgência, por sua vez, se divide em cautelar e antecipada.

O art. 300 consagra, em seu caput, que: "A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo".

Assim, como a tutela de urgência engloba tanto a cautelar como a antecipada, tem-se que ambas possuem os mesmos requisitos para a sua concessão2, quais sejam, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo3.

Todavia, ainda que tenham sido equiparados os requisitos para ambas as figuras, a forma de processamento e a consequência do deferimento de uma ou outra são absolutamente diferentes.

Inicialmente, quanto ao processamento da tutela antecipada requerida em caráter antecedente4, tem-se que, após a sua concessão, o autor deverá aditar a petição inicial, complementando a sua argumentação e juntando novos documentos (se necessário for), confirmando o pedido de tutela final em 15 dias, via de regra; o réu será citado e intimado para a audiência de conciliação ou mediação (e para o próprio cumprimento tutela antecipada, apesar do silêncio legal), sendo que o prazo da contestação será computado conforme o art. 335.

Referido dispositivo diz, em síntese, que o prazo para contestação será de 15 dias, contados da audiência de conciliação ou mediação infrutífera ou quando esta não se realizar pelo não comparecimento de umas partes, ou, ainda, a partir do protocolo do pedido de cancelamento desta audiência.

Pois bem. Aqui já se verifica a grande diferença entre a tutela antecipada e a cautelar.

Quando for formulado pedido de tutela cautelar antecedente, o réu será citado para contestá-lo em cinco dias, conforme dita o art. 306.

Outrossim, após a efetivação da tutela cautelar, o autor terá 30 dias para formular o pedido principal5. Deste modo, aqui se exige que a tutela cautelar seja efetivada para que o prazo seja iniciado, além do que este prazo é maior (30 dias, ao contrário dos 15 da tutela antecipada). A audiência de conciliação ou mediação somente será designada após a apresentação do pedido principal, e não desde logo.

Por fim, há previsão de cessação da eficácia da tutela cautelar caso o autor não deduza a pretensão principal no prazo legal ou se esta não for efetivada dentro de 30 dias, o que não ocorre na tutela antecipada.

Assim, como visto, apesar das figuras apresentarem os mesmos requisitos, o procedimento em uma e outra é diferente. Não obstante, há outra importante distinção. A estabilização se aplica para as tutelas antecipadas, mas não para as cautelares6.

Em um primeiro momento, analisando-se puramente o texto legal, a impossibilidade de estabilização para a tutela cautelar se dá justamente na medida em que tal fenômeno encontra previsão apenas no capítulo II, título II do livro V, Parte Geral, referente à tutela antecipada, mais especificamente no art. 304, caput, que diz: "Art. 304. A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso."

Já no capítulo III, deste mesmo título, que trata de tutela cautelar, não há qualquer previsão semelhante acerca da possibilidade de estabilização.

Todavia, a restrição deste fenômeno apenas para as tutelas antecipadas não se limita a este aspecto, mas também em um critério lógico-jurídico. Isto porque a tutela cautelar não visa à concessão do bem da vida antes do momento usual, mas apenas assegurar o resultado útil do pedido dito principal, como ocorre, por exemplo, nos casos de arresto e sequestro.

Daí porque não há sentido em que tais medidas estabilizem-se sem que o direito buscado no pedido principal fosse concretizado7.

Deste modo, por tudo que se viu, pode-se afirmar que a tutela cautelar e a antecipada possuem procedimentos e consequências bem distintos.

Da adequada motivação da decisão que defere a tutela provisória e o conteúdo do mandado de citação

A necessidade de fundamentação das decisões judiciais é tema de absoluta relevância, merecendo atenção, inclusive, da Constituição Federal, em seu art. 93, IX. E a questão ganha nova força com o novo CPC, que pretende dar maior atenção ao referido princípio (consoante arts. 298 e 489, por exemplo).

Nesta esteira, há que se considerar a absoluta necessidade do juiz indicar, expressamente, se está deferindo a tutela antecipada ou a tutela cautelar.

Como já visto, além do procedimento ser diverso, as consequências também o são. Se deferida uma tutela antecipada, esta tem aptidão para a estabilização, enquanto a tutela cautelar não possui esta particularidade.

Deste modo, o réu deve saber, de antemão, qual o provimento contra ele deferido, pois só assim poderá adotar a providência que entender necessária, evitando-se, inclusive, a decisão surpresa, tão combatida pela novel legislação.

Quanto ao mandado de citação/intimação, o art. 250, inciso V, indica a necessidade de entrega, ao réu, de cópia da decisão que deferir a tutela provisória8.

Todavia, não basta que conste cópia da referida decisão. É absolutamente necessário que o mandado contenha, expressamente, a consequência advinda, por exemplo, da não apresentação de recurso dentro do prazo cabível, mormente se a medida deferida for a tutela antecipada, posto que esta poderá estabilizar.

Interessante notar que o novo CPC, ao ser enviado à Câmara dos Deputados sob a numeração PL 8.046/10, previa expressamente, em seu art. 280, §1º, que do mandado de citação constaria a advertência de que, não impugnada a decisão, esta continuaria a produzir efeitos independentemente da formulação de um pedido principal pelo autor. Infelizmente tal regra não foi mantida na redação que acabou por vingar.

Ressalte-se que a não observância desta regra poderá trazer consequências nefastas para o procedimento, com a possível decretação de nulidade da citação e, via de consequência, de todos os atos a ela posteriores9.

Em verdade, apesar da intenção do legislador em equiparar os requisitos para a concessão das tutelas antecipada e cautelar, vimos que remanesce a importância de diferenciá-las.

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1 Entendendo que os requisitos eram substancialmente diversos, vide: ZAVASCKI, Teori Albino. Medidas Cautelares e Medidas Antecipatórias: Técnicas Diferentes, Função Constitucional Semelhante. Revista de Processo n. 82, p. 56. Por outro lado, para quem a distinção nunca fez sentido, vide: RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. Tutela de urgência: onde estamos e para onde (talvez) iremos. In: Processo Civil em movimento: diretrizes para o novo CPC. Eduardo Lamy, Pedro Manoel Abreu e Pedro Miranda de Oliveira (coord.). Florianópolis: Conceito Editorial, 2013, pp. 330-340.

2 Neste sentido: NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 8ª ed. Salvador: JusPodvim, 2016, p. 430. Em sentido contrário, entendendo que, por razões de ordem constitucional, o grau de probabilidade exigido para a tutela antecipada cautelar continua sendo menor do que o requerido para a tutela antecipada satisfativa: ASSIS, Carlos Augusto de. Reflexões sobre os novos rumos da tutela de urgência e da evidência no Brasil a partir da Lei 13.105/2015. In: Lucas Buril de Macedo; Ravi Peixoto e Alexandre Freire. (Org.). Novo CPC doutrina selecionada. Procedimentos especiais, tutela provisória e direito transitório. 2ª ed. Salvador: JusPodvim, 2016, p. 58.

3 Aparentemente, apenas os requisitos positivos são os mesmos, já que o perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão, requisito negativo, só se aplica para a tutela antecipada e não para a tutela cautelar, a teor do disposto no art. 300, §3º, in verbis: "§3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão."

4 "Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo."

5 "Art. 308. Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de 30 (trinta) dias, caso em que será apresentado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar, não dependendo do adiantamento de novas custas processuais."

6 No mesmo sentido: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo código de processo civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 511; THEODORO JR., Humberto; ANDRADE, Érico. A autonomização e a estabilização da tutela de urgência no projeto de CPC. Revista de Processo, v. 206/2012, p. 13-59.

7 A problemática acerca da impossibilidade de estabilização em provimentos de natureza não satisfativa também é objeto de debate na doutrina italiana. A respeito, vide: ANDRADE, Érico. A técnica processual da tutela sumária no direito italiano. Revista de Processo, v. 179/2010, p. 175-216.

8 "Art. 250. O mandado que o oficial de justiça tiver de cumprir conterá: V - a cópia da petição inicial, do despacho ou da decisão que deferir tutela provisória;"

9 Tal como no caso da não indicação do prazo para a defesa (AgRg no REsp. 1.470.216/GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. em 23.10.2014), ou da omissão acerca da advertência dos efeitos da revelia que, apesar de não causar a nulidade da citação, impede o reconhecimento da presunção de veracidade dos fatos narrados na inicial (REsp 30.222/PE, Rel. Min. José Dantas, j. em 16.12.1992; REsp 10.137/MG, Rel. Min. Athos Carneiro, j. em 27.06.1991).

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*Anwar Mohamad Ali é membro do Grupo de Tutelas Provisórias do CEAPRO - Centro de Estudos Avançados de Processo.


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