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O custo da morosidade no INPI

É na seara das tecnologias farmacêuticas em que os problemas burocráticos do INPI podem causar um maior dano e tal se dá em virtude de duas características peculiares ao setor.

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Atualizado em 26 de outubro de 2016 07:07

No século XXI a relação entre as novas tecnologias e o consumo massificado foi profundamente alterada. Tal transformação se deu em virtude do aumento do uso do sistema da propriedade industrial, as fricções concorrenciais por contínuas inovações, a intensificação da luta pela clientela e pelo fenômeno da obsolescência (programada ou inesperada em termos de timing). Logo, uma inovadora técnica diferencial poderá remanescer como tal apenas por um período de tempo muito curto.

Por tal razão, esperas demoradas por uma decisão - da autarquia responsável pelos registros e concessões públicas - servem por desestimular agentes econômicos juniores, que carecem de uma resposta mais célere para catalisar ou frear seus investimentos. Um ornamento original, uma marca bem distintiva, um invento ou uma invenção com alto grau de contributo social pela atividade inventiva podem se tornar ultrapassados entre a média do depósito e a efetiva prestação do serviço público.

Contudo, é na seara das tecnologias farmacêuticas em que os problemas burocráticos do INPI podem causar um maior dano e tal se dá em virtude de duas características peculiares ao setor. A primeira delas versa sobre a lentidão em que os efetivos saltos tecnológicos se dão, eis que a maioria das contribuições inovadoras são meramente incrementais. Ou seja, um medicamento - em sua essência, o princípio ativo - continua sendo receitado por uma razoável duração.

A segunda delas lida com um polêmico dispositivo da lei de Propriedade Industrial que se torna aplicável quando o INPI ultrapassa metade do tempo de duração do direito de exclusividade, sem que uma decisão final tenha sido atingida. O dispositivo é o § único do art. 40 da lei 9.279/96 e, em síntese, resulta no retardo do termo final da proteção. Cada dia de atraso na vigência de uma patente na área da saúde significa que naquele medicamento não haverá concorrência, e, com um monopólio fático importa numa artificial manutenção de um preço a maior.

No caso dos Poderes Públicos, os maiores compradores de remédios no país, à mora (do INPI e, consequentemente, do domínio público da tecnologia) impede a realização de licitações - corroendo o dinheiro dos contribuintes, e limitando os investimentos quantitativos e qualitativos do SUS. O problema é exacerbado para os combalidos cofres públicos quando a própria Corte Suprema está às vésperas de decidir sobre a obrigação dos entes federativos em fornecerem medicamentos de altíssimo preço. A matemática é simples: valor de monopólio combinado com remédio caríssimo resulta na constatação de que muitos necessitados não receberão o tratamento imperativo.

Há duas soluções possíveis para os efeitos prejudiciais advindos do déficit estrutural e pessoal do INPI: a inaugural versa sobre o questionamento judicial pelo Ministério Público da União sobre a constitucionalidade do dispositivo que resulta no atraso à possibilidade de concorrência. Entre tantos argumentos dispendidos na ADI5529, ganha ênfase o incontestável fato de que os agentes econômicos rivais e os consumidores finais não podem "pagar" pela demora de um órgão público. A derradeira solução (e que será acelerada a depender do resultado da primeira) passa pela superação de uma negligência histórica quanto a uma política pública includente, de investimentos maciços em planos de carreira, e na percepção que as estratégias estatais do ambiente industrial/comercial/tecnológico têm no fortalecimento do INPI uma premissa inderrogável.

A severa crise do momento não permite que os Administradores Públicos persistam numa omissão histórica quanto a uma fundamental Pessoa Jurídica de Direito Público que tanto pode afetar a sociedade brasileira. O "produto" das escolhas das últimas décadas trouxe uma "conta" orçamentária e de saúde pública que já não se pode continuar pagando: o custo é alto demais.
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*Pedro Marcos Nunes Barbosa é professor doutor na faculdade de Direito da PUC-Rio e sócio do escritório Denis Borges Barbosa Advogados.

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