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Reforma trabalhista - extensão e limites do negociado sobre o legislado

Resta claro que um dos objetivos da reforma trabalhista trazida pela lei 13.467/17 foi o de valorizar o princípio da autonomia privada coletiva, visando permitir que as partes consigam estipular, mediante processo negocial, as normas que regerão as suas próprias vidas.

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Atualizado às 13:43

I - Introdução

Originária do projeto de lei 6787/16, que foi apresentado pelo Poder Executivo em 23 de dezembro de 2016 ao Congresso Nacional, a reforma trabalhista, esperada por alguns setores da sociedade brasileira , notadamente os setores empresariais, virou realidade através da sua transformação na lei 13.467/17, de 14 de junho de 2017, parcialmente alterada pela medida provisória 808, de 14 de novembro de 2017.

Diante dos profundos impactos que a lei 13.467/17 trouxe às relações de trabalho, foi estabelecido um período de vacância de 120 dias, de tal forma que as alterações introduzidas pela reforma trabalhista somente teve a vigência iniciada em 11 de novembro de 2017.

Apesar de trazer importantes mudanças no campo do direito individual do trabalho, a reforma trabalhista, desde a justificativa do PL 6787/16 feita pelo Ministro do Trabalho ao Presidente da República, teve como mote principal a necessidade de ''aprimorar as relações do trabalho no Brasil, por meio da valorização da negociação coletiva entre trabalhadores e empregadores''1 , conferindo um marco legal claro quanto aos limites da autonomia da norma coletiva de trabalho e, assim, encerrar a insegurança jurídica atualmente existe.

É justamente neste ponto que se insere o objetivo do presente artigo jurídico. Discutir, sem a pretensão de trazer verdades absolutas ou esgotar o debate, qual é a extensão e os limites desta autonomia da norma coletiva de trabalho.

II - Da ordem constitucional. Entendimento atual do Tribunal Superior do Trabalho quanto aos limites da negociação coletiva de trabalho

Antes de se expor as alterações trazidas pela reforma trabalhista no tocante à autonomia privada coletiva, cumpre mencionar que a Constituição Federal de 1988, no art. 7º, inciso XVII, forneceu um importante passo na valorização desta vontade coletiva, ao prever, como um direito social dos trabalhadores urbanos e rurais, o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho.

Conforme decidiu o Supremo Tribunal Federal no julgamento do recurso extraordinário 590.415, a justificativa do referido dispositivo constitucional se deve ao fato de que o ''reconhecimento dos acordos e convenções coletivas permite que os trabalhadores contribuam para a formulação das normas que regerão a sua própria vida.''

Nesse passo, o Tribunal Superior do Trabalho, ao interpretar o referido dispositivo constitucional e, considerando os princípios que regem o direito do trabalho, especialmente o princípio da proteção, limitou a extensão daquilo que pode ser negociado coletivamente.

Como exemplo, o TST possui diversos precedentes no sentido de que a negociação coletiva não pode representar um vilipêndio a direitos indisponíveis dos trabalhadores:

''AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA - ACORDO COLETIVO - LIMITES À NEGOCIAÇÃO COLETIVA. A Constituição Federal de 1988, em seu art. 7º, XXVI, ao permitir que as categorias profissionais e econômicas disciplinem as relações por ela travadas, não o fez de maneira a possibilitar o vilipêndio a direitos indisponíveis dos trabalhadores. Dessa forma, o negociado somente se afigurará passível de se sobrepor ao legislado, naquelas situações em que ausente a afronta aos aludidos direitos, o que não ocorre nos casos em que desrespeita normas inerentes à saúde do trabalhador, como é o caso da duração diária da jornada do trabalho.

Agravo de instrumento desprovido.'' 2

Válido, sobre essa questão, trazer as lições da doutrina de Maurício Godinho Delgado (2008, p.160):

''Há limites objetivos à adequação setorial negociada; limites jurídicos objetivos à criatividade jurídica da negociação coletiva trabalhista.

Desse modo, ela não prevalece se concretizada mediante ato estrito de renúncia (e não transação). É que ao processo negocial coletivo falece poderes de renúncia sobre direito de terceiros, (isto é, despojamento unilateral sem contrapartida do agente adverso). Cabe-lhe, essencialmente, promover transação (ou seja, despojamento bilateral ou multilateral, com reciprocidade entre os agentes envolvidos), hábil a gerar normas jurídicas.

Também não prevalece a adequação setorial negociada se concernente a diretos revestidos de indisponibilidade absoluta (e não indisponibilidade relativa), os quais não podem ser transacionados nem mesmo por uma negociação sindical coletiva. Tais parcelas são imantadas por uma tutela de interesse público, por constituírem um patamar mínimo civilizatório que a sociedade democrática não concebe ver reduzido em qualquer segmento econômico-profissional, sob pena de se afrontarem a própria dignidade da pessoa humana e valorização mínima deferível ao trabalho (art.1º, III e art. 170, caput, CF/88). Expressam, ilustrativamente, essas parcelas de indisponibilidade absoluta a anotação na CTPS, o pagamento de salário mínimo, as normas de medicina e segurança do trabalho."

Ocorre que, na visão do legislador reformista, o posicionamento do TST gera um ambiente de incerteza jurídica quanto aquilo que foi ou o que pode ser negociado, fato que impede ou dificulta o desenvolvimento das atividades econômicas, além de gerar um passivo perante os Tribunais Trabalhistas a respeito da interpretação de cláusulas existentes em acordos coletivos ou convenções coletivas de trabalho.''

II.1 - Da extensão e limites da negociação coletiva no cenário após reforma trabalhista

Visando enfrentar este cenário de insegurança jurídica, a lei 13.467/17 introduziu os artigos 611-A e 611-B na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

O art. 611-A da CLT visa elencar, em rol meramente exemplificativo, como se observa pela expressão ''entre outros'', as matérias que podem ser objetos de flexibilização, sendo que eventual negociação desses direitos prevalecerá sobre o disposto em legislação.

Observe-se, pois, o novel dispositivo legal:

''Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:

I - pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais;

II - banco de horas anual;

III - intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superiores a seis horas;

IV - adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE), de que trata a lei 13.189, de 19 de novembro de 2015;

V - plano de cargos, salários e funções compatíveis com a condição pessoal do empregado, bem como identificação dos cargos que se enquadram como funções de confiança;

VI - regulamento empresarial;

VII - representante dos trabalhadores no local de trabalho;

VIII - teletrabalho, regime de sobreaviso, e trabalho intermitente;

IX - remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado, e remuneração por desempenho individual;

X - modalidade de registro de jornada de trabalho;

XI - troca do dia de feriado;

XII - enquadramento do grau de insalubridade;

XIII - prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho;

XIV - prêmios de incentivo em bens ou serviços, eventualmente concedidos em programas de incentivo;

XV - participação nos lucros ou resultados da empresa.

§ 1º No exame da convenção coletiva ou do acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho observará o disposto no § 3º do art. 8º desta Consolidação.

§ 2º A inexistência de expressa indicação de contrapartidas recíprocas em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho não ensejará sua nulidade por não caracterizar um vício do negócio jurídico.

§ 3º Se for pactuada cláusula que reduza o salário ou a jornada, a convenção coletiva ou o acordo coletivo de trabalho deverão prever a proteção dos empregados contra dispensa imotivada durante o prazo de vigência do instrumento coletivo.

§ 4º Na hipótese de procedência de ação anulatória de cláusula de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, quando houver a cláusula compensatória, esta deverá ser igualmente anulada, sem repetição do indébito.

§ 5º Os sindicatos subscritores de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho deverão participar, como litisconsortes necessários, em ação individual ou coletiva, que tenha como objeto a anulação de cláusulas desses instrumentos. ''

Conforme explica Vólia Bomfim Cassar (2017, p. 76), ''a norma não teve como objetivo ampliar direitos, pois isso sempre foi possível,'' transformando a ''maioria dos direitos contidos na CLT , que não se encontram na Constituição Federal, em direitos disponíveis.''

Portanto, é possível que a prevalência do negociado sobre o legislado nos itens arrolados no art. 611-A da CLT, ou em outras matérias, possa reduzir ou suprimir os direitos se forem feitas negociações com sindicatos não representativos perante a base ou em cenários econômicos adversos.

Além disso, a lei 13.467/17 limita a análise do Judiciário Trabalhista exclusivamente quanto à conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, na forma prevista no Código Civil3 , balizando sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva.

Pedro Mahin (2017) defende que o ''propósito da alteração legislativa é evidente: restringir ao máximo o exercício do controle de legalidade e de constitucionalidade de convenções coletivas e acordos coletivos de trabalho pela Justiça do Trabalho.''

Em razão deste objetivo, o Direito do Trabalho, construído com base na hipossuficiência do trabalhador e de nítido aspecto social adotará regra de interpretação mais rigorosa do que o Direito Civil, sedimentado sob a ótica individualista, que consagra atualmente os princípios da função social dos contratos, da boa-fé objetiva nas relações contratuais.

Ocorre que o princípio é regra que nasce pela observação da realidade social. Como ensina Maurício Godinho Delgado, o ''princípio traduz, de maneira geral, a noção de proposições fundamentais que se formam na consciência das pessoas e grupos sociais, a partir de certa realidade, e que, após formadas, direcionam-se à compreensão, reprodução ou recriação dessa realidade.'' (2011, P. 180).

No caso em questão, o princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva é criado por força de lei, sem que tenha um substrato sólido construído no campo da sociedade. Por isso, Homero Batista Mateus da Silva (2017, P.114) comenta que, se o referido princípio for muito forçado, poderá cair em descrédito, ressaltando o interesse em ver o desdobramento deste cenário, isso é, se a Justiça do Trabalho, após a vigência da reforma trabalhista, deixará de analisar as normas coletivas, ao fundamento de que está vinculada ao princípio da mínima intervenção na autonomia da vontade coletiva.

Nesse caminhar, possível que este dispositivo que limita a análise dos acordos coletivos e convenções coletivas de trabalho tenha a constitucionalidade questionada, face ao disposto no art. 5º, inciso XXXV da Constituição Federal de 1988, que trata do princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário.

Outro aspecto que merece destaque imediato consiste no fato de que, atualmente, parte da jurisprudência trabalhista entende que não pode ser estabelecida uma negociação coletiva com atos de mera renúncia, devendo haver uma típica transação, com concessões recíprocas.

''RECURSO DE REVISTA. PRINCÍPIO DA AUTONOMIA PRIVADA COLETIVA. PETROBRAS. PARCELA "ATS". CONGELAMENTO. ACORDO COLETIVO. OPÇÃO INDIVIDUAL. CONCESSÕES RECÍPROCAS. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL. VALIDADE

1. O princípio da autonomia privada coletiva, consagrado no art. 7º, XXVI, da Constituição Federal, autoriza que os próprios interlocutores sociais criem normas, mediante concessões recíprocas, inclusive com a possibilidade de eventual supressão de direitos patrimoniais disponíveis dos empregados, em prol de algum outro benefício.

2. Plenamente válido o acordo coletivo de trabalho que autoriza o congelamento da parcela "adicional de tempo de serviço - ATS", mediante opção individual do empregado da PETROBRAS, com o recebimento, em contrapartida, de indenização razoável e proporcional ao direito patrimonial transacionado. Precedentes.

3. Recurso de revista dos Reclamantes conhecido, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, não provido.'' 4

''RECURSO DE REVISTA. HORAS IN ITINERE. LIMITAÇÃO. ACORDO COLETIVO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. INVALIDADE DA CLÁUSULA DO ACORDO COLETIVO. EMPREGADO QUE DESPENDIA TRÊS HORAS DIÁRIAS NO TRAJETO E O ACORDO COLETIVO REMUNERAVA APENAS QUINZE HORAS MENSAIS. Esta e. Corte tem entendido que deve prevalecer o acordo coletivo celebrado pela entidade sindical representativa da categoria dos trabalhadores, tendo por base a livre estipulação entre as partes, desde que respeitados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, visando à efetividade do valor social do trabalho, insculpido no artigo 1º , IV , da Constituição Federal . Assim, é certo que seria intolerável a simples supressão ou renúncia de direitos, conforme aqui se verifica, pois na hipótese em exame, o empregado despendia 3 horas diárias no trajeto e o acordo coletivo remunerava apenas 15 horas mensais, ou seja, remunerava apenas 25% (vinte e cinco por cento) do tempo efetivamente gasto, fato que conduz à conclusão de que não foram respeitados os parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade estabelecidos por esta c. Corte em 50% (cinquenta por cento), no mínimo, do tempo efetivamente gasto. Não se trata de mera limitação do direito às horas in itinere, mas de sua quase supressão. Precedentes. Recurso de revista não conhecido.'' 5

Contudo, a lei 13.467/17 alterou o referido posicionamento, ao prever no art. 611-A, §2º, que não será necessário o estabelecimento de contrapartidas nos referidos instrumentos coletivos, por não se caracterizar um vício do negócio jurídico.

Em consequência, interpretando de forma estrita a lei 13.467/17, possível que seja firmado, com mais força, o posicionamento jurisprudencial admitindo a celebração de acordos coletivos ou convenções coletivas de trabalho que importem em atos de mera renúncia por uma das partes.

Entretanto, vale observar que, de acordo com o novel §3º do art. 611-A, haverá uma contrapartida obrigatória, que é a proteção contra a dispensa imotivada durante o prazo de vigência do referido instrumento coletivo quando for prevista a redução de jornada ou salário.

Ao lado de dispor, em rol exemplificativo, os direitos que podem ser flexibilizados em acordos coletivos e convenções coletivas de trabalho, os quais terão prevalência sobre o legislado, a reforma trabalhista trouxe, no art. 611-B da CLT e, pela interpretação literal, de forma taxativa, uma série de direitos cuja supressão ou redução em acordo coletivo ou convenção coletiva de trabalho consistirá em na ilicitude do objeto.

Tais direitos elencados no art. 611-B da CLT, em grande parte, estão atrelados às garantias previstas na Constituição Federal de 1988, conforme colacionado abaixo:

''Art. 611-B. Constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos:

I - normas de identificação profissional, inclusive as anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social;

II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;

III - valor dos depósitos mensais e da indenização rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS);

IV - salário mínimo;

V - valor nominal do décimo terceiro salário;

VI - remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;

VII - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;

VIII - salário-família;

IX - repouso semanal remunerado;

X - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% (cinquenta por cento) à do normal;

XI - número de dias de férias devidas ao empregado;

XII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;

XIII - licença-maternidade com a duração mínima de cento e vinte dias;

XIV - licença-paternidade nos termos fixados em lei;

XV - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei;

XVI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei;

XVII - normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho;

XVIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas;

XIX - aposentadoria;

XX - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador;

XXI - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;

XXII - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência;

XXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;

XXIV - medidas de proteção legal de crianças e adolescentes;

XXV - igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso;

XXVI - liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho;

XXVII - direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender;

XXVIII - definição legal sobre os serviços ou atividades essenciais e disposições legais sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade em caso de greve;

XXIX - tributos e outros créditos de terceiros;

XXX - as disposições previstas nos arts. 373-A, 390, 392, 392-A, 394, 394-A, 395, 396 e 400 desta Consolidação.

Parágrafo único. Regras sobre duração do trabalho e intervalos não são consideradas como normas de saúde, higiene e segurança do trabalho para os fins do disposto neste artigo."

Desta forma, o artigo 611-B, caput, aponta as matérias cuja negociação coletiva não pode dispor, por constituir ''objeto ilícito'' e, consequentemente, considerar nula a convenção e o acordo coletivo que vise reduzir ou suprimir os direitos dispostos no referido dispositivo.

Conforme exposto pela Vólia Bonfim Cassar (2017. P. 82), ''é claro que a norma não é taxativa, mas sim restritiva, pois esqueceu de impedir que a negociação coletiva viole, por exemplo, direitos da personalidade e liberdades garantidas pela Constituição.''

Assim, apesar da expressão ''exclusivamente'' contida no caput do art. 611-B da CLT, a citada autora entende que ''por óbvio que há outros vícios capazes de anular a norma coletiva ou uma cláusula contida no instrumento coletivo''.

Sendo assim, também se mostra possível que a constitucionalidade deste dispositivo seja questionada, via controle difuso ou concentrado de constitucionalidade, tanto pelo princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário, como pela violação de outros dispositivos constitucionais, a depender do caso concreto.

III - Conclusão

Diante do que foi exposto neste artigo jurídico, resta claro que um dos objetivos da reforma trabalhista trazida pela lei 13.467/17 foi o de valorizar o princípio da autonomia privada coletiva, visando permitir que as partes consigam estipular, mediante processo negocial, as normas que regerão as suas próprias vidas.

Além disso, existe a nítida preocupação de conferir maior segurança nas relações jurídicas coletiva, ao se tentar conferir contornos mais precisos dos direitos que podem ou não ser objeto de negociação coletiva de trabalho, a fim de evitar o passivo judicial existente e favorecer o desenvolvimento das relações econômicas.

No entanto, em que pese o propósito do legislador acima mencionado, cabe mencionar que a lei 13.467/17, nessa seara, pode apresentar conflitos com a Constituição Federal de 1988, especialmente no que se refere ao princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário previsto no art. 5º, inciso XXXV do texto constitucional.

Assim, considerando se tratar de lei nova, considerando as notórias tensões e divergências que existem na sociedade e no meio jurídico a respeito da reforma trabalhista, ainda não se pode precisar como tais disposições serão interpretadas pelo Judiciário, especialmente pelo Tribunal Superior do Trabalho ao firmar a sua jurisprudência.

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1 Trecho da justificativa elaborada pelo Ministro do Trabalho ao Presidente da República na apresentação do PL 6787/16.
2 Agravo de Instrumento em Recurso de Revista AIRR - 77140-17.2005.5.01.0056, Órgão Julgador: 1ª Turma; Publicação: 07/08/2009; Relator: Ministro Vieira de Mello Filho.
3 Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
I - agente capaz;
II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III - forma prescrita ou não defesa em lei.
4 Recurso de Revista - RR - n.º PROCESSO Nº TST-RR-443-06.2010.5.09.0654; Órgão Julgador: 4ª Turma; Publicação: 24/03/2017; Relator: Ministro João Orestes Dalazen.
5 Recurso de Revista -RR - n.º 492-02-2010.5.05.0511; Órgão Julgador: 3ª Turma; Publicação: 24/10/2014; Relator: Ministro Alexandre Agra de Souza Belmonte.

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CASSAR, Vólia Bomfim; BORGES, Leonardo Dias. Comentários à Reforma Trabalhista. São Paulo: Método, 2017.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTR, 2011.

DELGADO. Maurício Godinho. Direito Coletivo do Trabalho. São Paulo: LTR, 2008.

Mahin, Pedro. OPINIÃO Com reforma da CLT, vontade coletiva continua submetida à Constituição, 2017. Disponível em: Com reforma da CLT, vontade coletiva continua submetida à Constituição . Acesso em 28/09/17.

SILVA. Homero Batista Mateus da. Comentários à Reforma Trabalhista. Análise da lei 13.467/17 - Artigo por Artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais.

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*Henrique da Silva Louro é advogado.

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