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Lava Jato

Moro divulga grampo de ligação entre Lula e Dilma

Ligação foi feita nesta quarta-feira, 16.

Da Redação

quarta-feira, 16 de março de 2016

Atualizado às 19:28

O juiz Sérgio Moro proferiu despacho (v. abaixo) nesta quarta-feira, 16, no qual derruba o sigilo e divulga grampo de uma ligação telefônica entre a presidente Dilma e o ex-presidente Lula, parte da investigação na Lava Jato. A ligação teria sido feita no mesmo dia.

Além do diálogo com a presidente da República, foram interceptadas conversar com o então ministro-chefe da Casa Civil Jaques Wagner, o senador do RJ Lindbergh Farias, com o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, com o presidente nacional do PT, Rui Falcão, entre outros.

Nas gravações, além de tecer críticas à Justiça, Lula chama o STF e o STJ de "acovardados", fazendo menção no diálogo também ao Congresso brasileiro.

"Nós temos uma Suprema Corte totalmente acovardada, nós temos uma Superior Tribunal de Justiça totalmente acovardado, um Parlamento totalmente acovardado."

"Termo de posse"

O teor da conversa sugere que a presidente e Lula agiram na tentativa de evitar uma prisão do ex-presidente pela PF. Dilma indicou Lula nesta quarta para a Casa Civil. Jaques Wagner, por sua vez, deixa a pasta para assumir a chefia do gabinete da presidente.

Segue o diálogo:

- Dilma: Alô.

- Lula: Alô.

- Dilma: Lula, deixa eu te falar uma coisa.

- Lula: Fala, querida. Ahn.

- Dilma: Seguinte, eu tô mandando o 'Bessias' junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?!

- Lula: Uhum. Tá bom, tá bom.

- Dilma: Só isso, você espera aí que ele tá indo aí.

- Lula: Tá bom, eu tô aqui, fico aguardando.

- Dilma: Tá?!

- Lula: Tá bom.

- Dilma: Tchau.

- Lula: Tchau, querida.

Críticas à OAB

Em uma das conversas interceptada entre Lula e Jaques Wagner, o ex-ministro da Casa Civil critica o Conselho Federal da OAB. A manifestação se refere ao fato de a Ordem ter pedido acesso à íntegra da delação do senador Delcídio do Amaral e afirmado que, caso houvesse provas de que Dilma tentou interferir na Lava Jato, protocolaria novo pedido de impeachment na Câmara.

- Jaques Wagner: E terça-feira o 'filho da puta' da OAB vai botar aqui, dizendo que o Conselho da OAB acha que nesse caso... É uma palhaçada, porque o Delcídio, porra! Que eu não imaginei que era tão canalha! Ele fala de Pasadena, por exemplo, essa porra já foi arquivada pela PGR, fala que você mandou isso, mandou aquilo... porra, tem prova? Vai tomar no cu, eu não sabia que ele era tão escroto! Mas vamos lá...

Atuação no STF

Logo em seguida, na mesma conversa, Lula sugere que Wagner e Dilma atuem junto à ministra do STF Rosa Weber. "Falar o negócio da Rosa Weber, que tá na mão dela pra decidir."

- Lula: Mas viu querido, 'ela' tá falando dessa reunião, ô Wagner eu queria que você visse agora, falar com 'ela', já que 'ela' tá aí, falar o negócio da Rosa Weber, que tá na mão dela pra decidir. Se homem não tem saco, quem sabe uma mulher corajosa possa fazer o que os homens não fizeram.

Foro privilegiado

Lula está no centro dos holofotes desde que se tornou alvo da 24ª fase da Lava Jato, deflagrada no último dia 4. O ex-presidente foi levado a depor na PF em condução coercitiva.

As investigações envolvem indícios de reformas e benfeitorias feitas pela construtora OAS em um tríplex no Guarujá e em um sítio em Atibaia, ocultação de propriedades no nome de terceiros e "pagamentos vultuosos" feitos por construtoras beneficiadas no esquema de corrupção na Petrobras em favor do Instituto Lula e da LILS Palestras.

Com a investigação em curso, há rumores de que a ida do ex-presidente para o ministério se daria exclusivamente para a obtenção do foro privilegiado, o que tiraria o caso da alçada do juiz Federal Sérgio Moro, subindo direto ao STF, nas mãos do ministro Teori.

Este, no entanto, não é um feito automático. A jurisprudência do STF é oscilante em relação ao tema. De acordo com a Corte, cada caso deve ser analisado isoladamente.

__________

Despacho

Trata-se de processo vinculado à assim denominada Operação Lavajato e no qual, a pedido do Ministério Público Federal, foi autorizada a interceptação telefônica do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de associados.

A interceptação foi interrompida.

Juntou a autoridade policial relatórios e áudios nos eventos 109, 111, 116 e 133.

Ouvido, o MPF manifestou-se pelo levantamento do sigilo sobre estes autos e a remessa deles à Procuradoria-Geral da República (evento 123). Decido.

Com a efetivação das buscas e diligências ostensivas da investigação em relação a supostos crimes envolvendo o ex-Presidente (processo 5006617-29.2016.4.04.7000), não há mais necessidade de manutenção do sigilo sobre a presente interceptação telefônica.

Rigorosamente, pelo teor dos diálogos degravados, constata-se que o ex-Presidente já sabia ou pelo menos desconfiava de que estaria sendo interceptado pela Polícia Federal, comprometendo a espontaneidade e a credibilidade de diversos dos diálogos.

Da mesma forma, alguns diálogos sugerem que tinha conhecimento antecipado das buscas efetivadas em 04/03/2016.

Observo que, apesar de existirem diálogos do ex-Presidente com autoridades com foro privilegiado, somente o terminal utilizado pelo ex-Presidente foi interceptado e jamais os das autoridades com foro privilegiado, colhidos fortuitamente.

Rigorosamente, sequer o terminal do ex-Presidente foi interceptado, mas apenas o terminal telefônico utilizado por acessor dele (11XXXXXXXXX), do qual ele fazia uso frequente.

Mantive nos autos os diálogos interceptados de Roberto Teixeira, pois, apesar deste ser advogado, não identifiquei com clareza relação cliente/advogado a ser preservada entre o ex-Presidente e referida pessoa.

Rigorosamente, ele não consta no processo da busca e apreensão 5006617-29.2016.4.04.7000 entre os defensores cadastrados no processo do ex-Presidente. Além disso, como fundamentado na decisão de 24/02/2016 na busca e apreensão (evento 4), há indícios do envolvimento direto de Roberto Teixeira na aquisição do Sítio em Atibaia do ex-Presidente, com aparente utilização de pessoas interpostas. Então ele é investigado e não propriamente advogado. Se o próprio advogado se envolve em práticas ilícitas, o que é objeto da investigação, não há imunidade à investigação ou à interceptação.

Observo que, em alguns diálogos, fala-se, aparentemente, em tentar influenciar ou obter auxílio de autoridades do Ministério Público ou da Magistratura em favor do ex-Presidente. Cumpre aqui ressalvar que não há nenhum indício nos diálogos ou fora deles de que estes citados teriam de fato procedido de forma inapropriada e, em alguns casos, sequer há informação se a intenção em influenciar ou obter intervenção chegou a ser efetivada. Ilustrativamente, há, aparentemente, referência à obtenção de alguma influência de caráter desconhecido junto à Exma. Ministra Rosa Weber do Supremo Tribunal Federal, provalvemente para obtenção de decisão favorável ao ex-Presidente na ACO 2822, mas a eminente Magistrada, além de conhecida por sua extrema honradez e retidão, denegou os pleitos da Defesa do ex-Presidente.

De igual forma, há diálogo que sugere tentativa de se obter alguma intervenção do Exmo. Ministro Ricardo Lewandowski contra imaginária prisão do ex-Presidente, mas sequer o interlocutor logrou obter do referido Magistrado qualquer acesso nesse sentido. Igualmente, a referência ao recém nomeado Ministro da Justiça Eugênio Aragão ("parece nosso amigo") está acompanhada de reclamação de que este não teria prestado qualquer auxílo.

Faço essas referências apenas para deixar claro que as aparentes declarações pelos interlocutores em obter auxílio ou influenciar membro do Ministério Público ou da Magistratura não significa que esses últimos tenham qualquer participação nos ilícitos, o contrário transparecendo dos diálogos. Isso, contudo, não torna menos reprovável a intenção ou as tentativas de solicitação.

Não havendo mais necessidade do sigilo, levanto a medida a fim de propiciar a ampla defesa e publicidade.

Como tenho decidido em todos os casos semelhantes da assim denominada Operação Lavajato, tratando o processo de apuração de possíveis crimes contra a Administração Pública, o interesse público e a previsão constitucional de publicidade dos processos (art. 5º, LX, e art. 93, IX, da Constituição Federal) impedem a imposição da continuidade de sigilo sobre autos. O levantamento propiciará assim não só o exercício da ampla defesa pelos investigados, mas também o saudável escrutínio público sobre a atuação da Administração Pública e da própria Justiça criminal. A democracia em uma sociedade livre exige que os governados saibam o que fazem os governantes, mesmo quando estes buscam agir protegidos pelas sombras.

Isso é ainda mais relevante em um cenário de aparentes tentativas de obstrução à justiça, como reconhecido pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal, ao decretar a prisão cautelar do Senador da República Delcídio do Amaral Gomez, do Partido dos Trabalhadores, e líder do Governo no Senado, quando buscava impedir que o ex-Diretor da Petrobrás Nestor Cuñat Cerveró, preso e condenado por este Juízo, colaborasse com a Justiça, especificamente com o Procurador Geral de Justiça e com o próprio Supremo Tribunal Federal.

Não muda esse quadro o fato da prova ser resultante de interceptação telefônica. Sigilo absoluto sobre esta deve ser mantido em relação a diálogos de conteúdo pessoal inadvertidamente interceptados, preservando-se a intimidade, mas jamais, à luz do art. 5º, LX, e art. 93, IX, da Constituição Federal, sobre diálogos relevantes para investigação de supostos crimes contra a Administração Pública. Nos termos da Constituição, não há qualquer defesa de intimidade ou interesse social que justifiquem a manutenção do segredo em relação a elementos probatórios relacionados à investigação de crimes contra a Administração Pública.

Portanto, levanto o sigilo sobre estes autos. Vincule a Secretaria este processo ao aludido 5006617-29.2016.4.04.7000.

Da mesma forma, levanto o sigilo sobre os inquéritos vinculados ao aludido 5006617-29.2016.4.04.7000.

Concomitantemente, diante da notícia divulgada na presente data de que o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria aceito convite para ocupar o cargo de Ministro Chefe da Casa Civil, deve o feito, com os conexos, ser remetido, após a posse, aparentemente marcada para a próxima terça-feira (dia 22), quando efetivamente adquire o foro privilegiado, ao Egrégio Supremo Tribunal Federal.

Intime-se o MPF para indicar os processos a serem encaminhados.

Curitiba, 16 de março de 2016.

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