CPC na prática

Momento de exigibilidade das "astreintes"

Ao que tudo indica, de fato, as “astreintes” estão perdendo a sua força se somente puderem ser executadas após o trânsito em julgado de decisão favorável à parte.

30/11/2023

O § 3º do art. 537 do CPC estabelece que: "A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte".

Trata-se de uma regra equilibrada, pois a multa coercitiva ("astreinte") pode ser exigida desde o momento em que é fixada, devendo ser depositada em juízo, ao mesmo tempo em que somente poderá ir para as mãos da parte no momento em não couber mais recurso da decisão favorável a esta mesma parte.

O equilíbrio é encontrado pelo dispositivo legal sob comento porque o objetivo da "astreinte" é a coerção. É fazer com que o devedor, ora executado, de uma obrigação saia do estado de inadimplência para evitar ter que pagar a multa. Neste aspecto, ela – a multa – tira o executado da "zona de conforto" e o obriga a desembolsar o valor da multa e depositar em juízo enquanto não cumpre a obrigação objeto do inadimplemento. Por outro lado, ela não deixa o executado desprotegido na hipótese de a decisão que fixou a multa ser reformada nas instâncias superiores, pois o dinheiro permanecerá depositado em juízo até o seu trânsito em julgado.

Entretanto, em decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), nos autos do EARESP n. 1.833.876, a interpretação do § 3º do art. 537 mudou. Em 17.10.22, a Quarta Turma do STJ já havia decidido o seguinte: "(...) Nos termos do disposto pelos artigos 297, parágrafo único, e 537, § 3°, do CPC/15, que estabelecem que a decisão que fixa multa em sede de tutela provisória observará as normas referentes ao cumprimento provisório da sentença, o advento do novo diploma processual civil não alterou a necessidade de confirmação da tutela provisória em sede de sentença como requisito para o cumprimento provisório da multa cominatória, por possuir como pressuposto a existência de sentença impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo, nos termos do disposto no artigo 520 do CPC/15 (...)" (AgInt no AREsp n. 1.883.876/RS, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 17/10/2022, DJe de 20/10/2022, grifos nossos).

A decisão acima referida foi objeto de embargos de declaração e, na sequência, de embargos de divergência que foram julgados em 23.11.23, pela Corte Especial do STJ que, por acórdão não unânime, acabou deixando prevalecer o entendimento de que a decisão que fixa a multa em tutela provisória somente pode ser objeto de cumprimento (execução) após a sua confirmação por sentença favorável transitada em julgado.

Em outras palavras, o executado não mais será retirado da "zona de conforto" no momento em que é fixada a multa cominatória. Ele não deverá depositar tais valores em juízo ou ser compelido a fazê-lo. Ele vai poder aguardar até o trânsito em julgada da decisão favorável ao exequente para sofrer atos executivos sobre seu patrimônio. Isso significa dizer que a multa perderá grande parte da sua força coercitiva e que muitos executados preferirão aguardar a interposição de todos os recursos cabíveis e imagináveis contra a decisão que fixou a multa para somente depois disso decidir o que fazer (cumprir ou não cumprir a obrigação, por exemplo).

É bem verdade que o acórdão em questão ainda não foi publicado e que para não se perder todas as esperanças com a efetividade da execução forçada das obrigações é melhor aguardar que o inteiro teor da decisão seja tornado público pela Corte Especial do STJ. Porém, as informações estão disponíveis até o momento não trazem muita esperança. Ao que tudo indica, de fato, as "astreintes" estão perdendo a sua força se somente puderem ser executadas após o trânsito em julgado de decisão favorável à parte.

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Colunistas

André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto tem pós-doutorado em Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2015). Pós Doutorado em Democracia e Direitos Humanos, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae (2019). Pós Doutorado em Direitos Sociais, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca (2022). Pesquisador visitante no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil (2023). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial pela FGV (2012). Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). Pós Graduação Executiva nos Programas de Negociação (2013) e de Mediação (2015) da Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014), nos cursos de Especialização do CEU-Law (desde 2016) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (destacando-se a EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae, UCDB, e USP-AASP). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil: Teams. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP, Pinheiros (desde 2013). Presidente da Comissão de Energia do IASP (desde 2013). Vice Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2019). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor nas gestões de 2013/2023. Conselheiro curador da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do CBar e da FALP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do Conselho Federal da OAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021) e Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).