O Legal Design surgiu como uma resposta à necessidade urgente de tornar o Direito mais acessível, compreensível e centrado nas pessoas. Sua estruturação teórica ganhou corpo com os estudos conduzidos por Margaret Hagan, fundadora do Legal Design Lab da Universidade de Stanford, há cerca de 15 anos. Ao propor a interseção entre design thinking, tecnologia e Direito, Hagan abriu caminho para uma nova forma de pensar a experiência jurídica, centrada no usuário final dos serviços legais.
No Brasil, embora os primeiros ecos da abordagem tenham surgido de forma pontual no início da década de 2010, foi apenas a partir de 2019 que o termo "Legal Design" passou a ganhar visibilidade mais ampla no mercado jurídico. Eventos, cursos, startups e escritórios passaram a explorar o conceito como parte de um movimento de inovação e transformação digital.
O Legal Design deixou de ser uma teoria restrita ao meio acadêmico para se tornar um componente estratégico de escritórios, departamentos jurídicos e órgãos públicos. Essa transição se consolidou em três frentes principais:
- Academia: A produção teórica cresceu, com destaque para a obra Law by Design (2016), de Margaret Hagan, e teses brasileiras explorando temas como linguagem simples, design de documentos e experiência do usuário.
- Mercado privado: Escritórios passaram a aplicar o Legal Design na elaboração de petições e relatórios visuais.
- Setor público: Tribunais e defensorias começaram a investir em projetos de visual law e linguagem simples, com destaque para o TRT-12 (SC)1 e o TRF-3 (SP-MS)2.
Eventos como o Legal Design Summit Brasil (2021)3 e iniciativas como o Justiça Simples do CNJ4 fortaleceram o movimento, promovendo debates e consolidando metodologias.
Apesar do avanço, o caminho não foi livre de tropeços. Um dos principais erros foi a confusão entre Legal Design e design gráfico. Muitos profissionais passaram a tratar a questão como mera estetização de documentos, esquecendo a essência funcional da proposta: tornar o Direito mais claro e centrado no usuário.
Outro desafio recorrente é a resistência cultural. Muitos juristas ainda veem com desconfiança qualquer abordagem que simplifique a linguagem ou altere a tradição formal dos documentos jurídicos. A falta de formação específica também contribui para projetos mal executados ou com pouca efetividade.
A ausência de uma metodologia clara também foi um entrave nos primeiros anos de adoção do Legal Design. Iniciativas surgiram sem um ciclo de escuta, prototipagem e validação, o que prejudicou a mensuração de resultados.
Em 2024, o Legal Design vive um momento de maior maturidade. Cada vez mais, vemos a aplicação consciente e estruturada da metodologia em frentes como:
- Petições com visual law e linguagem simples
- Contratos em formato de infográfico ou narrativas visuais
- Fluxos de atendimento jurídico mais claros e orientados por jornada do usuário
Casos como os da Defensoria Pública de Minas Gerais, que reformulou seus termos de atendimento com base em Legal Design, e da startup Tikal Tech, que oferece soluções automatizadas com design centrado no usuário, são bons exemplos de aplicação concreta.
Estudos recentes indicam que o Legal Design tem gerado impactos reais:
- Segundo levantamento da AB2L (2023)5, 68% dos escritórios que adotaram ferramentas de visual law relataram redução no retrabalho e maior satisfação do cliente.
- Pesquisa interna do TRF-3 (2022)6 demonstrou que petições com linguagem simples e elementos visuais são compreendidas em até 40% menos tempo pelos servidores.
- Benefícios da linguagem clara para os usuários e para o próprio governo, que aumentará a eficiência e eficácia de seus serviços, ao proporcionar a acessibilidade às informações contidas em seus serviços on-line no tocante à inteligibilidade. Segundo a pesquisa Inaf Brasil 2009, 54% dos cidadãos brasileiros entre 15 e 64 anos são considerados analfabetos funcionais. Destes, 10% são analfabetos absolutos. Assim, torna-se urgente que o governo produza sua informação e seus serviços on-line de modo fácil de serem usados, a fim de atingir essa faixa da população7.
Em 15 anos, o Legal Design deixou de ser um experimento conceitual para se tornar uma ferramenta concreta de melhoria na entrega da justiça. Os erros cometidos serviram de aprendizado e ajudaram a moldar um movimento mais maduro, com foco em resultados reais.
Mais do que um diferencial, o Legal Design é hoje uma competência essencial para o profissional jurídico que deseja acompanhar a evolução do Direito como serviço.
Seu uso estratégico, consciente e orientado por método pode transformar a relação entre juristas e sociedade, promovendo acesso à justiça, eficiência e inovação com propósito.
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1 O Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12) de Santa Catarina desenvolve o projeto "Visual Law: Direito Visual no TRT-12", voltado para o uso de elementos visuais e linguagem simples em decisões e peças judiciais. Informações disponíveis em: https://www.trt12.jus.br/. (TRT-12 (Santa Catarina): O Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região promoveu eventos e cursos sobre Visual Law, como o 3º módulo de 2021 da Escola Judicial, abordando o uso de elementos visuais em decisões judiciais.) https://portal.trt12.jus.br/sites/default/files/2021-08/Material%20Visual%20Law.pdf
2 O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) que abrange São Paulo e Mato Grosso do Sul, implantou o projeto "Justiça Simples e Visual Law", promovendo clareza e acessibilidade das informações jurídicas. Mais informações em: https://www.trf3.jus.br/. (https://web.trf3.jus.br/atos-normativos/atos-normativos-dir/Presid%C3%AAncia/Resolu%C3%A7%C3%B5es/2021/Resolu%C3%A7%C3%A3o0465.htm?utm_source=chatgpt.com)
3 O Legal Design Summit Brasil é um evento anual que reúne especialistas para discutir tendências e metodologias em Legal Design. Mais informações em: https://legaldesignsummit.com/
4 "Justiça Simples" é uma iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) focada na simplificação da linguagem jurídica e no uso de elementos visuais para promover acessibilidade. Detalhes em: https://www.cnj.jus.br/. https://www.cnj.jus.br/gestao-da-justica/acessibilidade-e-inclusao/pacto-nacional-do-judiciario-pela-linguagem-simples/
5 Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs (AB2L) conduz estudos periódicos sobre o impacto das tecnologias jurídicas. Mais informações em: https://ab2l.org.br/.
6 Dados de pesquisa interna divulgados pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) sobre eficácia das práticas de visual law. https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2025/03/pnudcnj-relatorio-pessoa-com-deficiencia-13032025.pdf
7 https://revista.ibict.br/inclusao/article/view/1644