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Como é feito o juízo de admissibilidade de uma demanda?

O artigo explica como o juiz avalia se uma demanda está formalmente apta a prosseguir, destacando os requisitos legais da petição inicial e as consequências do não cumprimento dessas exigências.

12/5/2025

Antes de analisar o mérito da causa, o juiz deve verificar se o processo está formalmente apto, o que se denomina juízo de admissibilidade (art. 485 do CPC), em contraposição ao juízo de mérito (art. 487 do CPC).

A aptidão da demanda exige que se respeitem os pressupostos processuais e as condições da ação, como regularidade formal, legitimidade das partes e interesse de agir. 

A doutrina moderna reforça a divisão entre questões de admissibilidade e questões de mérito, sendo esta uma abordagem mais lógica e didática.

Em breve síntese, a petição inicial deve atender aos requisitos legais (art. 319 do CPC). Quando apresentar vícios sanáveis, o juiz deve intimar o autor para emendá-la no prazo de 15 dias (art. 321), especificando com clareza os defeitos, conforme os deveres de fundamentação (art. 489, §1º) e cooperação (art. 6º).

A inércia do autor, quando intimado para emendar, resulta no indeferimento da petição inicial, sem julgamento do mérito (arts. 330 e 485, I).

Mesmo após a citação do réu, vícios formais que não alterem a causa de pedir ou o pedido podem ser corrigidos, desde que respeitado o contraditório (art. 317). 

Contudo, se a emenda for inviável nesse estágio, o processo será extinto sem resolução de mérito.

A decisão que determina a emenda é interlocutória (art. 203, §2º), mas não é recorrível por agravo de instrumento (art. 1.015), devendo o autor aguardar a sentença e impugnar em preliminar de apelação (art. 1.009, §1º).

Não sendo o caso de emenda, devemos tecer breves comentários sobre o indeferimento da petição inicial (art. 485, I).

Em linhas gerais, é cabível o indeferimento da petição inicial quando:

O recurso cabível contra o indeferimento integral é apelação (art. 1.009). 

Se parcial, cabe agravo de instrumento (art. 354, parágrafo único), lembrando que o juiz pode se retratar após a interposição da apelação (art. 485, §7º).

Mesmo sem coisa julgada material, nova ação só será admitida se corrigido o vício apontado (art. 486, §1º).

Visando à celeridade processual (art. 5º, LXXVIII, CF), o art. 332 do CPC permite ao juiz julgar improcedente o pedido antes da citação, se contrário à súmula ou precedente vinculante (art. 927), ou presente a prescrição ou decadência legal.

Essa forma de julgamento excepcional só é possível quando há jurisprudência consolidada ou quando a matéria é de ordem pública, como prescrição. 

Mesmo nesses casos, deve-se observar o contraditório (art. 10 do CPC), de modo que o autor deve ser intimado para se manifestar se não tiver enfrentado o precedente na inicial, sob pena de vício da decisão.

Não se admite improcedência liminar por impossibilidade jurídica do pedido sem amparo em precedente qualificado.

Se a decisão liminar de improcedência atingir todos os pedidos, o recurso cabível será a apelação, por se tratar de sentença (art. 203, §1º, do CPC). Nesse caso, o juiz poderá exercer juízo de retratação em cinco dias (arts. 331, caput, e 485, §7º). 

Caso não haja retratação, será realizada a citação do réu para apresentar contrarrazões, ainda que ele não tenha sido previamente integrado à relação processual (art. 238 do CPC).

Se a improcedência liminar recair apenas sobre parte dos pedidos, tratar-se-á de decisão interlocutória recorrível por agravo de instrumento (arts. 356, §5º, e 1.015, II do CPC).

Caso a apelação seja provida, o processo retorna ao juízo de origem para continuidade, iniciando-se o prazo para contestação pelo réu a partir da intimação do retorno dos autos, seguindo analogia ao art. 331, §2º do CPC.

No tocante aos honorários sucumbenciais, se o réu apresentou contrarrazões e a apelação for desprovida, o autor poderá ser condenado em honorários, mesmo sem condenação recursal específica (art. 85, §11), pois trata-se de fixação originária, não recursal.

Se não for interposto recurso, a sentença de improcedência transita em julgado, e o réu será apenas intimado, e não citado, para ciência da extinção da demanda. 

Essa sentença forma coisa julgada material, obstando o ajuizamento de nova ação sem a correção do vício.

Ocorrendo o juízo positivo de admissibilidade, e não sendo o caso de indeferimento da inicial (arts. 330 e 485), ou improcedência liminar (art. 332), o processo seguirá o procedimento comum (art. 318), com a citação do réu (art. 238).

Esse juízo positivo é implícito na decisão que determina a citação, significando que o juiz entendeu que a petição inicial está formalmente apta e não há óbice para o prosseguimento da demanda.

No entanto, essa decisão não impede que o réu apresente as matérias de admissibilidade em sua contestação (arts. 336 e 337). Isso porque não há decisão formal e expressa sobre as matérias de admissibilidade. Ademais, o contraditório do réu ainda não foi estabelecido.

Mesmo que o juiz tenha afastado expressamente alguma tese (como ilegitimidade ou prescrição), o réu poderá reiterar a questão na contestação, pois não contribuiu com eventual inércia que geraria preclusão.

A decisão que determina a citação, por não encerrar fase nem causar gravame imediato, não é recorrível por agravo de instrumento, pois não se encontra listada no rol do art. 1.015 do CPC.

Em síntese, é desse modo que é realizado o juízo de admissibilidade de uma demanda.

Manasses Lopes
Advogado e professor universitário. Especialista em Direito Processual Civil pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), em Brasília.

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