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Uma análise crítica das 17 novas teses vinculantes do TST

Análise das recentes teses vinculantes do TST, seus impactos nas relações de trabalho e o equilíbrio entre segurança jurídica e evolução interpretativa.

22/5/2025

A evolução da sistemática dos precedentes no ordenamento jurídico brasileiro

O direito brasileiro, tradicionalmente filiado à família romano-germânica, vem experimentando uma interessante evolução quanto à força normativa dos precedentes judiciais. Esta transformação não representa mera cópia do sistema anglo-saxão, mas sim uma adaptação sensível à realidade nacional, buscando a concretização de valores constitucionais essenciais, com destaque para a segurança jurídica e a isonomia.

A emenda constitucional 45/04 iniciou este movimento ao estabelecer as súmulas vinculantes do STF. Posteriormente, o CPC de 2015 ampliou significativamente o alcance desta sistemática, estendendo-a para além do controle de constitucionalidade e incorporando várias categorias de precedentes obrigatórios, como aqueles decorrentes de recursos repetitivos.

Na esfera trabalhista, a lei 13.015/14 já havia introduzido o procedimento de recursos de revista repetitivos, inaugurando uma nova fase na prestação jurisdicional da Justiça do Trabalho. Este movimento ganhou força com a recente fixação, pelo pleno do TST, de 17 novas teses jurídicas de caráter vinculante em maio de 2025, por meio do procedimento de reafirmação de jurisprudência.

O TST como corte de precedentes: uma nova etapa na consolidação institucional

A evolução institucional do TST reflete um movimento consciente em direção à consolidação do que o ministro Aloysio Corrêa da Veiga, atual presidente da Corte, tem chamado de “Tribunal de precedentes, e não de vértice”. Esta postura, reafirmada nas recentes sessões do tribunal pleno, sinaliza uma mudança de paradigma na compreensão do papel institucional do TST.

Não estamos diante de uma transformação meramente formal, mas de uma verdadeira reconfiguração do modo como a Corte interpreta sua missão constitucional. Por muito tempo, o TST atuou primordialmente como instância revisional, dedicando-se ao exame casuístico de milhares de recursos. Este modelo, embora alinhado a uma certa tradição processual brasileira, revelou-se insustentável diante do volume crescente de demandas.

A sistemática agora fortalecida pelo TST, materializada na fixação das 17 novas teses vinculantes em maio de 2025, representa a consolidação de um novo modelo: o Tribunal passa a atuar preferencialmente como órgão de uniformização jurisprudencial, estabelecendo parâmetros decisórios que devem ser obrigatoriamente observados pelas instâncias inferiores.

Destaca-se que as 17 teses recém-aprovadas resultam do procedimento de reafirmação de jurisprudência, aplicado a matérias que já estavam pacificadas no âmbito das Turmas e da SDI-1 - Subseção I Especializada em Dissídios Individuais. Este mecanismo, que simplifica a conversão de jurisprudência consolidada em precedentes vinculantes, demonstra o compromisso do TST com a eficiência processual e a segurança jurídica.

As 17 novas teses vinculantes: texto integral e análise jurídica

As teses recentemente fixadas pelo TST abrangem temas diversos e de grande relevância para as relações de trabalho. Analisaremos cada uma delas em seu texto integral, seguido de breves comentários jurídicos:

1. Empregado admitido por empresa estatal. Dispensa imotivada posterior à privatização. Validade.

Tese: “É válida a dispensa imotivada de empregado admitido anteriormente à privatização, ainda que norma interna preexistente à sucessão estabeleça procedimentos e vedações ao desligamento.” (RR 48-55.2022.5.11.0551) 

Esta tese privilegia a autonomia empresarial e o direito potestativo de despedir, mesmo em face de normas internas anteriores à privatização. A posição adotada pelo TST evidencia o entendimento de que a sucessão empresarial decorrente de privatização permite à empresa adquirente estabelecer novas políticas de gestão de pessoal, não estando vinculada às normas internas da estatal originária. Este posicionamento alinha-se à concepção de que a privatização implica necessariamente uma mudança no regime jurídico aplicável às relações de trabalho, aproximando-as do modelo privado em sua inteireza.

2. Sentença líquida. Ausência de impugnação aos cálculos em recurso ordinário. Preclusão.

Tese: “A impugnação aos cálculos da sentença líquida proferida na fase de conhecimento somente é admissível por meio da interposição de recurso ordinário, sob pena de preclusão, eis que os cálculos constituem parte integrante da decisão.” (RR 195-19.2023.5.19.0262)

Esta tese consolidou importante entendimento processual, estabelecendo que os cálculos integram o conteúdo decisório da sentença líquida, estando sujeitos à preclusão se não impugnados no momento oportuno (recurso ordinário). A posição do TST prestigia a segurança jurídica, impedindo que partes reabram discussões sobre cálculos em momento processual inadequado. O entendimento firmado exige maior atenção das partes e seus procuradores no exame minucioso dos cálculos que acompanham a sentença líquida, sob pena de impossibilidade de discussão posterior.

3. Retificação e entrega do Perfil Profissiográfico Previdenciário. Prescrição. Não incidência.

Tese: “A pretensão de retificação e entrega do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário ostenta natureza meramente declaratória, não se submetendo à prescrição, nos termos do art. 11, § 1º, da CLT.” (RR 219-62.2024.5.12.0050)

Ao atribuir natureza declaratória à pretensão de retificação e entrega do PPP, o TST garantiu importante proteção aos direitos previdenciários do trabalhador. O PPP é documento essencial para a comprovação de atividades especiais junto à previdência social, sendo fundamental para a obtenção de aposentadoria especial. A imprescritibilidade reconhecida pelo TST resguarda o direito do trabalhador de obter este documento mesmo após o término do contrato de trabalho, alinhando-se ao princípio da proteção e facilitando o acesso a benefícios previdenciários.

4. Execução. Responsabilidade subsidiária. Benefício de ordem. Desnecessário o exaurimento da execução em face do devedor principal e seus sócios.

Tese: “A demonstração do inadimplemento do devedor principal, em obrigação subsidiária, dispensa o exaurimento prévio da execução contra este e seus sócios, autorizando, desde logo, o redirecionamento da execução para o devedor subsidiário.” (RR 247-93.2021.5.09.0672)

Esta tese representa significativo avanço na efetividade da execução trabalhista, privilegiando a satisfação do crédito alimentar. Ao dispensar o exaurimento prévio da execução contra o devedor principal e seus sócios, o TST mitigou o benefício de ordem tradicionalmente invocado pelos devedores subsidiários. A orientação jurisprudencial prioriza a celeridade processual e a efetiva satisfação do crédito trabalhista, reconhecendo sua natureza alimentar e a necessidade de tutela jurisdicional mais efetiva, especialmente em contextos de terceirização.

5. Estabilidade da gestante. Recusa de oferta de reintegração ao emprego. Direito à indenização.

Tese: “A recusa da empregada gestante em retornar ao trabalho, mesmo diante de oferta de emprego pelo empregador, não configura renúncia à garantia prevista no art. 10, II, "b", do ADCT - Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, subsistindo o direito à indenização substitutiva em relação ao período de estabilidade gestacional.” (RR 254-57.2023.5.09.0594)

O TST privilegiou a proteção à maternidade ao reconhecer o direito à indenização substitutiva mesmo quando há recusa à reintegração. Esta posição alinha-se à jurisprudência do STF, que enfatiza que a estabilidade gestacional visa proteger não apenas a trabalhadora, mas principalmente o nascituro. A tese reconhece que circunstâncias pessoais podem tornar inviável o retorno ao ambiente de trabalho (como, por exemplo, situações de assédio), não sendo razoável impor à gestante a reintegração como condição para o gozo do direito constitucional à estabilidade.

6. Confissão ficta. Desconhecimento dos fatos em depoimento pessoal. Indeferimento de prova testemunhal. Cerceamento de defesa não configurado.

Tese: “O indeferimento da prova testemunhal fundamentado na presunção de veracidade decorrente de confissão ficta por desconhecimento dos fatos controvertidos pela parte ou seu preposto, em depoimento pessoal, não configura cerceamento de defesa.” (RR 345-60.2024.5.05.0001)

Esta tese reforça os efeitos da confissão ficta no processo trabalhista, reconhecendo a discricionariedade do magistrado no indeferimento de provas testemunhais quando já há presunção de veracidade dos fatos pela confissão. O entendimento valoriza o princípio da economia processual, evitando a produção de provas desnecessárias quando a parte ou seu preposto demonstra desconhecimento dos fatos em depoimento pessoal. Contudo, tal interpretação exige atenção redobrada na preparação de prepostos, sob pena de severo prejuízo à defesa.

7. Controles de horário sem assinatura do empregado. Validade.

Tese: “A ausência de assinatura do empregado não afasta, por si só, a validade dos controles de horário.” (RR 425-05.2023.5.05.0342)

Ao estabelecer que a ausência de assinatura não invalida automaticamente os controles de jornada, o TST adotou posição pragmática que valoriza a realidade dos fatos sobre o formalismo. A tese reconhece que, no cotidiano empresarial, nem sempre é viável coletar assinaturas em todos os registros, especialmente em sistemas eletrônicos. Este entendimento não exclui, porém, a possibilidade de questionamento dos controles por outros meios de prova, apenas impede a invalidação automática pela mera ausência de assinatura.

8. Horas extras habituais reconhecidas em juízo. Supressão. Indenização devida.

Tese: “A supressão total ou parcial do serviço suplementar prestado com habitualidade enseja o pagamento de indenização compensatória, nos moldes da Súmula 291 do TST, ainda que o labor extraordinário tenha sido reconhecido somente em juízo e que sua cessação ou redução decorra da adequação à jornada de trabalho fixada judicialmente.” (RR 499-29.2023.5.10.0016)

Esta tese amplia o alcance da Súmula 291 do TST, estendendo a indenização por supressão de horas extras mesmo nos casos em que estas são reconhecidas apenas em juízo. A posição adotada protege o trabalhador que teve reconhecida a habitualidade de sobrejornada, indenizando-o pela perda do padrão remuneratório, independentemente da origem do reconhecimento das horas extras. A tese reflete o princípio da irredutibilidade salarial em sua dimensão material, reconhecendo o impacto econômico da supressão de parcelas habituais, ainda que sua regularidade só tenha sido confirmada judicialmente.

9. Empregado público. Concessão de redução de jornada sem redução pecuniária, e independentemente de compensação. Filho(a) com transtorno do espectro autista (TEA). Aplicação analógica do art. 98, §§ 2º e 3º, da lei 8.112/1990.

Tese: “O empregado público que possui filho com TEA - Transtorno do Espectro Autista tem direito à redução de jornada, sem diminuição proporcional de remuneração e independentemente de compensação de horário, nas hipóteses dos §§ 2º e 3º do art. 98 da lei 8.112/1990, de aplicação analógica.” (RR 594-13.2023.5.20.0006)

Trata-se de importante avanço na proteção às pessoas com deficiência, estendendo aos empregados públicos direito previsto originalmente para servidores estatutários. A aplicação analógica da lei 8.112/1990 reflete a interpretação constitucional que busca a máxima efetividade dos direitos fundamentais, especialmente o direito à proteção integral da pessoa com deficiência. Este entendimento alinha-se às disposições do Estatuto da Pessoa com Deficiência (lei 13.146/15) e às convenções internacionais sobre direitos das pessoas com deficiência.

10. Empresa em recuperação judicial. Multas dos art. 467 e 477 da CLT.

Tese: “A recuperação judicial, diversamente do que ocorre na falência, não exime a empresa do pagamento das multas previstas nos art. 467 e 477, § 8º, da CLT.” (RRAg 779-10.2023.5.12.0027)

O TST estabeleceu clara distinção entre os regimes de falência e recuperação judicial quanto ao pagamento de multas trabalhistas. Enquanto na falência há expressa previsão legal excluindo a incidência de multas (art. 83 da lei 11.101/05), o mesmo não ocorre na recuperação judicial. A tese reconhece que a empresa em recuperação judicial continua em plena atividade, devendo arcar com suas obrigações trabalhistas de forma integral, incluindo as penalidades por inadimplemento. Esta interpretação busca equilibrar a proteção ao trabalhador com a preservação da empresa, evitando que a recuperação judicial se torne instrumento de precarização dos direitos trabalhistas.

11. Insalubridade ou periculosidade. Validade da prova emprestada. Laudo pericial produzido em processo diverso. Concordância da parte contrária. Desnecessidade.

Tese: “A utilização de prova pericial emprestada para comprovar insalubridade ou periculosidade é válida, independentemente da concordância da parte contrária, desde que esteja presente a identidade fática entre o processo de origem e o processo em que a prova é utilizada, e seja observado o contraditório na produção da prova original e nos autos em que ela é trasladada, não configurando nulidade processual o indeferimento de nova perícia quando observados esses requisitos.” (RRAg 1000-38.2023.5.23.0107)

Esta tese endossa a utilização de prova pericial emprestada em questões técnicas, dispensando o consentimento da parte contrária, desde que preservada a identidade fática e o contraditório. O entendimento promove a economia processual, a celeridade e a racionalização do uso de recursos do poder Judiciário, evitando a repetição desnecessária de perícias idênticas. Contudo, a tese estabelece salvaguardas importantes, como a necessidade de identidade fática e a preservação do contraditório, garantindo o equilíbrio entre eficiência processual e devido processo legal.

12. FGTS. Acordo de parcelamento entre o empregador e a CEF. Efeitos quanto aos direitos do trabalhador.

Tese: “O parcelamento de débitos de FGTS firmado entre o empregador e a Caixa Econômica Federal não impede que o empregado exerça, a qualquer tempo, o direito de requerer na Justiça do Trabalho a condenação ao recolhimento imediato dos valores não depositados.” (RRAg 1397-69.2023.5.09.0016)

O TST estabeleceu importante garantia ao trabalhador ao reconhecer que acordos de parcelamento do FGTS firmados entre empregador e CEF não vinculam o empregado. A tese reafirma a natureza de direito trabalhista indisponível do FGTS, preservando a autonomia do trabalhador para buscar judicialmente o recolhimento integral e imediato das parcelas não depositadas, independentemente de acordos administrativos. Este entendimento protege o trabalhador de eventuais efeitos negativos de acordos de parcelamento excessivamente longos, que poderiam comprometer seu acesso aos valores do FGTS em situações de necessidade.

13. Multa do art. 477, §8º, da CLT. Base de cálculo.

Tese: “A multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT incide sobre todas as parcelas de natureza salarial, não se limitando ao salário-base.” (RR 11070-70.2023.5.03.0043)

Ao definir que a base de cálculo da multa por atraso nas verbas rescisórias compreende todas as parcelas de natureza salarial, o TST ampliou significativamente o alcance dessa penalidade. A interpretação adotada alinha-se ao conceito amplo de salário previsto no art. 457 da CLT, que abrange não apenas o salário-base, mas também adicionais, gratificações, comissões e outras parcelas salariais. Esta tese representa importante avanço na proteção ao trabalhador, tornando mais oneroso o descumprimento dos prazos legais de quitação das verbas rescisórias.

14. Dano moral. Ausência ou atraso na quitação das verbas rescisórias. Comprovação da efetiva violação aos direitos de personalidade do empregado.

Tese: “A ausência ou o atraso na quitação das verbas rescisórias, por si só, não configura dano moral indenizável, sendo necessária a comprovação de lesão concreta aos direitos de personalidade do trabalhador.” (RR 21391-35.2023.5.04.0271)

O TST adotou posição moderada ao estabelecer que o mero atraso ou inadimplemento de verbas rescisórias não gera automaticamente dano moral. A tese exige a demonstração de efetiva lesão aos direitos de personalidade, afastando a teoria do dano moral in re ipsa nestes casos. Este entendimento busca equilibrar a proteção ao trabalhador com a razoabilidade na aplicação do instituto da responsabilidade civil, evitando a banalização do dano moral. Contudo, não exclui a possibilidade de indenização quando comprovadas consequências graves do inadimplemento, como inscrição em cadastros de inadimplentes, impossibilidade de pagamento de compromissos essenciais ou grave abalo psicológico.

15. Execução. Decisão que rejeita exceção de pré-executividade. Decisão interlocutória. Irrecorribilidade imediata.

Tese: “A decisão que rejeita a exceção de pré-executividade, sempre que se revestir de natureza interlocutória, é irrecorrível de imediato, à luz do disposto no art. 893, § 1º, da CLT.” (RR 22600-13.2008.5.02.0015)

Esta tese reafirma o princípio da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias no processo trabalhista, aplicando-o especificamente às decisões que rejeitam exceções de pré-executividade. A posição adotada valoriza a celeridade processual e impede a utilização da exceção de pré-executividade como expediente protelatório. O TST mantém coerência com a sistemática recursal trabalhista, reservando o exame das questões decididas em exceção de pré-executividade para o momento próprio (agravo de petição contra a sentença de liquidação), salvo quando se tratar de decisão terminativa da fase executória.

16. Dano material. Redução da capacidade laborativa. Pensão mensal vitalícia (art. 950 do Código Civil). Cumulação com salário. Possibilidade.

Tese: “É possível a cumulação de pensão pela redução da capacidade laborativa, paga a título de indenização por danos materiais, com o salário recebido pelo trabalhador, por se tratarem de verbas de natureza e de fatos geradores distintos.” (RRAg 1000066-78.2022.5.02.0464)

O TST reconheceu a possibilidade de cumulação da pensão por redução da capacidade laborativa (prevista no art. 950 do Código Civil) com o salário recebido pelo trabalhador que permanece em atividade. A tese fundamenta-se na distinção entre a natureza jurídica e os fatos geradores destas verbas: enquanto o salário remunera o trabalho atual, a pensão indeniza a redução da capacidade laboral e as limitações profissionais futuras. Este entendimento alinha-se à teoria da reparação integral do dano, reconhecendo que a permanência em atividade, muitas vezes em função diversa ou com limitações, não exclui o prejuízo decorrente da redução da capacidade laborativa.

17. Condenação subsidiária. Aproveitamento do depósito recursal efetuado pelo devedor principal. Ausência de deserção.

Tese: “O depósito recursal efetuado pelo devedor principal, desde que não tenha requerido sua exclusão da lide, aproveita ao responsável subsidiário.” (RR 1001527-87.2021.5.02.0022)

Esta tese reconhece o aproveitamento do depósito recursal efetuado pelo devedor principal em benefício do devedor subsidiário, evitando a duplicidade de depósitos. O entendimento adotado alinha-se ao princípio da economia processual e à natureza acautelatória do depósito recursal, que visa garantir a execução futura. A posição do TST reflete a compreensão de que, existindo um único crédito a ser satisfeito, basta um único depósito para garantir o juízo, independentemente de quem venha a ser o responsável final pelo pagamento.

Efeitos práticos da vinculação jurisprudencial no direito do trabalho

A fixação das 17 novas teses vinculantes produz efeitos significativos no âmbito do direito material e processual do trabalho. Inicialmente, destaca-se o efeito uniformizador, que assegura tratamento isonômico a situações idênticas em todo o território nacional. Esta segurança jurídica beneficia tanto trabalhadores quanto empregadores, permitindo melhor planejamento e diminuindo as incertezas interpretativas.

Do ponto de vista processual, o caráter vinculante das teses tende a desestimular recursos protelatórios, uma vez que decisões contrárias ao entendimento consolidado pelo TST terão poucas chances de reforma. O efeito vinculante impede a subida de recursos sobre os temas pacificados, agilizando a tramitação dos processos e evitando decisões conflitantes.

Entretanto, a vinculação jurisprudencial não está isenta de críticas. Uma preocupação relevante diz respeito ao potencial engessamento do direito do trabalho, cuja plasticidade é historicamente reconhecida como necessária para a adaptação às transformações do mundo do trabalho. No debate constitucional contemporâneo, diversos juristas têm apontado os riscos de uma excessiva padronização interpretativa, que poderia comprometer a abertura hermenêutica necessária à evolução do direito.

É preciso lembrar que o sistema de precedentes adotado no Brasil possui mecanismos de superação e distinção que devem ser exercitados com responsabilidade pelos magistrados. A vinculação não significa imutabilidade, mas sim estabilidade, permitindo evoluções gradativas e fundamentadas. A jurisprudência, por mais consolidada que esteja, nunca é estanque, podendo ser superada, desde que respeitada a segurança jurídica. O importante é garantir que casos iguais sejam decididos igualmente, evitando a insistência para obter decisão favorável em matéria já pacificada em sentido contrário.

O TST na vanguarda processual trabalhista: a sessão virtual e o futuro dos julgamentos

Um aspecto que merece especial atenção é a realização da sessão plenária do TST em ambiente virtual, conforme as novas diretrizes estabelecidas pela emenda regimental 7/24. Esta inovação procedimental reflete o compromisso do Tribunal com a modernização e a eficiência jurisdicional, permitindo maior celeridade e economicidade na formação de precedentes.

A utilização de ferramentas digitais para julgamentos colegiados representa uma tendência irreversível na justiça brasileira, intensificada após a experiência da pandemia da COVID-19. No caso específico das 17 teses recém-fixadas, a modalidade virtual mostrou-se especialmente adequada por tratar-se de matérias já pacificadas entre os órgãos julgadores do Tribunal, dispensando debates presenciais aprofundados.

Entretanto, a virtualização completa de sessões de julgamento levanta questões relevantes sobre transparência e publicidade. É fundamental que o Tribunal mantenha canais efetivos de acompanhamento dos votos e manifestações pelos jurisdicionados, preservando a legitimidade democrática de suas decisões. A tecnologia deve servir como instrumento de aproximação entre Judiciário e sociedade, e não como barreira adicional ao escrutínio público.

As 17 teses vinculantes e seu impacto na jurisprudência trabalhista

As teses recentemente fixadas pelo TST não apenas consolidam entendimentos já prevalentes, mas também sinalizam as tendências interpretativas da mais alta Corte trabalhista para os próximos anos. É possível identificar algumas linhas mestras nestes precedentes:

  1. Valorização da segurança jurídica e da previsibilidade, com destaque para as teses relacionadas à prescrição, preclusão e irrecorribilidade de decisões interlocutórias;
  2. Pragmatismo processual, evidenciado nas teses sobre responsabilidade subsidiária e aproveitamento de depósito recursal entre coobrigados;
  3. Equilíbrio entre proteção trabalhista e liberdade empresarial, como na tese sobre dispensa imotivada após privatização;
  4. Sensibilidade social, demonstrada na tese sobre redução de jornada para empregados públicos com filhos autistas.

Analisando-se a “jurisprudência da jurisprudência” – isto é, a evolução histórica dos posicionamentos do TST – percebe-se que estas 17 teses se inserem em um movimento mais amplo de sistematização do direito do trabalho, buscando conciliar a tradição protetiva com as novas realidades econômicas e sociais.

Conclusão: o papel dos precedentes na construção do direito do trabalho contemporâneo

A fixação das 17 novas teses vinculantes pelo TST representa um marco importante na evolução do sistema de precedentes na Justiça do Trabalho brasileira. Este movimento, que se insere em uma tendência mais ampla do ordenamento jurídico nacional, busca conciliar a tradição romano-germânica com elementos do common law, visando maior segurança jurídica e eficiência jurisdicional.

Os precedentes obrigatórios não devem ser compreendidos como um engessamento do direito do trabalho, mas sim como um mecanismo de racionalização do sistema, que preserva a possibilidade de evolução interpretativa sem comprometer a previsibilidade. A consolidação do TST como corte de precedentes não diminui sua importância institucional; pelo contrário, reforça seu papel como orientador das relações trabalhistas no país.

O desafio que se coloca para o futuro é encontrar o equilíbrio delicado entre estabilidade e adaptabilidade na jurisprudência trabalhista. As 17 teses recentemente fixadas parecem caminhar neste sentido, consolidando entendimentos sem fechar as portas para evoluções futuras. É neste diálogo contínuo entre permanência e mudança que o direito do trabalho brasileiro encontrará sua expressão mais adequada aos desafios contemporâneos.

O sistema de precedentes vinculantes exige dos operadores do direito – advogados, juízes, procuradores e servidores – uma nova postura metodológica, atenta tanto ao texto normativo quanto à jurisprudência consolidada. Esta nova hermenêutica trabalhista, que não abandona a proteção ao hipossuficiente mas a insere em um contexto de maior previsibilidade, representa talvez o maior legado do atual momento histórico do TST.

Marco Aurélio Valle Barbosa dos Anjos
Advogado trabalhista. Sócio no Valfran dos Anjos Advogados. MBA em Direito Empresarial. Pós-graduação em Trabalho e Esporte. Curso em Cambridge. Atuação destacada em contencioso, gestão e Tribunais.

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