O prazo concedido ao terceiro para opor embargos antes de uma eventual declaração de fraude à execução reflete a adoção, pelo CPC atual, de uma perspectiva dinâmica ou substancial do contraditório.
Antes o contraditório resumia-se à informação e à reação - ciência bilateral dos atos processuais e oportunidade de manifestação. Hoje, porém, ele é compreendido como influência e não surpresa - as partes devem ter o poder de influenciar o resultado das decisões judiciais e não podem ser surpreendidas por fundamento de decisão judicial sem a prévia consulta.
É por isso que:
1) Não se pode decidir contra alguém sem que essa pessoa seja ouvida previamente (art. 9º, caput, do CPC);
2) Não pode haver fundamento de decisão sem consulta prévia às partes (arts. 10; 493, parágrafo único; e 933 do CPC);
3) Não pode haver desconsideração de personalidade jurídica antes de ouvir aquele cujo patrimônio se deseja alcançar (arts. 134, § 2º, e 135 do CPC); e
4) Não se considera fundamentada a decisão que deixa de apreciar argumentos que poderiam infirmar a conclusão do julgador - se o julgador não pode decidir contra alguém sem ouvir os seus argumentos, também não pode decidir contra alguém sem analisar os seus argumentos (art. 489, § 1º, IV, do CPC).
No modelo de contraditório substancial ou dinâmico abraçado pelo Código, as partes não recebem o prato feito, porque devem ter o poder de influenciar a sua elaboração e não podem ser surpreendidas por ingredientes sem o direito ao prévio debate.
Nesse contexto, antes de declarar fraude à execução, o juiz deve ouvir o terceiro adquirente, assegurando-lhe a chance de apresentar argumentos contrários à decretação da fraude e à realização da constrição.
Observe que a fraude à execução pode ser decretada até sem requerimento, mas o dever de consulta prévia é indispensável, aplicando-se mesmo a matérias cognoscíveis de ofício (art. 10 do CPC).
O terceiro adquirente, por sua vez, tem o direito de influenciar a decisão por meio:
a) Endoprocessual (simples petição nos autos); ou
b) Extraprocessual (embargos de terceiro ou ação autônoma inibitória pelo procedimento comum - art. 497, parágrafo único, do CPC).
Se optar pelos embargos de terceiro preventivos, terá o prazo de quinze dias, conforme dispõe o art. 792, § 4º, do CPC.
O prazo exíguo - distinto do previsto no art. 675 do CPC - se dá porque os embargos referidos no art. 792, § 4º, do CPC são preventivos ou inibitórios, não repressivos. Funcionam como uma "vacina processual" contra a decretação da fraude e a constrição judicial.
No entanto, após a decretação da fraude e da realização da constrição judicial, nada impede que o terceiro adquirente oponha embargos de terceiro repressivos em até cinco dias depois da adjudicação, da alienação por iniciativa particular ou da arrematação, desde que antes da assinatura da respectiva carta, conforme dispõe o art. 675, caput, do CPC. Estes embargos, diferentemente daqueles, funcionam como um "remédio processual".
Não existe prazo especial ou prazo geral para embargar: o prazo do art. 792, § 4º, do CPC é destinado exclusivamente aos embargos de terceiro preventivos ou inibitórios, equanto o prazo do art. 675, caput, do CPC é destinado aos embargos de terceiro repressivos.
Exatamente nesse sentido decidiu a 3ª Turma do STJ:
"O art. 792, § 4º, do CPC/2015 prevê que, antes de declarar a fraude à execução, o juiz deverá intimar o terceiro que adquiriu o bem anteriormente pertencente ao executado para, querendo, opor embargos de terceiro no prazo de 15 (quinze) dias. Tais embargos têm cunho preventivo, porquanto se destinam apenas a possibilitar que o terceiro evite a constrição judicial enquanto se defende da alegação de ter praticado ato em fraude à execução. Daí que o transcurso do referido lapso temporal não obsta a oposição de embargos repressivos, com fundamento no art. 675, caput, do CPC/2015. Ou seja, o prazo previsto no art. 792, § 4º, do CPC/2015 não é preclusivo." (STJ – REsp 2.082.253-PR, rel. min. Nancy Andrighi, DJe 20/09/2023).
Portanto, a interpretação do art. 792, § 4º do CPC é indissociável da visão de contraditório substancial ou dinâmico albergada pelo CPC de 2015. Não se trata de um dever imposto ao terceiro, mas de um direito que lhe é assegurado - de não ser surpreendido e de poder influenciar ativamente a decisão. Se preferir não embargar preventivamente e houver o reconhecimento da fraude à execução, com a consequente constrição judicial, o terceiro ainda pode ajuizar embargos repressivos no prazo do art. 675 do CPC, ou promover ação autônoma pelo procedimento comum, não se podendo falar em preclusão - até porque, esta é um fenômeno endoprocessual, não produzindo efeitos extraprocessuais.