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Como funciona o sistema de varas de família no Brasil?

É fundamental que juízes e tribunais adotem uma abordagem mais voltada para a mediação e resolução pacífica dos conflitos, favorecendo acordos sustentáveis logo após o divórcio.

15/9/2025

As varas de família são unidades jurisdicionais responsáveis por processar e julgar litígios relacionados a diversos temas familiares, como anulação de casamentos, inventários, testamentos, investigação de paternidade, união estável, violência doméstica e familiar e também questões como divórcio, separação judicial, guarda de menores, convivência, pensão alimentícia e conflitos entre os pais. Nesse contexto, o Estado deve atuar não apenas como mediador, mas também como facilitador de acordos que promovam o interesse e o desenvolvimento saudável das crianças e adolescentes.

O processo judicial, muitas vezes moroso e complexo, pode intensificar as disputas e criar um ambiente hostil e prejudicial para os filhos. Em contrapartida, é fundamental que juízes e tribunais adotem uma abordagem mais voltada para a mediação e resolução pacífica dos conflitos, favorecendo acordos sustentáveis logo após o divórcio.

Os acordos sustentáveis são aqueles que levam em consideração o bem-estar emocional e físico da criança, evitando a implementação de soluções temporárias que podem não se sustentar a longo prazo. A ênfase deve ser a criação de um ambiente propício para o crescimento e a estabilidade da criança, que pode ser alcançado através da comunicação aberta entre os ex-cônjuges.

Alguns tribunais, como os do Rio de Janeiro, implementaram projetos pedagógicos, como o ‘Bem-me-quer’, que oferece orientação e exibe filmes no sentido de mostrar o que é importante para os filhos pós-divórcio. Tem também as oficinas de parentalidade, que são realizadas em algumas comarcas e que desenvolvem um trabalho muito interessante para os pais e para as crianças. Esses programas visam educar os genitores sobre a importância de manter o foco no bem-estar dos filhos, minimizando o impacto emocional de uma separação.

Já a mediação familiar é uma ferramenta valiosa, que, se realizada adequadamente, pode evitar que as crianças se tornem "reféns" de disputas judiciais. O ideal é que seja feita previamente, mas muitas vezes os juízes encaminham o pedido no meio do processo. O principal é que as duas partes queiram mediar e chegar a um acordo, o que nem sempre acontece principalmente em casos que envolvem violência.

A mediação pode ser feita também de forma privada e hoje em dia existem alguns temas que são abordados como os planos de parentalidade e de coparentalidade. Resolver conflitos fora do âmbito judicial traz diversas vantagens, especialmente para as crianças. Em primeiro lugar, evita-se a exposição a um ambiente de disputa, que pode gerar traumas emocionais duradouros. Quando os pais conseguem dialogar e chegar a acordos de convivência claros e respeitosos, a criança sente-se mais segura e menos dividida entre os dois lados. A colaboração entre os pais, mesmo após a separação, é essencial para garantir uma convivência harmoniosa e um desenvolvimento saudável.

Visto que as disputas judiciais podem deixar marcas profundas nas crianças, é importante lembrar que um ambiente conflituoso e as tensões familiares podem resultar em problemas emocionais, como ansiedade, depressão e dificuldades de relacionamento. Muitas vezes, as crianças se sentem pressionadas a escolher um lado, o que pode levar a sentimentos de culpa e confusão. É vital que o sistema judicial tenha consciência desses impactos e busque formas de minimizá-los, priorizando a proteção emocional das crianças.

Embora existam iniciativas positivas nas varas de família, ainda há muito a ser feito. O Estado deve oferecer serviços acessíveis, de qualidade e com agilidade para apoiar pais e crianças em processo de separação. A promoção de programas de mediação e de oficinas de parentalidade em todas as comarcas pode ser um passo importante na construção de um sistema mais eficaz e menos punitivo.

Os juízes, por sua vez, devem ser incentivados a adotar uma postura colaborativa, buscando soluções que atendam ao melhor interesse da criança a fim de garantir que todos os envolvidos possam expressar suas preocupações e alcançar um acordo que funcione na prática.

Andreia Soares Calçada
Psicóloga clínica e jurídica. Perita do TJ/RJ em varas de família e assistente técnica judicial em varas de família e criminais em todo o Brasil. Membro do IBDFAM e autora de livros e artigos na área.

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