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Abandono animal em Porto Velho: A distância entre a lei e a realidade

A conduta pode refletir falha estrutural na execução das políticas públicas ambientais.

13/10/2025

Sentem fome, sede, frio, calor, dor e sofrimento.

Abandono é crime com pena agravada. O abandono configura crime de maus-tratos1, previsto no art. 32 da lei 9.605/1998 (lei de crimes ambientais), cuja punição foi ampliada pela lei sansão (lei 14.064/20). O responsável pode ser condenado à reclusão de 2 a 5 anos, além de multa e proibição da guarda de animais.

A conduta é caracterizada por deixar o animal criado em ambiente doméstico2 em situação de desamparo, expondo-o a risco nas vias públicas ou privadas - ato que, embora ainda comum, é criminalmente sancionável, proteção jurídica3.

Legislação municipal4 reforça a proteção em âmbito local, a LC 825/20, atualizada pela lei 967/23, estabelece diretrizes para o controle populacional e a proteção dos animais em Porto Velho. Entre os principais pontos:

Entre a norma e a prática: necessidade de ação efetiva. A eficácia das leis depende de políticas públicas contínuas, com reativação do Canil Municipal/DCZ, programas de castração, vacinação e adoção responsável. A população também desempenha papel essencial: denúncias de maus-tratos ou abandono devem ser direcionadas à Polícia Militar e Polícia Ambiental, acompanhadas de provas.

É também um problema nacional, o voto da relatora6 na apelação criminal 0001250-76.2017.8.16.0026, da 4ª turma recursal dos juizados especiais do Estado do Paraná informa que o apelante maltratou o seu animal de estimação (cachorro) ao abandoná-lo em via pública, tendo o amarrado junto a uma árvore, sem água e comida, o qual posteriormente foi recolhido por funcionários de uma associação protetora de animais local:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE MAUS TRATOS AOS ANIMAIS. ARTIGO 32 DA LEI Nº 9.605/1998. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. ATIPICIDADE DE CONDUTA. INVIABILIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA. ELEMENTO SUBJETIVO DEVIDAMENTE COMPROVADO. ABANDONO DE ANIMAL DE ESTIMAÇÃO EM VIA PÚBLICA. NÃO FORNECIMENTO DE ÁGUA E ALIMENTAÇÃO AO ANIMAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Transformar o texto da lei em realidade prática é o verdadeiro desafio. O respeito à vida7 animal revela o grau de civilidade e responsabilidade coletiva de uma sociedade - e Porto Velho ainda precisa avançar para fazer da proteção animal uma prioridade efetiva.

O presente artigo é uma crítica construtiva que pode servir para uma maior atenção aos animais que estão nas ruas e que podem e devem receber tratamento digno.

___________________

1. SPENGLER, A.M.G. S; SCALZARRETO, A.; CORDEIRO, A.M.C. et al. Lei de Crimes Ambientais: Comentários à Lei nº 9.605/98 e aos Atuais Impactos Ambientais. Leme-SP: Mizuno, 2024.

2. ALMEIDA, Felipe Cunha de. Animais de estimação e a proteção de direito de família. Londrina – PR: Thoth, 2020.

3. MARTINS, Juliane Caravieri; NUNES, Cicília Araújo. Direito animal: Ao seres sencientes em juízo. Aspectos processuais e procedimentais. Londrina-PR: Thoth, 2024.

4. PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO VELHO-RO. Lei Complementar nº 967, DE 15 de dezembro de 2023: Altera, acrescenta e dá nova redação a dispositivos da Lei Complementar nº 825, de 05 de outubro de 2020, e dá outras providências.

5. VADE MECUM. Constituição Federal. Organização Anne Joyce Angher. São Paulo: Rideel, 2020.

6. VOTO RELATORA. Apelação Criminal n° 0001250-76.2017.8.16.0026, da 4ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do estado do Paraná., 18 de setembro de 2020.

7. MARINHO, Girlei Veloso. Queimando vidas: aprisionados na antiga ciência - o futuro deve começar com o presente. Porto Velho-RO, ed. do Autor, 2025.

Girlei Veloso Marinho
Advogado, Perito Criminal aposentado, Mestre em Gestão Pública, Especialista em: Direito Constitucional e Administrativo, Direito Civil e Processo Civil, Direito Penal e Processo Penal, D. Ambiental.

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