O descredenciamento de clínicas, hospitais e médicos tem se tornado uma prática recorrente entre os planos de saúde. Embora seja permitido a substituição de prestadores, a ANS regula essa prática por meio da RN 583/22, na qual impõe alguns requisitos formais e materiais para evitar que os consumidores fiquem desassistidos.
No entanto, mesmo com os critérios estabelecidos na norma, o que se tem visto é um movimento crescente de esvaziamento silencioso das redes credenciadas, principalmente em grandes operadoras, mediante a exclusão de hospitais de referência sem a devida substituição equivalente. Tal conduta, além de violar a legislação, tem sido reiteradamente considerada abusiva pelo Poder Judiciário.
A norma da ANS impõe alguns critérios para que o redimensionamento da rede seja realizado, sendo eles: o plano de saúde somente poderá substituir se houver justa causa e desde que haja a oferta de serviço efetivamente equivalente; o beneficiário deve ser comunicado com 30 dias de antecedência; a substituição deve preservar a capacidade de atendimento, complexidade, qualidade, além da localização geográfica do prestador que foi excluído; no caso de hospitais e serviços de alta complexidade é exigido que a estrutura não seja apenas "boa", mas também equivalente em termos técnicos e funcionais.
Sendo assim, não existe a história de “descredenciamento simples”. Toda exclusão exige prova robusta de que o beneficiário não ficará desassistido.
Todavia, as operadoras têm utilizado o argumento de “remanejamento da rede” para realizar as alterações na rede credenciada. Retiram hospitais estratégicos, na sua maioria de alta complexidade, e substituem por prestadores que não possuem equivalência técnica, reputacional ou assistencial.
A RN é categórica ao exigir equivalência real, e não de mera compatibilidade formal. Então ao substituir um hospital oncológico de referência por outro sem centro de pesquisa, uma maternidade de excelência por unidade sem UTI neonatal, ou um hospital de alta complexidade por hospital geral de menor porte, não atende ao padrão mínimo regulatório.
Trata-se de diminuição unilateral da rede, vedada pelo art. 17 da lei 9.656/98, que proíbe alteração contratual que reduza as garantias originais oferecidas ao consumidor.
O Judiciário já tem reconhecido o abuso dos planos de saúde. Não basta a operadora alegar que substituiu, ela deve provar, de forma concreta e documental, que a substituição preserva o padrão originalmente contratado.
O descredenciamento irregular é grave e impacta diretamente a vida do paciente. A não substituição equivalente rompe o vínculo terapêutico, interrompe tratamentos em curso, principalmente os oncológicos e neurológicos, obriga o beneficiário a se deslocar para lugares mais distantes e cria a falsa sensação de que o plano continua o mesmo, quando na verdade há redução do contrato disfarçada, mas sem que a mensalidade também seja reduzida. Ou seja, trata-se de vantagem excessiva proibida pelo art. 39, V, do CDC.
O descredenciamento de prestadores não pode ser tratado como mera estratégia comercial. A rede contratada é elemento essencial da proteção à saúde, e sua alteração exige observância estrita da RN 583/22, da lei 9.656/98 e do CDC.
A postura de operadoras que promovem exclusões amplas e simultâneas, sem comprovar equivalência e sem comunicação eficaz, não constitui simples redimensionamento, mas verdadeira violação contratual, caracterizando prática abusiva e lesiva à dignidade do consumidor.
O Judiciário tem reafirmado que a continuidade do tratamento, especialmente em áreas de alta complexidade, deve prevalecer sobre políticas unilaterais de redução de custos.