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Falta ética e falta disciplinar na OAB - Provimento 83/1996 - Processo advogado contra advogado

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Atualizado em 14 de outubro de 2022 11:38

Em recente data nos deparamos com tema singular no processo disciplinar da OAB, que é a diferenciação conceitual entre o que seria uma falta ética e uma falta disciplinar.

Para o Conselho Federal, nos termos do brilhante voto da lavra do Conselheiro Leon Deniz Bueno da Cruz, é assim estabelecida a diferença: "EMENTA N. 008/2018/SCA-STU. Recurso ao Conselho Federal. (...) 2) A seu turno, o Provimento n. 83/96 estabelece que os processos de representação, de advogado contra advogado, envolvendo questões de ética profissional, devem ser encaminhados ao Conselho Seccional, para tentativa de conciliação entre as partes. Não se aplica o referido provimento, pois, nos casos de prática de infração disciplinar, ainda que envolvendo representação de advogado contra advogado. Precedentes. Preliminar de nulidade processual que não prospera (....)". (49.0000.2017.005793-0/SCA-STU. Interessado: Conselho Seccional da OAB/São Paulo. Relator: Conselheiro Federal Leon Deniz Bueno da Cruz (GO). (DOU, S.1, 01.02.2018, p.185)).

A síntese do quanto estabelecido no voto é que quando a conduta encontrar tipicidade administrativa no artigo 34 e incisos da Lei Federal n.º 8.906/94, estaremos diante de uma falta disciplinar; quando, todavia, se amoldar a preceito encontrado no Código de Ética e Disciplina, estaremos diante de uma falta ética. De fato, a diferenciação guarda pertinência quando analisada a pena administrativa, pois para as faltas previstas no Código de Ética, a pena máxima cominada será a de censura, na forma do artigo 36, inciso II do Estatuto da Advocacia.

A doutrina também define como diferentes as normas: "Prevaleceu, no CFOAB, quando da discussão do projeto do Estatuto, a tese fortemente defendida pelo Conselheiro Evandro Lins e Silva, de que as infrações disciplinares, por constituírem restrições de direito, deveriam ser taxativamente indicadas em lei, não podendo ser remetidas ao Código de Ética e Disciplina que as regulamentasse"1.

Como não encontramos nenhum precedente anterior a 1996, entendemos que referida diferenciação tem sua importância marcada pelo provimento nº 83/1996 da OAB, que estabelece um microssistema processual diferenciado nos processos "de advogado contra advogado, envolvendo questões de ética profissional", cuja vigência, atualmente, pode até ser discutida em função do advento no novo Código de Ética e Disciplina da OAB, que veio ao mundo jurídico pela resolução  02/2015.

Pelo provimento nº 83/1996 da OAB, nesses processos específicos, ou seja, quando há um representante advogado e um representado advogado e o primeiro acusa o segundo em "questões de ética profissional", portanto, de uma violação ao Código de Ética e Disciplina da OAB, uma vez comunicada a Casa da Advocacia, o processo iria ao Tribunal de Ética e Disciplina que já notificaria o representando para apresentação de defesa prévia, excluída, portanto, a fase preliminar de admissibilidade; após, haveria um procedimento de conciliação entre as partes, produção de provas e o feito imediatamente remetido a julgamento, glosados, portanto, o parecer preliminar e o parecer da instrução.

A questão é normatizada pelo artigo 1º do provimento:

"Art. 1º. Os processos de representação, de advogado contra advogado, envolvendo questões de ética profissional, serão encaminhados pelo Conselho Seccional diretamente ao Tribunal de Ética e Disciplina, que:

I - notificará o representado para apresentar defesa prévia;

II - buscará conciliar os litigantes;

III - acaso não requerida a produção de provas, ou se fundamentadamente considerada esta desnecessária pelo Tribunal, procederá ao julgamento uma vez não atingida a conciliação".

Vale destacar, todavia, que nem todos os casos envolvendo representação de advogado contra advogado serão regulamentados pelo provimento nº 83/1996. Imagine-se, por exemplo, que determinado advogado procura diretamente a parte contrária em vez de seu colega advogado para realizar uma oferta de acordo, violando, assim, o quanto prescreve o artigo 34, inciso VIII da lei Federal 8.906/94: "VIII - estabelecer entendimento com a parte adversa sem autorização do cliente ou ciência do advogado contrário". Tal fato, gravíssimo, conforme supracitado, importa em violação disciplinar e não em violação ética, ou seja, uma vez realizada representação pelo advogado prejudicado contra seu colega, o trâmite do processo disciplinar deve se dar pelo rito normal previsto nos artigos 57 e seguintes do Código de Ética e normas correlatas e não pela sua forma sumária, prevista no provimento em comento.

E acertou a OAB em excluir as violações disciplinares do rito sumário do Provimento, haja vista que as condutas previstas no artigo 34 da lei Federal 8.906/94 podem impor ao advogado penas de suspensão e expulsão, ou seja, é natural que o trâmite processual resguarde à parte que se defende um processo mais robusto, com mais formas de defesa. E que não se diga que a hipótese da audiência estabeleceria um rito melhor à defesa, pois sempre é facultado à parte o acordo fora dos autos.

Por último, chama a atenção o fato de que eventual confusão no processamento do feito pela OAB não importará em nulidade, ainda mais quando o trâmite se der pelo rito normal e não pelo do provimento, exatamente em face da ausência de prejuízo à parte. Quando o contrário, será necessária a prova do prejuízo processual.

Vale também destacar que nos termos do inciso II do Art. 1º do provimento nº 83/1996 não está prevista a audiência de conciliação, mas tão somente que o Tribunal de Ética e Disciplina "buscará conciliar os litigantes", o que, claro, pode ser realizado via dessa audiência. Assim, a ausência da audiência não é capaz de gerar nulidade no processo. O que exsurge claramente é a necessidade da OAB ofertar às partes a possibilidade de um acordo. Assim, por exemplo, se o Tribunal está com falta de funcionários para a realização da audiência de conciliação, poderá a OAB simplesmente intimar as partes para manifestação sobre a possibilidade de um acordo, estabelecendo prazo legal para a posição.

 

No sentido da provocação pela manifestação das partes, já decidiu o CFOAB pela ausência de nulidade: "EMENTA 202/2011/SCA-STU. Locupletamento - Suspensão - Audiência de Conciliação - Ausência voluntária das partes após notificação - Nulidade Processual Inexistente - (...) 1. Não se verifica nulidade processual pela não realização de audiência de conciliação se as partes, devidamente notificadas, não comparecem de forma voluntária. (...)" (2011.08.03025-05/SCA-STU. Interessado: Conselho Seccional da OAB/Paraná. Relator: Conselheiro Federal Valmir Macedo de Araújo (SE). (DOU, S.1, 16/08/2011 p. 123)

Diante do exposto, a inarredável conclusão é que o provimento nº 83/1996 da OAB só será aplicável aos casos de demandas entre advogados, quando a representação tratar de mácula em tese ao Código de Ética e Disciplina, o que, por consequência, obriga a exegeta ao entendimento de que será necessário à OAB, ao receber a comunicação do fato, proferir decisão fundamentada que venha a fornecer classificação legal da falta em tese investigada, exatamente para apuração do rito a ser adotado.

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1 LÔBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 181.